Se vira nos 30
Divulgação/CBS All Access
Rose Leslie, conhecida como a Ygritte de Game of Thrones, em cena do drama The Good Fight; auxílio para a CBS
JOÃO DA PAZ
Publicado em 7/4/2020 - 14h02
O mercado de séries americanas está no olho do furacão com a crise do novo coronavírus (Covid-19), que interrompeu centenas de produções, paradas desde meados de março. Com a possibilidade de retorno das gravações somente para maio, na previsão mais otimista, as TVs abertas dos Estados Unidos estão se virando nos 30 para evitar um apagão (não ter o que colocar no ar). Vale até emprestar séries do streaming.
Chegar a esse ponto seria o cenário mais catastrófico. Mas é uma saída que está sendo estudada, apesar de tudo. Executivos das cinco grandes redes (ABC, CBS, Fox, NBC e The CW) se mostram dispostos a fazerem de tudo para preencher a programação dos próximos meses --e aí, vale basicamente qualquer coisa.
Como a rede ABC faz parte do grupo The Walt Disney Company, ela pode pegar alguma atrações já prontas da plataforma Disney+. Assim como a CBS tem o acervo do CBS All Access (ela já fez isso com The Good Fight), e a NBC tem o Peacock, o novo serviço da NBCUniversal. Para tanto, só é preciso rever algumas linhas do contrato de licenciamento e acertar direitos de imagem e autoria com as pessoas envolvidas nas possíveis atrações a serem exibidas.
Relembrando os tempos da greve dos roteiristas de 2007, as redes têm como suporte canais da TV paga que fazem parte do conglomerado a qual pertence. A ABC, por exemplo, tem boas séries para escolher do canal Freeform (como Grownish e o reboot de O Quinteto). A CBS pode relembrar o que fez com Dexter (2006-2013) na década passada e receber auxílio de séries do canal Showtime. Ou aproveitar a fusão com a Viacom e pedir emprestado da MTV alguns realities shows.
Reprisar séries não é carta fora do baralho. Tanto que a CBS sempre vai bem nesse quesito (com a franquia NCIS). A NBC, que reservou parte da programação de julho e agosto para exibir os Jogos Olímpicos de Tóquio, cogita usar seu arquivo da franquia Chicago e fazer a festa, pois é um hit. Menos mal para a rede que quase todo o plantel de realities e game shows programados para junho e julho estão finalizados.
Também vale o truque de produzir shows especiais remotos, como o que contará com o trio de ferro do talk show americano, para tapar buraco. Tudo é possível.
Já houve decisões drásticas sacramentadas na crise do coronavírus, como Grey's Anatomy (da ABC) cortar quatro episódios da 16ª temporada, o que equivale a um mês de exibição, por simplesmente não ter como gravá-los.
Algo similar ocorre na TV paga também, com séries que não conseguiram ser finalizadas antes das suspensões dos trabalhos, como Fargo (FX) e The Undoing (HBO), e tiveram as respectivas datas de estreias adiadas. Já a décima temporada de Walking Dead terminou um episódio antes do previsto originalmente.
Toda essa crise atinge com mais força as redes de sinal aberto dos Estados Unidos. O período entre março e junho é quando séries veteranas encerram suas temporadas, e asa estreantes são gravadas. Cada vez que a quarentena se estende, mais o atraso cresce e o desespero bate na porta dos executivos.
Especificamente sobre as novas séries, as cúpulas das redes ficam em uma sinuca de bico. Tradicionalmente, as atrações novatas gravam um piloto (primeiro episódio), a diretoria o assiste e ou reprova ou encomenda uma temporada completa, para ser lançada na fall season (entre setembro e outubro).
Sem pilotos prontos, como montar a grade dos próximos meses? Algumas redes estão tomando decisões arriscadas, como aprovar uma série sem ver como ela é (algo como comprar um produto sem saber do que se trata). Mas isso é feito somente com atrações que têm pessoas renomadas nos bastidores ou no elenco.
E falta ainda a cereja (azeda) do bolo. No dia 1º de maio, termina o contrato vigente entre os sindicatos dos roteiristas americanos e a associação das produtoras e estúdios. Se esse prazo final não for estendido ou as duas partes chegarem a um acordo até lá, haverá paralisação das séries não por causa do vírus, mas porque quem escreve as tramas que geram tanto lucro vai cruzar os braços. Assim, o desastre na indústria de entretenimento será muito maior do que já é.
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