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COLUNA DE MÍDIA

Big Brother dobra audiência do Globoplay, trava internet e aumenta desafio da Globo

REPRODUÇÃO/TV GLOBO

Fiuk à esquerda com uma bandana rosa na cabeça, Juliette ao centro com as mãos no rosto e Rodolffo à direita na sala do BBB21

Fiuk, Juliette e Rodolffo no Big Brother Brasil 21; reality causou 'boom' na audiência

GUILHERME RAVACHE

ravache@proton.me

Publicado em 8/3/2021 - 7h20

O Big Brother Brasil é o mais recente exemplo de como a migração da Globo para o digital é um desafio que coloca em xeque o futuro da emissora. Quanto mais sucesso o reality show faz nas plataformas digitais, pior se torna a experiência do usuário e maior o desafio financeiro do Globoplay.

Nas primeiras semanas da estreia do programa, foram frequentes os problemas de queda do streaming do Grupo Globo. Nas redes sociais são recorrentes os comentários de usuários que não conseguem acessar a plataforma nos horários de pico do reality.

Segundo o DownDetector, especializado em monitorar o funcionamento de sites e apps, o Globoplay teve 11 grandes quedas após a estreia do BBB21. Nos três meses anteriores ao programa, o serviço teve apenas um problema identificado pelo site.

Em entrevista ao colunista Mauricio Stycer, do UOL, Erick Brêtas, diretor de produtos e serviços digitais da Globo, e Raymundo Barros, diretor de tecnologia, confirmaram os problemas e atribuíram as falhas ao sucesso da atração comandada por Tiago Leifert.

reprodução/youtube

Diretor de produtos confirma problemas

Entretanto, o sucesso do reality no online ressalta um outro obstáculo para a Globo, à medida que a audiência migra cada vez mais rápido para o streaming, os anunciantes tendem a seguir a audiência. E se a audiência está na internet, o poder de cobrar por publicidade na TV, maior fonte de receita da emissora, é cada vez menor.

Mesmo a receita que antigamente vinha com o pay-per-view e trazia trechos com importantes acontecimentos da casa migrou para o online. Em 2009, a Sky vendia o pay-per-view a R$ 127. Hoje, a Globo comercializa o mesmo conteúdo por apenas R$ 22,90 no Globoplay. Na TV a cabo, a queda de assinantes é ainda mais rápida.

Em fevereiro, quando questionamos a líder de audiência sobre os problemas do streaming, a comunicação da emissora respondeu que "o Globoplay não mede esforços para oferecer a melhor experiência possível aos seus usuários".

"Durante o período de exibição do BBB, vemos um fenômeno único com a migração de uma audiência massiva de dezenas de milhões de usuários, no mesmo minuto, da TV aberta para o Globoplay --o que chamamos de 'efeito rajada', sem referência no mercado", completou.

Segundo Barros, o problema não seria sustentar milhões de pessoas na plataforma, mas sim lidar com o efeito rajada, quando milhares de pessoas migram da TV para o digital simultaneamente.

Profissionais e empresas de nuvem confirmam que tamanho tráfego é desafiador para qualquer empresa, mas que as soluções disponíveis no mercado podem atender à demanda.

Por essa razão, a Netflix e o Prime Video, ambos hospedados na AWS, nuvem da Amazon, não caem nem mesmo quando novos programas estreiam e são assistidos no mundo inteiro por milhões de usuários simultaneamente. Vale lembrar que na Europa, o streaming da Amazon transmite campeonatos de futebol sem maiores contratempos.

Eventualmente, pode acontecer um erro de cálculo e uma estrutura de nuvem ser subdimensionada por quem a contrata. Mas isso é corrigido com o aumento da capacidade da infraestrutura. O que parece ter sido o caso da Globo, que subestimou a audiência do BBB.

Neste vídeo case da AWS, empresa de nuvem da Amazon, Attilio Giue, que cuida da tecnologia do Disney+, explica como a plataforma consegue escalar globalmente e lidar com "efeitos rajada" quando estreia em novos mercados. Neste outro case da ViacomCBS, há detalhes de como a emissora americana hospeda 425 canais lineares na Amazon.

Este ano, ao transmitir a final do Super Bowl, a ViacomCBS viu um aumento de 65% de audiência de usuários. Segundo a emissora, sua audiência digital foi de 5,7 milhões de pessoas assistindo ao jogo ao vivo, um aumento de 65% em relação ao Super Bowl do ano passado.

A CBS também sentiu o efeito rajada na abertura do evento, e alguns usuários relataram dificuldade de acesso nos primeiros cinco minutos. A Globo levou mais de um mês para estabilizar suas transmissões.

Segundo Stycer, o papo da eliminada Karol Conká com a ex-BBB Ana Clara teve um pico de 1,2 milhão de acessos simultâneos. Na mesma noite, o pico de consumo na plataforma de vídeos digitais (Globoplay principalmente) foi de 2,3 milhões de acessos ao mesmo tempo.

Reprodução/GLOBOPLAY

Bate-papo foi marcado por sucesso de audiência

Outra reclamação dos usuários é que os problemas em TVs ao usar o Globoplay são ainda piores. Segundo Brêtas, a causa seriam versões desatualizadas do app do streaming.

Mas vale lembrar que as televisões por suas telas maiores demandam ainda mais da infraestrutura da Globo. Em março de 2020, após o início da pandemia (e também do BBB20), a empresa anunciou uma redução da qualidade de transmissão de seus vídeos. Um capítulo de novela com uma hora de duração passou a consumir 1,2 GB de dados, em vez dos 2,5 GB do Full HD (alta definição plena).

Em fevereiro, em uma sala do Clubhouse, nova rede social de áudio, Brêtas, revelou que o Globoplay está transmitindo 6,5 milhões de horas de vídeo por dia, quase 200 milhões de horas ao mês. O número de horas transmitidas é praticamente o dobro do início de janeiro.

Na semana anterior à estreia do BBB, o executivo afirmou em uma entrevista ao Deadline que a plataforma transmitia 100 milhões de horas/mês, ou pouco mais de 3,3 milhões de horas/dia. Ou seja, o reality show dobrou o tráfego do Globoplay de uma semana para outra.

Quanto mais audiência, maior o custo

A Globo já está entre as três empresas que mais investem em infraestrutura em nuvem na América Latina. Segundo relatório da consultoria Intricately, o valor é superior a US$ 2,5 milhões por mês apenas em nuvem. E o valor é anterior ao BBB, então a conta cresceu consideravelmente desde a estreia.

Questionada se o Globoplay dá prejuízo e se o Big Brother Brasil aumentou esse déficit demandando mais investimentos, a emissora respondeu por meio de sua assessoria de imprensa: "Não comentamos informações estratégicas dos nossos negócios". A Globo também não divulga o número de usuários pagantes de seu streaming.

De todo modo, os acionistas da empresa estariam dispostos a "perder dinheiro" durante até dez anos. O plano é tornar o Globoplay uma marca DTC (direct to consumer), uma tarefa de centenas de milhares de reais.

Para efeito de comparação, a Netflix para obter um fluxo de caixa positivo precisou de mais de 203,7 milhões de assinantes pagando em média mais de US$ 11 por mês (os preços de assinatura variam em diferentes mercados), com cerca de US$ 17,5 bilhões de custos em programação em 2021, mais de $ 2 bilhões de gastos anuais com tecnologia e mais de $ 2,5 bilhões de marketing investidos anualmente.

Já a Disney, apenas 12 meses após o lançamento do seu streaming, teve de dobrar seus gastos anuais planejados em programação até 2024. O Disney+, mesmo com quase 95 milhões de assinantes, prevê dar lucro somente em 2024.

Segundo a Globo, no último ano, a emissora "aumentou em 80% o investimento em tecnologia para o Globoplay --e pretende dobrar o volume este ano. A empresa está adotando medidas como a expansão da sua infraestrutura de distribuição de vídeos e sua CDN ('Content Delivery Network')".

Mas o desafio não está somente nos custos de infraestrutura. São necessários investimentos de marketing, sistemas de pagamento, detecção de fraude, compra de conteúdo e tributos, o que reduz a receita líquida da emissora. E à medida que a plataforma cresce, surgem novas contas.

No final do ano passado, o Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição) realizou a primeira distribuição direta de direitos autorais dos valores pagos pelas plataformas Globoplay e Gshow, referente à execução pública de músicas utilizadas nesses serviços entre janeiro e junho de 2020.

Essas canções compõem a trilha sonora de quase 70 mil obras audiovisuais que, juntas, somam cerca de 2,2 bilhões de exibições no período.

reprodução/prime video

Filme do Prime Video; streaming tem escala global

Além disso, a concorrência é feroz no streaming, com players como Netflix, Amazon Prime e Disney+ mais capitalizados e com escala global. O Globoplay até tem planos de internacionalização, mas basicamente visa os brasileiros que moram no exterior.

TV é TV, digital é digital

O digital tem uma dinâmica bastante diferente da TV e isso só faz aumentar os problemas. A televisão tem baixo custo de distribuição, enquanto o digital tem custo de distribuição para cada usuário. O choque cultural é sempre um desafio para a gestão de empresas em transição.

Nos Estados Unidos, onde as grandes redes de TV são listadas em bolsa e obrigadas a revelar os resultados operacionais, os números mostram como as reestruturações e a migração para o streaming são caras e difíceis. As frequentes demissões e cortes de custo, como os realizados recentemente pela Globo, também têm se intensificado.

Na gigante NBCUniversal, em suas operações de TV, somente no último trimestre de 2020 os custos de rescisão foram de US$ 590 milhões.

"Embora nossa reestruturação definitivamente tenha eliminado muitos custos do negócio, o verdadeiro propósito dessa reestruturação era nos permitir crescer no futuro e realmente administrá-lo como um só negócio", disse Jeff Shell, CEO da empresa, aos investidores em 28 de janeiro, comentando o redirecionamento da verba da TV para o digital.

Um discurso bastante semelhante ao da Globo, que tem divulgado seu projeto Uma Só Globo (com TV e digital unidos inclusive nas propostas comerciais).
Porém a NBCUniversal, que tem uma parceria de conteúdo com a líder brasileira de audiência, adotou a estratégia de crescer seu streaming, mas sem gastar muito.

Segundo o site The Information, à medida que Netflix e Disney+ disparam na liderança e preferência dos assinantes, a NBCUniversal busca se fundir com a WarnerMedia, que é dona da HBO Max, novo streaming que será lançado em 39 países na América Latina e no Caribe, incluindo o Brasil.

Mas mesmo as gigantes NBCUniversal e WarnerMedia, que ao contrário do Grupo Globo têm maior potencial de escala global, estão ficando pequenas para concorrer com Netflix e Disney+.

Mesmo que os acionistas da Globo estejam dispostos a investir pelos próximos anos e ter prejuízo no streaming como as concorrentes americanas, é preciso administrar a velocidade com que esse dinheiro deixa a TV tradicional e vai para o digital.

Enquanto isso, a Globo, que se tornou notória por seu padrão de qualidade, corre o risco de se tornar conhecida por ter um streaming instável e imprevisível como alguns participantes do BBB.


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