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MACHISMO VELADO

Caso Amanda Klein: O que é manterrupting e por que você não deve fazer isso?

Reprodução/Instagram

Amanda Klein de calça branca e blusa rosé sentada na bancada do Opinião no Ar, da RedeTV!

Amanda Klein estreou no Opinião no Ar na segunda (28); ela foi vítima do manterrupting

MARÍLIA BARBOSA

marilia@noticiasdatv.com

Publicado em 1/10/2020 - 7h05

Amanda Klein entrou para a lista de mulheres que sofreram desrespeito ao vivo por parte de homens. A apresentadora da RedeTV! foi interrompida 27 vezes apenas na estreia do Opinião no Ar, comandado por Luís Ernesto Lacombe, na última segunda-feira (28). O comportamento do âncora e dos convidados configura a prática de manterrupting. Mas o que significa este termo?

De acordo com Juliana Valente, advogada especializada no atendimento de mulheres em situações de violências, a palavra em inglês pode ser traduzida tranquilamente para o português como "macho palestrinha": aquele homem com características de convencimento bem marcantes e que nunca gosta de perder a palavra.

"Entendemos manterrupting como um senso de direito que o homem torna natural se sobrepondo ao outro. Ele grita para interromper ou interrompe de uma forma não educada. Esse comportamento está ligado ao homem achar que é conhecedor daquela explicação, e que as mulheres são incapazes de terminar aquele raciocínio", ensina ela, em entrevista ao Notícias da TV.

Gabriela Prioli e Kéfera Buchmann também já passaram por situações similares na CNN Brasil e na Globo, respectivamente, uma prova de que o manterrupting não é exclusividade da RedeTV! na televisão.

Juliana acredita que este tipo de prática tem como causa o machismo enraizado na sociedade. "Mesmo que toda mulher tenha o direito de intervir, eles se sentem no direito de interromper. São tentativas de calar a mulher do espaço que ela vem ocupando", completa.

Advogada membro da Rede Femijuris --plataforma criada para fortalecer o protagonismo da mulher no exercício da advocacia--, Raphaella Reis de Oliveira destaca também que a educação recebida pelos homens se torna diferente em alguns aspectos.

REPRODUÇÃO/REDETV!

Amanda Klein em um debate com Lacombe e Sikêra Jr.

"O papel social é ensinado na infância, no processo de socialização, que define o que é comportamento 'de menina' e 'de menino' e pauta o senso de individualidade. Com o tempo e outros fatores culturais, como religião, esta aprendizagem incorpora generalizações sobre papéis sociais distintos, criando estereótipos de gênero", afirma a defensora.

"Temos uma sociedade fundada no estereótipo de gênero masculino, ou seja, pregamos a supervalorização de características associadas ao sexo masculino, em detrimento das associadas ao sexo feminino", reitera Raphaella.

Raízes do passado

Juliana Valente ainda faz uma relação das atitudes empregadas atualmente com definições criadas na época da Grécia Antiga. "Apesar de os termos serem novos, a gente vê claramente essa sede do homem pela autoridade e para calar a mulher desde a polis grega", reitera ela.

Para a advogada, é possível fazer uma comparação entre a forma como a sociedade vê a mulher e a definição da palavra "idiota". "[Idiota] vem do prefixo 'idio', o que só pensa no 'eu', o egoísta. E para os gregos seria aquele que não pensa na coisa pública, que pensa somente no privado. Aos poucos, a sociedade colocou a mulher neste papel, para ser vista como a pessoa do lar, no âmbito privado", detalha.

Juliana ainda analisa pontualmente o caso de Amanda Klein: "Quando a gente tenta ocupar o espaço em um ambiente público, ou em um debate jornalístico, esse tipo de coisa acontece. Percebi que eles [sobretudo Sikêra Jr.] gritavam: 'Amanda! Amanda!'. Como se quisessem que ela ocupasse esse espaço de idiota".

E o mansplaining?

Assim como o manterrupting, Amanda Klein também foi alvo de mansplaining durante o debate da RedeTV!. O termo nada mais é do que a interrupção da fala da mulher para repetir o que já havia falado, em um tom professoral. Em tradução livre, significa "homens que explicam". Ele pode servir também para validar a voz dela.

"Ocorre quando um homem, presumindo que a mulher não tem condições de debater ou conhecer algo sem que ele mastigue a informação, explica algo bastante óbvio. Também serve para que o homem 'esclareça' a mulher sobre os erros de seus pensamentos, sobrepondo o ponto de vista dele ao dela, ou explicar acertos dela como se a opinião dele validasse à voz dela, apenas para demonstrar conhecimento aparentemente superior", detalha Raphaella.

No caso da apresentadora, o mansplaining foi aplicado no ambiente de trabalho, no qual usaram a ferramenta para que ela fosse exibida para os colegas, e neste caso para o público, como menos competente. "No caso dela, eles soltaram uma fala cortando-a enquanto ela elaborava um pensamento com base em dados científicos", completa Juliana.

Por que você não deve fazer isso?

O homem que pratica mansplaining e o manterrupting precisa ter em mente que a democracia é a parte principal das relações humanas. E que ele não é superior à mulher em nenhuma conjuntura.

Quando um homem se mostra superior a uma mulher, alimenta-se o comportamento já existente desde os primórdios e não há evolução do ser humano. "A gente quer que eles nos compreendam", diz Juliana Valente. "Espero que estes jornalistas, bem como os homens no geral, aprendam com esse tipo de debate e se desconstruam. Esse tipo de aprendizado só soma para a construção do nosso estado democrático de direito."

Ela ainda pontua o que o homem deve fazer para deixar de ser "macho palestrinha": "Ouvir com respeito e esperar o seu momento de falar, e principalmente, não interromper de uma forma violenta. Muitas vezes os homens não estão nem ouvindo o que a gente está falando e acabam se sobrepondo. E para nós, mulheres, quando formos interrompidas, a minha dica é sempre dizer: 'Por gentileza, deixa eu terminar de falar'", conclui.

Integrante da Rede Feminista de Juristas, Raphaella frisa que a criação dos termos mansplaining e o manterrupting não são o único problema do machismo. "As culturas de opressão são construídas em detalhes, tijolo por tijolo. Tijolos de uma parede muito maior e mais perversa, que precisamos combater."


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