RENATA AFONSO
DIVULGAÇÃO/CNN BRASIL
Renata Afonso é a nova CEO da CNN Brasil; executiva quer tornar o canal em um lugar livre de preconceitos
Mulher, casada com outra mulher, criada com parentes negros e intolerante a qualquer tipo de preconceito. Foi dessa maneira que Renata Afonso se apresentou a todos os funcionários da CNN Brasilao assumir o cargo de CEO do canal de notícias, há três semanas.
A chegada de Renata causou um frisson no mercado. Outros executivos de mídia, todos homens, figuravam como favoritos nas principais bolsas de apostas, mas foi a ex-presidente da TV Tem, afiliada da Globo no interior de São Paulo, a escolhida por Rubens Menin, dono do canal.
O fato de ser uma mulher no posto máximo de um canal de notícias chocou muita gente poderosa e esclarecida. São poucas as que chegam ao topo da pirâmide, e ela encara sua posição como uma missão para encorajar e estimular outras mulheres a quebrarem paradigmas em suas áreas de atuação.
Quando vim para a CNN eu fiz uma reflexão. O que de fato chamou tanto a atenção? Acho que é justamente ser um veículo de notícia, não é um veículo de comunicação. Se estivesse à frente de um canal de comportamento, talvez não chamasse a atenção o fato de eu ser mulher.
Em entrevista exclusiva ao Notícias da TV, a nova presidente da CNN Brasil falou sobre o modelo de gestão que pretende implantar, explicou o motivo de abrir detalhes de sua vida íntima à equipe, comentou sobre o relacionamento do canal com o presidente Jair Bolsonaro e assumiu que promoverá mudanças nos programas e no quadro de apresentadores.
Essa é a sua terceira semana como CEO da CNN Brasil. Você já identificou os aspectos que precisam de melhorias?
Renata Afonso: Tem muita coisa a se desenvolver aqui dentro. A CNN é uma empresa muito nova e que ganhou corpo muito rápido. [Com] A velocidade com que foi lançada e o tamanho que chegou, obviamente que tem uma série de coisas que precisam de ajuste de alicerce. Um exemplo mais concreto, te diria que acho os jornais muito parecidos. A gente pode diversificar, ter caras e formatos diferentes, para tratar a notícia de formas diferentes.
O Live CNN e O Grande Debate estão no pacote de êxitos da CNN. O primeiro pela audiência, o segundo por ter inspirado a GloboNews a criar um quadro semelhante. Mas há algo que não conseguimos identificar no canal, que é sua identidade. No momento em que vivemos, a CNN seguirá sem se posicionar? Não precisaria mostrar mais o seu DNA e suas convicções?
Eu acho que não. A convicção da CNN é ser neutra, buscar ao máximo a imparcialidade, independentemente do momento político e da situação que o país está vivendo. A gente tem que mostrar a notícia, e a notícia vai falar por si só. O que não cabe é omitir notícia a favor ou criar, ou intensificar contra a oposição ou a situação. A busca incessante da CNN é ser um canal imparcial.
Então quando você fala que liga na CNN e não sabe o que esperar, eu ouço isso como um grande elogio. Porque é exatamente isso o que eu quero. Você vai ligar na CNN para descobrir, e construir a própria reflexão a partir das informações que a CNN está dando. Essa conclusão quem vai chegar é você. A nossa missão aqui é te munir de diferentes pontos de vista, de diferentes análises para que você chegue à sua própria conclusão das suas convicções.
O apoio do Bolsonaro à CNN não te incomoda? Não é um risco para essa imagem de emissora imparcial?
Que apoio? Estou aqui há três semanas oficialmente. Nas duas primeiras foi um contato direto com os poderes. Estive com o presidente Jair Bolsonaro, com o Arthur Lira [presidente da Câmara dos Deputados], com o Rodrigo Pacheco [presidente do Senado], com o Luiz Fux [presidente do Supremo Tribunal Federal]. Foi uma reunião. Eu não entendo onde estaria esse apoio, seja a favor ou contra a CNN no governo federal.
Esse apoio a gente vê não na sua visita, aliás, que deve ter sido uma das poucas executivas de mídia que o presidente recebeu além de SBT, Record e RedeTV!. Mas desde o início o presidente incentiva a CNN, estimula como um contraponto à Globo. É nesse aspecto que a gente vê um apoio explícito.
Qualquer apoio, do presidente ou de qualquer governo, será bem-vindo porque queremos ser reconhecidos como imparciais. Ter apoio tanto da oposição, quanto do governo, vejo isso com bons olhos. Significa que estamos fazendo um jornalismo sério. Estranho seria se eu tivesse apoio só de um dos lados, aí eu ficaria um pouco mais receosa e preocupada. Quando a gente tem um canal que todo mundo dá entrevista, [as pessoas] se sentem confortáveis diante do microfone da CNN, isso pra mim é só motivo de orgulho.
O presidente recentemente chamou o Fernando Molica de energúmeno e Daniela Lima de quadrúpede. Se um deles vier a processar o presidente por injúria ou ofensa, a CNN apoiaria?
Isso é uma iniciativa de cada um. Acima da CNN tem um profissional, um ser humano que foi afetado por isso, e a gente tem que analisar as consequências de uma situação como essa. A gestão da CNN é voltada inclusive para os profissionais internos, o ambiente agradável de uma redação. Jornalismo é feito de gente essencialmente, essas pessoas precisam estar bem, essas pessoas precisam estar confortáveis, seguras, ter uma empresa que os apoie.
Uma das críticas recentes foi a tímida cobertura dos protestos do último fim de semana contra o governo de Jair Bolsonaro. Por quê?
A gente precisa reforçar a CNN aos finais de semana. De segunda a sexta é um canal, e de fim de semana ele tem uma cobertura mais tímida. Existe um cuidado grande para que a gente não seja meio de convocação para qualquer tipo de manifestação. Em relação a sábado [29 de maio], se a gente conseguisse dimensionar que teria sido do tamanho que foi, talvez a gente tivesse entrado um pouco antes. Uma vez que a gente estava completamente full, na segunda-feira (31) repercutimos a manifestação do fim de semana.
Isso é uma mea-culpa? Você avalia não só a CNN Brasil, mas as outras emissoras dimensionaram mal os acontecimentos de sábado e tentaram recuperar o tamanho dele na segunda-feira?
Não é uma mea-culpa. Essas coisas são muito orgânicas. É muito do feeling do momento. Se você me perguntar "poderíamos ter entrado um pouco mais cedo?", eu acho que a gente entrou na hora que a gente viu que a coisa realmente era grande e era importante. Entramos e vimos que era notícia. Temos pessoas na rua e isso cabe a cobertura que a gente fez, e depois na segunda-feira uma cobertura maior do evento.
Logo em suas primeiras reuniões na CNN, você frisou que é uma mulher, casada com outra mulher, tem parentes negros e que não tolera qualquer tipo de preconceito. Primeiramente quero saber como é ser uma mulher e ocupar o cargo de presidente de um canal de notícias? E por que abriu sua vida pessoal logo de cara para seus funcionários?
Isso é o meu DNA. Como gestora e querendo fazer uma gestão transparente, não poderia esconder quais são as minhas convicções e quem sou. É natural que eu comece a minha gestão contando para eles de quem eu sou. E não tenho a menor vergonha de mim, pelo contrário, tenho muita satisfação e muito orgulho de quem sou, das minhas convicções e dos meus princípios.
Esse é um valor da CNN. Vamos lutar contra qualquer tipo de conceito, de assédio, de desrespeito, será uma gestão respeitosa, em que as pessoas serão tratadas com respeito. Agora como ser mulher, que foi a primeira pergunta, uma coisa chama muito a atenção. Quando assumi aqui, eu era CEO de um canal de TV superimportante. Eu não tinha tanta exposição e as pessoas não se chocavam tanto com o fato de eu ser mulher.
Quando vim para a CNN eu fiz uma reflexão. O que de fato chamou tanto a atenção? Acho que é justamente ser um veículo de notícia, não é um veículo de comunicação. Se estivesse à frente de um canal de comportamento, talvez não chamasse a atenção o fato de eu ser mulher. Tenho um compromisso enorme com as outras gerações que estão vindo, e com todas as mulheres. Imagino que meu papel aqui não diz respeito exclusivamente a mim, mas diz às outras mulheres que buscam tanto o seu espaço no mercado de trabalho.
Daniela Lima e Monalisa Perrone já foram atacadas por questões políticas. Outras apresentadoras sofrem com montagens maldosas por seus figurinos, recebem comentários indelicados sobre seus tipos físicos. O que você fará para aumentar esse conforto e dar mais segurança para suas funcionárias?
Esse é um trabalho que a gente faz diariamente como mulher, e não é só aqui no canal. É incrível como nós, mulheres, ainda sofremos isso no dia a dia. É a roupa que você usa, se você é mais alta ou mais magra, acham que a forma de atacar a mulher é sempre por questões físicas, então desqualificam a mulher em todos os sentidos. Acho que isso não é uma questão exclusiva nossa.
Como mulher, eu me protejo, tenho minhas armas, e preciso de todas as outras mulheres para que a gente se proteja juntas e mude tudo isso. Mas ao mesmo tempo como gestora eu tenho a obrigação com os negros da equipe, com os homossexuais da equipe, com as pessoas de outros Estados, que no jornalismo há preconceito muitas vezes com sotaques diferentes. Não é uma luta que se restringe ao cargo que eu ocupo, é uma luta de vida.
Falando sobre a questão da ampliação da pluralidade dentro da CNN, a gente vê apresentadores negros, mas ainda são poucos. Você ampliará o quadro?
A empresa, quanto mais diversa, mais produtiva e entrega melhor os resultados. Sim, a CNN está aberta para profissionais de vários perfis. Claro que a gente tem a questão de competência em todos os níveis, mas sim, a pluralidade e a diversidade são valores da CNN e a gente vai cada vez mais trazer para a CNN.
Podemos contar com novos rostos vindo à tela?
Hoje não tenho vagas abertas. A gente fala do vídeo, que é a representação para muitos. Mas a empresa é muito mais que isso. Hoje a CNN tem 800 funcionários. Eu pedi para fazer um censo para entender de fato quem são os colaboradores e para dizer "precisa aumentar para um lado ou para outro". No vídeo, sim, acho que a gente precisa ter mais representação negra. Isso no Brasil inteiro, como em posições de comando. Mas isso estende para um debate que é muito mais amplo do que só a CNN.
Phelipe Siani, Caio Coppolla, Gloria Vanique e Rita Lisauskas estão fora do ar há meses. Quais serão os destinos deles já que não existem vagas?
A CNN está em expansão. Hoje eu não consigo falar que vamos contratar pessoas. Mas estou estudando uma série de novidades que teremos. A CNN será muito maior do que hoje. Esse núcleo de hard news continua, mas a gente vai expandir para uma cobertura maior nos finais de semana, para o soft news, temos um ano eleitoral à frente.
Não vejo hoje o porquê dessas pessoas não serem aproveitadas em novos projetos. Eles têm talentos. Não entrei profundamente em cada um deles, não sei se vencem seus contratos no mês que vem, se eles querem ficar, se eles vão caber dentro do que a gente está imaginando, mas temos muitos talentos fora do vídeo. E alguns deles farão parte do movimento de expansão da CNN.
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