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COLUNA DE MÍDIA

Pode fazer sentido vender a Globo? Dívida, conteúdo e tecnologia serão decisivos

REPRODUÇÃO/TV GLOBO

Tiago Leifert com uma camisa rosa, olhando para frente

Tiago Leifert é o apresentador do Big Brother Brasil; programa fez Globoplay sofrer apagões

GUILHERME RAVACHE

ravache@proton.me

Publicado em 18/3/2021 - 7h00

A Globo negou o boato de que estaria sendo vendida. A J&F, dos irmãos Joesley e Wesley Batista, apontada como a compradora, desmentiu que negociava a compra. E o banco BTG Pactual, que estaria intermediando a transação, também refutou o negócio.

Mas o fato de a venda da Globo não estar acontecendo neste momento não impede que, no futuro, ela ocorra. Existe inclusive a possibilidade de alguém estar alimentando o mercado com essa informação, conhecida no jargão jornalístico como "plantando notícia", para observar como o mercado reage.

Não é segredo que as emissoras de TV no mundo todo enfrentam desafios financeiros cada vez maiores à medida que o digital avança sobre a verba publicitária e a audiência migra para plataformas online. Além disso, gigantes de tecnologia altamente capitalizadas, como Google, Amazon, Netflix e Apple, investem cada vez mais no segmento de streaming e mídia, a aposta das emissoras de TV para sobreviver.

No caso da Globo, por exemplo, o processo de digitalização da empresa custará bilhões, entre investimentos de conteúdo e infraestrutura. Os recentes apagões do Globoplay com o aumento da audiência do Big Brother são um lembrete de como crescer no digital pode ser caro e difícil. Para piorar, a maior parte da receita da Globo está atrelada à economia brasileira, que há anos patina.

Segundo relatório da Deloitte, os grupos de mídia icônicos são historicamente resilientes, mas as rápidas mudanças na mídia tradicional estão "acelerando as fusões e aquisições no setor, à medida que as empresas buscam preencher bibliotecas de conteúdo e reforçar a tecnologia".

Desde 2014, as empresas executaram mais de US$ 700 bilhões em negócios estratégicos de fusões e aquisições nos setores de mídia e entretenimento, com destaque para transações como a aquisição dos ativos de entretenimento da 21st Century Fox pela Walt Disney Co. e a aquisição da Time Warner pela AT&T., incluindo HBO e Turner.

reprodução/youtube

Disney vai lançar filme sobre Cruella De Vil

Ainda segundo o relatório, nos Estados Unidos "o setor tem sido bem mais resiliente, com queda de apenas 4% no volume de fusões e aquisições. Mas a queda de 45% no valor dos negócios sugere que as empresas estão olhando para oportunidades de pequeno e médio porte após as megafusões, embora a contínua incerteza relacionada à pandemia também prejudique as avaliações".

Note que a Globo tem as duas principais características de um alvo principal: é independente e tem um valor relativamente baixo em comparação a líderes nos EUA e Europa. Em uma escala global, a compra da Globo não seria uma mega-aquisição, principalmente com o real depreciado frente ao dólar.

O valor estimado de venda da Globo que circulou na imprensa seria inferior a US$ 5 bilhões. A compra da 21st Century Fox pela Walt Disney Co. custou US$ 71,3 bilhões em 2019, e a da Time Warner pela AT&T custou US$ 85,4 bilhões em 2016.

Dívida em dólar

Empreender no Brasil é um desafio. Não por acaso, um crescente número de multinacionais deixa o país. Veja o caso da Globo. Desde 2015, ela emitiu títulos de dívida em dólar no mercado internacional, com taxas anuais que variam entre 4,843% e 5,125%.

Em 6 de agosto de 2015, data da emissão de um título de US$ 325 milhões com vencimento em 2025, a cotação do dólar era de R$ 3,53. Nos últimos dias, o dólar esteve próximo de R$ 5,60. Ou seja, a dívida de R$ 1,147 bilhão saltou para R$ 1,820 bilhão em menos de seis anos.

Até 2030, a Globo terá de pagar mais de US$ 1 bilhão em títulos de dívida vencendo. O natural para grandes empresas, particularmente as de comunicação, é refinanciar suas dívidas, mas com a disparada do real e um cenário econômico cada vez mais instável no país, a Globo teria de pagar juros ainda maiores e aumentar sua exposição ao dólar.

divulgação/geraldo magela

João Roberto Marinho, do Grupo Globo

Quanto maior o risco, maior o juro cobrado por quem empresta. E isso em um momento em que a receita com a mídia tradicional das TVs cai e os investimentos no digital precisam aumentar.

No passado, a empresa enfrentou problemas com o endividamento em dólar por uma aposta no crescimento da TV a cabo. "Foram feitos investimentos da ordem de US$ 1,7 bilhão em infraestrutura, através da Globo Cabo e Sky Brasil, e na produção e programação de conteúdos, através da Globosat", afirma o site Memória Globo.

"O que parecia ser um processo normal de endividamento, relativo a um ciclo de investimentos, revelou-se trágico. Primeiro, porque o mercado de TV por assinatura no Brasil, ao contrário do que ocorrera em outras partes do mundo, não cresceu na velocidade e no tamanho esperado", afirma a página da Globo.

"E, o que é pior, a estabilidade da economia brasileira foi comprometida por sucessivas crises internacionais, que levaram a uma desvalorização do real frente ao dólar", completa.

O resultado foi o default da dívida (não pagamento) forçando a família Marinho a vender propriedades e reestruturar a dívida. Os mais céticos podem dizer que a hoje a Globo corre risco semelhante, mas em vez da TV a cabo, agora a aposta é o digital.

Mas se o cenário adiante é desafiador, quem teria interesse em comprar? As motivações podem ser diversas, desde um grande grupo internacional melhor capitalizado, com interesse em usar a estrutura e know-how da Globo na produção de conteúdo, até fundos "abutre" que compram empresas para enxugar custos e desmembrar a operação, vendendo-a em diversas partes.

Em novembro do ano passado, sugeri nesta mesma coluna que o Magazine Luiza poderia se unir à Globo para criar um superapp.

Existe ainda o componente político que pode atrair investidores fora do setor de mídia. Afinal, qualquer futuro proprietário da Globo se torna uma das maiores influências políticas do país.

A Globo afirma que "são absolutamente falsas as ilações publicadas pelo jornal Correio da Manhã. Não há nem nunca houve qualquer intenção de venda do Grupo Globo por parte de seus acionistas". A Globo talvez não queira ser vendida, mas isso não impede que o mercado queira comprá-la. E nada assegura que os acionistas e seus herdeiros não vão mudar de ideia.


Este texto é argumentativo e não expressa necessariamente a opinião do Notícias da TV. A Coluna de Mídia é publicada toda quinta-feira.


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