PSICÓLOGO RESPONDE
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Lucas Penteado é ator e entrou no BBB21 como Camarote; brother tem sofrido exclusão no reality
Lucas Penteado transformou sua participação no BBB21 em uma questão social ao se exceder em uma festa promovida no reality show, o que gerou conflitos com a maioria dos participantes. O comportamento do ator foi criticado dentro e fora da casa de uma maneira jamais vista e levantou a questão: por que as opiniões sobre os surtos dele configuram racismo?
O psicólogo clínico Carlos Henrique da Silva, que é negro, defende que a repercussão em torno de apenas uma atitude inapropriada de Lucas extrapolou os limites do julgamento.
"Isso nunca aconteceu em um Big Brother [da maneira como ocorre agora]. Muitas pessoas brancas já agrediram ali dentro [em outras edições] e saíram do programa com vários contratos, participações em outros programas. E agora, por uma situação pontual, ele foi estigmatizado, tirado do contexto, e as pessoas de lá de dentro não se reaproximaram", explica.
"O Projota o ouviu, mas depois se afastou completamente achando que a Karol [Conká] tinha razão, por exemplo. Duvidaram da capacidade do Lucas sobre o seu poder de escolha, sobre o que ele é capaz [de fazer na casa], trouxeram várias violências carregadas, enraizadas dentro do contexto em que ele virou o vilão", diz.
Vetado da prova do líder desta semana, o ex-Malhação tem sofrido rejeição, bullying e violência psicológica por parte dos confinados, principalmente de Lumena Aleluia, Karol Conká e Nego Di. Ele já foi expulso da mesa pela cantora e obrigado a fazer as refeições sozinho, e ainda ameaçaram jogar água em seu rosto por não poderem estapeá-lo.
A confusão começou depois que Lucas afirmou ter fingido estar bêbado para testar a fidelidade dos demais brothers, e forçar um envolvimento com Kerline Cardoso. Quando recebeu a negativa da primeira eliminada do programa, o ator a acusou de ser racista.
Carlos Henrique acredita que a maneira como alguns brothers estão agindo parte de um desejo de fazer parte de um grupo.
"A gente percebe uma necessidade psicológica de pertencimento. Quando alguém levanta a voz para falar mais alto, no caso a Karol Conká, as pessoas vão com ela para não se sentirem isoladas, como o Lucas está se sentindo. A gente julga assistindo, mas isso pode acontecer com qualquer um. Se tem uma pessoa falando e algumas outras seguindo, você pode seguir também para não ficar de fora", justifica.
Apesar disso, o psicólogo clínico não concorda com o exagero na forma como estão condenando Lucas e aponta quais os traumas que isso pode trazer para a vida do brother.
"Nem tanto como psicólogo, mas como telespectador mesmo, eu acho que todo mundo ficou preocupado com o contexto e a situação que estava acontecendo, porque foram vários tipos de violência a partir daquilo. Desde a exclusão dele, tiraram ele de um grupo em que existe aquela necessidade de pertencimento. Isso pode ser perigoso. Além de estarem atingindo e violentando verbalmente de diversas formas o tempo inteiro", argumenta.
A repercussão acerca de toda a confusão só aumenta depois de vir à tona que Lucas já sofreu de depressão no passado, informação que ele mesmo levantou no primeiro dia de programa.
"A gente sabe que ele teve depressão e, de acordo com as situações que vão acontecendo no jogo, é possível perceber que esses sintomas depressivos podem reaparecer. [Não só] pelo processo de exclusão, como também por falarem dele o tempo inteiro", analisa.
Carlos Henrique da Silva reconhece que os pretos são minoria nos consultórios de psicologia, sejam como profissionais da área ou como pacientes. Ele sustenta a ideia de que fatores históricos estão por trás de toda a rejeição em cima do Lucas.
Neste processo está o fato de as prioridades dos pretos serem a busca por uma colocação no mercado de trabalho, a alimentação e a saúde física. Sem esses três pilares, o negro não consegue sequer pensar em um tratamento psicológico para bancar.
Com isso, cria-se a ilusão de que o negro é apenas uma ferramenta de trabalho que não precisa desse tipo de apoio ou de que ele já sofreu muito no passado e que esse sofrimento o fortaleceu. Sendo assim, qualquer questão emocional que venha depois disso não é digna de merecimento.
"O acesso à psicoterapia de uma forma geral é visto como algo elitizado, só para pessoas com poder aquisitivo maior. De fato, existem outras prioridades na família brasileira, principalmente para as pessoas pretas de baixa renda. Fica mais difícil ter acesso porque é algo que não é muito bem trabalhado, especialmente na questão do acesso à informação, para que as pessoas vejam que é possível [ter acesso ao tratamento]."
"Elas às vezes não sabem que podem ter essas doenças porque precisam trabalhar e alimentar a família. A saúde mental da população preta é estigmatizada e marginalizada, porque há outras preocupações. É uma pequena parcela da população que entende a importância da saúde mental", completa o especialista.
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Lumena gritou e empurrou Lucas em discussão
Sem querer levantar qualquer possibilidade de um diagnótico equivocado com relação ao Lucas, o psicólogo reitera a importância de os profissionais da área estarem preparados para lidar com as angústias das pessoas pretas. Ele, que também atua como psicanalista de pacientes pretos e do público LGBTQ+, aposta em uma técnica chamada "transferência".
"É uma maneira de a pessoa ver a representatividade no psicólogo. Essa transferência acaba acontecendo de uma forma mais natural. Há casos em que a pessoa vai falar sobre racismo na sessão, e o psicólogo diz que é uma questão individual. A gente não pode individualizar uma questão social por trás de um sintoma. Se a pessoa quer falar sobre isso, é porque é uma questão importante. Então, a gente precisa levar em consideração", conta.
Se você estiver passando por problemas psicológicos, como depressão e ansiedade, existem duas opções para iniciar o tratamento. Confira abaixo:
Capis (Centro de Atenção Psicossocial do SUS):
Atende no Brasil todo e no esquema de portas abertas. Há tratamentos para diversos tipos de situações psíquicas (adulto, infantil, álcool e drogas, etc). Acesse o site para mais detalhes.
Grupo Afro Terapeutas:
O paciente passa por uma triagem informando a sua situação social. Ele pode ter o tratamento gratuitamente ou pagar um valor simbólico nas sessões. O acesso ao projeto é pelo perfil da ONG no Facebook ou pelo e-mail: afroterapeutas@gmail.com.
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