COLUNA DE MÍDIA
Divulgação/TV Globo
Jorge Nóbrega, presidente executivo da Globo, investe em futuro digital
Em breve, o Google deverá tornar seu dispositivo de streaming, o Chromecast, mais atraente para quem não quiser ter TV a cabo em casa. A empresa tem planos de adicionar canais gratuitos à sua plataforma inteligente baseada em Android que alimenta o Chromecast, bem como a smart TVs selecionadas de empresas como Sony e TCL. A informação foi revelada pelo site Protocol e concretiza o que o mercado temia (e esperava) há algum tempo.
Basicamente, qualquer um com volume suficiente de conteúdo poderia se tornar uma TV linear, a exemplo da Globo, SBT e outras emissoras de sinal aberto, com a diferença de que seriam transmitidos pela internet. Jornais, editoras de revistas e qualquer um produzindo horas de vídeo em volume suficiente poderia ter o próprio canal.
Há anos isso é possível. Em tese, qualquer um poderia montar uma emissora no YouTube ou na própria internet com um streaming dentro do site. Mas a questão era a experiência (normalmente isso era consumido fora da TV, no celular ou computador). Além disso, a monetização era baixa, já que no YouTube e no próprio streaming dentro do site a concorrência acontece com todo tipo de vídeo, incluindo conteúdo amador e de baixa qualidade.
A ideia do Google é criar um menu exclusivo para que o usuário de suas TVs possa escolher esses canais, como já escolhe na TV tradicional. O modelo é semelhante ao usado por fabricantes de TV como LG e Samsung que integraram canais de streaming gratuitos às suas plataformas. A Samsung transmite "bilhões de minutos" de programação linear por meio de seu serviço TV Plus todo mês, afirmou no ano passado Sang Kim, vice-presidente sênior da Samsung Electronics.
Com a entrada do Google, essa plataforma ganha credibilidade e, principalmente, curadoria e alcance, já que a empresa está presente em bilhões de aparelhos de celular e TVs pelo mundo. O Google ainda mantém conversas com distribuidores dos chamados canais Fast (streaming de televisão gratuito e com suporte de anúncios). Esses canais têm a aparência de redes de TV lineares tradicionais, completos com intervalos para anúncios.
Tradicionais grupos de mídia como Weather Channel, Scripps, Reuters, Meredith (que publica a revista People) e Bloomberg têm os próprios canais de streaming gratuitos. O plano do Google é oferecer dezenas de canais. A AMC Networks, por exemplo, lançou vários canais Fast, inclusive um dedicado à série The Walking Dead e um com comédias da IFC, como Portlandia.
O projeto deve começar pelos Estados Unidos, no último trimestre deste ano ou no início de 2022, e depois ser levado para outros países. Ou seja, cedo ou tarde, ele vai desembarcar no Brasil.
O risco para as TVs tradicionais é terem o mesmo destino dos jornais e das revistas: eles seguem produzindo conteúdo, mas quem comercializa boa parte dos espaços publicitários nessas publicações no online (e fica com a maior parte do dinheiro) é o Google. A esmagadora maioria dos anúncios que você vê na internet é vendida pela gigante de tecnologia, que domina 29% de todo o mercado de mídia digital do mundo.
É natural que, à medida que a TV aberta entre no online, o Google aumente suas ambições de abocanhar a verba do mercado de TV (ele também é dono do YouTube). A gigante também fechou recentemente acordos bilionários com Globo, Televisa e Univision. Com a parceria, o Google passa a oferecer serviços de nuvem, análise de dados e publicidade para essas empresas.
A Globo é um exemplo da relação cada vez mais delicada do Google com os grupos de mídia tradicionais. São frenemies (amigos/inimigos). O Google, ao mesmo tempo em que concorre pela verba publicitária da TV e pela atenção da audiência, também é a melhor opção de tecnologia para a Globo. No início do ano, o Globoplay teve uma série de problemas porque sua infraestrutura não conseguia atender à demanda do Big Brother.
Jorge Nóbrega, presidente executivo do Grupo Globo, tem reafirmado que o futuro da companhia é se tornar uma empresa Direct to Consumer. Ou seja, com serviços oferecidos diretamente aos usuários, tendo o Globoplay como centro dessa estratégia.
Nos Estados Unidos, várias das maiores operadoras de televisão criaram um consórcio com o objetivo de organizar os esforços de publicidade da TV no online (addressable TV). Distribuidores de TV como Comcast, Charter, Altice, Dish e o fabricante de smart TV Vizio estão entre as oito empresas envolvidas no Go Addressable, um esforço para avançar a publicidade da TV no online.
O movimento, além de unir esforços em um mercado altamente fragmentado, é uma tentativa de impedir uma reprise da história do Google com jornais e revistas. Focados em dezenas de iniciativas individuais, os publishers não conseguiram a escala nem o nível tecnológico para conter o crescimento do Google --e, em menor escala, do Facebook.
A associação não tem planos de construir tecnologia ou criar novos sistemas. Sua proposta é identificar problemas, considerar possíveis soluções e se conectar com os participantes da indústria mais bem posicionados para resolvê-los.
Segundo o Wall Street Journal, um tópico que o grupo está discutindo, por exemplo, "é como conscientizar os anunciantes sobre a escala de estoque de anúncios direcionados disponíveis em várias empresas e sistemas, e enviar essas informações para suas ferramentas de planejamento".
No Brasil, a Globo já oferece um sistema de compra de mídia online robusto. O Globo Sim é uma plataforma desenvolvida especialmente para pequenos e médios anunciantes para facilitar a compra de espaços publicitários nas plataformas da Globo. A coluna testou a ferramenta e a usabilidade é bastante semelhante à compra de mídia no Facebook e Google, apesar das categorias de segmentação ainda parecerem mais limitadas. De todo modo, por poucas dezenas de reais, qualquer empresa tem a possibilidade de colocar um anúncio na TV e nas plataformas digitais da Globo.
Por meio de sua comunicação, a Globo informou que o modelo do Globo Sim "se baseia na formatação de vídeos com ferramentas pré-definidas ou através da funcionalidade de upload de uma campanha desenvolvida pelo cliente, e, com base nos objetivos e no target, a plataforma indica a melhor campanha de inserção de conteúdo na grade". Também acrescenta: "É deste modo que o Globo Sim entrega relevância para as marcas através da exposição nas telas da Globo e de suas afiliadas, impulsionando assim o empreendedorismo local. Os valores, por sua vez, são definidos com base nas tabelas de preço vigente".
O Globo Sim vem sendo implementado gradativamente nas praças: "Atualmente, a plataforma de autoatendimento está disponível para 86 exibidoras da Globo. A previsão é estar disponível em todas as emissoras ainda neste ano. Existe ainda a intenção de evoluir as entregas de forma integrada, com a possibilidade de campanhas também no digital, até o final de 2021". No próximo ano, a plataforma deverá trazer novidades como treinamentos e facilidade de suporte à operação.
Sim, a Globo é gigantesca. É a maior empresa de comunicação da América Latina. Mas cabe a pergunta: terá escala suficiente para concorrer com o Google, Facebook e demais players digitais? A Abril também foi a maior editora da América Latina, mas não resistiu às investidas do digital em seu território. Os bilhões que a Abril investiu na internet apenas aceleraram a queda do império.
Por outro lado, o UOL, ao se tornar uma plataforma parceira de centenas de jornais e editoras (inclusive o Notícias da TV), se tornou um gigante digital. O que não impediu o UOL de seguir com uma produção de conteúdo própria, independentemente dos parceiros. Além de consultoria técnica, o UOL oferece a gestão do inventário de mídia dos parceiros.
Para encarar um concorrente do tamanho do Google, escala é essencial. E se a batalha para a Globo é dura, para emissoras menores seria ainda mais desafiadora. Unir Globo, SBT, Record, Band e outras emissoras, e vender inventário comercial de maneira conjunta, teria maiores chances de aumentar sua escala, reduzir custos de plataforma e aumentar o poder de negociação.
Além de vender publicidade de maneira unificada, unir as plataformas das emissoras também traria sinergias. Hoje, todos os grandes streamings de mídia tradicional operam no prejuízo.
Obviamente, unir concorrentes históricos não é uma tarefa simples. Mas possivelmente, talvez seja o único caminho a médio e longo prazo. A Globo é sem dúvida uma líder e gigante, mas no digital isso pode não ser o suficiente, como a editora Abril já demonstrou ao ir à falência.
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