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SÉRIE DO GLOBOPLAY

Requião acusa Globo de condenar inocentes do caso Evandro; emissora rebate

REPRODUÇÃO/GLOBOPLAY

De blusa preta e sentado, Roberto Requião concede entrevista para Caso Evandro, série do Globoplay

Roberto Requião em entrevista para a série Caso Evandro; ele fez acusações contra a Globo

VINÍCIUS ANDRADE

vinicius@noticiasdatv.com

Publicado em 9/7/2021 - 14h41
Atualizado em 9/7/2021 - 16h49

Governador do Paraná entre 1991 e 1994, época das investigações sobre o sumiço de Evandro dos Santos Caetano em Guaratuba, Roberto Requião acusou a Globo e a grande imprensa de terem condenado antecipadamente as sete pessoas que hoje são consideradas inocentes no caso. Ali Kamel, diretor de Jornalismo da Globo, admitiu que uma cobertura de 30 anos atrás é passível de críticas, mas disse que nem a emissora nem a mídia podem ser culpadas pela tortura aos réus.

As declarações foram feitas no episódio extra de Caso Evandro, que estreou no catálogo do Globoplay na quinta-feira (8). O capítulo nove, de nome Consequências, apresentou desdobramentos após a exibição da série no streaming.

"Em determinado momento, eu não tive interesse em dar entrevista alguma para um troço ligado à Globo", admitiu Requião, ao justificar o motivo de não ter aparecido na produção. No segundo episódio, o documentário mostra que o político já na década de 1980 (antes de se tornar governador) era um rival político da família Abagge, que comandava Guaratuba e foi colocada no centro das acusações pela morte de Evandro.

Requião era presidente de um conselho do Paraná que barrou o crescimento imobiliário da cidade do litoral paranaense. "O Requião teria ido para Guaratuba para um jantar com o prefeito Aldo Abagge e vereadores. Teria acontecido alguns atritos entre o Requião e o Aldo Abagge e, em algum momento, o Requião teria levantado e dito: 'Você ainda vai me pagar por isso'", relatou o jornalista Ivan Mizanzuk em Caso Evandro.

Após o sumiço do menino e a prisão de Celina e Beatriz Abagge, em 1992, durante uma coletiva de imprensa, Requião parabenizou o "belo trabalho" das polícias civil e militar do Paraná e criticou "setores da imprensa" que tentavam reduzir essa atuação.

Na entrevista ao documentário, o político disse que a Polícia Militar não pode investigar e falou que não sabia das torturas cometidas pelo grupo Águia (Ação de Grupo Unido de Inteligência e Ataque), considerada a elite da PM paranaense na década de 1990.

"Não é possível que se ponha a Polícia Militar a investigar, isso é uma distorção completa do processo. Quando eu tomei consciência do que acontecia com esse grupo [Águia], eu extingui esse grupo. Isso foi no meu segundo governo [entre 2003 e 2006], no primeiro governo eu não tinha bem consciência do que esse grupo estava fazendo e como extrapolava as suas funções. É um grupo de bandidos dentro da polícia, é a milícia, completamente desvinculado da estrutura institucional", explicou ele.

Sobre as torturas aos sete investigados na ocasião, Requião disse que só tomou conhecimento sobre isso por conta da série e que não teve ligação direta com o caso. O político culpou a imprensa, sobretudo a Globo, pela condenação antecipada dos inocentes.

"Eu tomei conhecimento das torturas agora, com o levantamento que vocês fizeram. É de uma boçalidade, de uma irracionalidade absoluta. Enquanto governador, eu não tive notícia disso, até porque o que eu via na mídia dizia exatamente o contrário, que [os policiais] eram os heróis combatendo a bruxaria assassina. O que eu sabia era pela Globo. Não era pela mídia, era pela Globo mesmo", falou o ex-governador.

A série do Globoplay mostrou uma declaração do secretário de Segurança Pública de Requião, Moacir Favetti. O gestor falou em uma entrevista ao SBT na época que, caso a Justiça soltasse os sete réus, deixaria todos eles em uma praça pública de Guaratuba, o que dava a entender que o povo faria um linchamento.

"O Favetti reagiu à mídia formada pela Globo, formada pela imprensa, pelas televisões e tudo mais, que já haviam condenado os réus. Até hoje, eu não sei quem são os executores disso. Hoje eu vejo a história e posteriormente, mas não sei quem foram os executores até hoje", opinou Requião, que complementou:

Eu não acompanhei esse caso de perto, o governador do Estado tinha mais o que fazer, para isso existe Polícia Militar, Polícia Civil, Ministério Público e juiz. Eu era governador do Paraná, não era delegado de polícia. Se eu tivesse notícia disso [de torturas], teria liquidado esse processo. Não tenho queixa do Favetti, acho que aquela alegação foi uma resposta à pressão da Globo, foi uma estupidez, mas nem tenho Favetti como um homem violento.

Após mostrar as acusações de Requião em entrevista, o episódio veicula uma nota assinada pelo diretor de Jornalismo da Globo. Veja abaixo:

Culpar a imprensa, e a Globo em particular, tornou-se o recurso daqueles que não têm explicação para os seus erros. Toda cobertura jornalística é passível de críticas, especialmente uma de três décadas atrás, quando o preconceito em relação às religiões de matriz africana não era percebido - e denunciado - como hoje. Mas nada justifica que sete inocentes tenham sido torturados para confessar um crime que não cometeram. E é espantoso que Roberto Requião, ao mesmo tempo em que reconhece que o caso teve enorme repercussão, diga que não se ocupou dele, 'porque tinha mais o que fazer'. É, ao menos, uma confissão: a de grave omissão.

Entenda o caso Evandro

Evandro Caetano desapareceu na cidade de Guaratuba, litoral do Paraná, em 1992, aos seis anos. Após cinco dias de buscas, o corpo foi encontrado num estado macabro: sem os órgãos, o couro cabeludo, as mãos e as orelhas, entre outras mutilações. Na época, isso foi entendido como parte de um ritual satânico feito pelas "bruxas de Guaratuba".

Sete pessoas foram presas por suposto envolvimento no crime, entre elas a primeira-dama da cidade e sua filha, respectivamente Celina e Beatriz Abagge. Elas foram acusadas como mandantes do assassinato e até se confessaram culpadas, mas depois afirmaram que tinham sido torturadas e obrigadas a assumirem algo que não haviam feito.

Celina e Beatriz Abagge ficaram presas durante quase seis anos, em regime fechado e domiciliar. O primeiro julgamento, em 1998, durou 34 dias e é até hoje o mais longo do Judiciário brasileiro.

Após passarem por outros júris, em 2003 e 2011, num processo de mais de 20 mil páginas, tanto Beatriz quanto Celina Abagge hoje estão em liberdade, sem pendências na Justiça. Para a mãe, o caso prescreveu por causa da idade. Já a filha, condenada a 21 anos e quatro meses de prisão, ganhou perdão de pena em 2016.

Um dos entrevistados no episódio extra é o pai de santo Osvaldo Marcineiro, apontado na ocasião como executor de Evandro --ele também foi torturado para confessar o crime e passou os últimos recluso, para não sofrer com julgamentos públicos.

Assista ao trailer da série abaixo:


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