CONFLITO DE VERSÕES
FOTOS: REPRODUÇÃO/GLOBOPLAY
Celina Abagge foi presa e torturada durante as investigações da morte do menino Evandro Caetano
Quem matou Evandro dos Santos Caetano? Essa é a principal pergunta feita por quem começou a assistir à série Caso Evandro no Globoplay. Os seis primeiros episódios disponíveis são cercados de reviravoltas, mas não trazem essa resposta. Os dois últimos, que serão liberados na quinta-feira (3), também não vão acabar totalmente com a curiosidade dos interessados em uma resolução para o mistério de Guaratuba.
Pessoas que passaram os últimos anos investigando o que, de fato, aconteceu em 6 de abril de 1992, data do sumiço da criança de apenas seis anos, não conseguem entrar em um consenso sobre a morte. E isso fica evidente na batalha de versões apresentada ao longo dos episódios da série Caso Evandro.
Nem mesmo o jornalista e pesquisador Ivan Mizanzuk, que produziu o podcast de 36 edições Projeto Humanos - Caso Evandro, consegue ter uma resposta definitiva sobre o caso. A realização dos programas em áudio foi o que despertou a ideia de transformar a história em um documentário para o streaming. Ao todo, foram dois anos de trabalho.
Evandro Caetano desapareceu na cidade de Guaratuba, litoral do Paraná, em 1992, aos seis anos. Após cinco dias de buscas, o corpo foi encontrado num estado macabro: sem os órgãos, o couro cabeludo, as mãos e as orelhas, entre outras mutilações. Na época, isso foi entendido como parte de um ritual satânico feito pelas "bruxas de Guaratuba".
Sete pessoas foram presas por suposto envolvimento no crime, entre elas a primeira-dama da cidade e sua filha, respectivamente Celina e Beatriz Abagge. Elas foram acusadas como mandantes do assassinato e até se confessaram culpadas, mas depois afirmaram que tinham sido torturadas e obrigadas a assumirem algo que não haviam feito.
No último episódio do podcast e também em um texto publicado no site Projeto Humanos, Mizanzuk afirmou que acredita que os sete presos são inocentes e foram torturados para confessaram a culpa no crime, que o corpo encontrado desfigurado na mata era mesmo o de Evandro e que não houve nenhuma ligação da morte com rituais satânicos.
Para o pesquisador, o sumiço de Evandro Ramos Caetano está ligado ao de Leandro Bossi, outra criança que havia desaparecido na mesma cidade meses antes de Evandro. Além disso, conforme a série mostra, a ossada de uma menina foi encontrada juntamente com as roupas de Leandro em um matagal.
Ivan Mizanzuk aponta pendências nas investigações. Uma delas é que Diorli José Beza, um homem que foi preso em 28 de abril de 1995 em Guaratuba, afirmou ter ouvido Leandro Facco confessar o rapto de Leandro e Evandro.
Facco, um integrante da quadrilha de Arlete Hilu, mulher acusada de fazer tráfico de crianças na década de 1980, teria dito que os meninos seriam levados para Pernambuco para serem vendidos a um fazendeiro por US$ 7 mil.
Um dos meninos, porém, foi morto por chorar demais antes de ser entregue ao comprador. A polícia não investigou esse depoimento na ocasião; o pesquisador também não conseguiu confirmar essa versão.
Ivan Mizanzuk em entrevista para a série
Uma outra hipótese, que deve ser abordada nos dois últimos episódios de Caso Evandro, é a de um serial killer que teria atuado em Guaratuba na época dos desaparecimentos de Leandro e Evandro. O criminoso também estaria ligado à ossada da menina encontrada na mata. Mizanzuk acha que essa é a hipótese mais viável.
"Quando se pensa no caso Evandro, é difícil achar sentido em qualquer coisa. Uma criança morreu. Uma vida foi impedida de continuar. Enquanto isso, outras foram marcadas para sempre com acusações infundadas e as dores das torturas. Que essa triste história seja lembrada como merece ser: uma lição de como, muitas vezes, os culpados são ignorados, e só nos restam as vítimas", diz o texto publicado no site Projeto Humanos.
Celina e Beatriz Abagge ficaram presas durante quase seis anos, em regime fechado e domiciliar. O primeiro julgamento, em 1998, durou 34 dias e é até hoje o mais longo do Judiciário brasileiro.
Após passarem por outros júris, em 2003 e 2011, num processo de mais de 20 mil páginas, tanto Beatriz quanto Celina Abagge hoje estão em liberdade, sem pendências na Justiça. Para a mãe, o caso prescreveu por causa da idade. Já a filha, condenada a 21 anos e quatro meses de prisão, ganhou perdão de pena em 2016.
"Para o Estado, o caso está encerrado, não existe recurso. Só que eu também gosto de mostrar que às vezes o Estado te dá resoluções que talvez não sejam convictas. Gosto muito de usar essa história pra mostrar como funciona nosso sistema judiciário", falou Mizanzuk, que também lançará em junho um livro sobre o Caso Evandro.
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