COLUNA DE MÍDIA
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Alessandra Negrini e Marco Pigossi em Cidade Invisível, da Netflix; streamings poderão receber investimentos
A migração do público da TV aberta e do cabo para o streaming é um caminho sem volta. Mas, dessa mudança, surge uma questão: quem herdará a verba que hoje está na TV aberta e no cabo? Essa será a próxima grande batalha do mercado e moldará o futuro da mídia.
O modelo de streaming está cada vez mais consolidado. Netflix, Prime Video, Disney+ e Apple TV+ lideram esse jogo e não têm planos de abrir suas plataformas para publicidade. Porém, se as pessoas passam cada vez mais tempo em plataformas fechadas (e menos na TV), como os anunciantes vão alcançar o público com seus anúncios?
A resposta mais óbvia seria imaginar que Google e Facebook, os dois grandes líderes de receita online no Ocidente, seriam os herdeiros naturais da verba da mídia tradicional. Mas existe uma boa chance de que as mudanças sejam tão grandes e tão rápidas que até mesmo o duopólio perca seu domínio.
"Estamos agora no meio do que talvez seja a ruptura mais significativa no cenário midiático, cujas implicações nos negócios e na sociedade estão apenas começando a ser percebidas", diz Rishad Tobaccowala, conselheiro sênior do Publicis Groupe, uma das três maiores agências de comunicação do mundo.
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Rishad Tobaccowala crê que mercado mudará
"Uma ruptura que não é impulsionada apenas pelos avanços da tecnologia, mas uma ruptura muito profunda na própria estrutura de cada elemento de como a mídia, a mensagem, o conteúdo e a informação são criados, projetados, distribuídos, consumidos, compartilhados e confiáveis", acrescenta.
Tobaccowala, que abordou o tema em um recente post em seu blog, afirma que a dupla dinâmica Google e Facebook será cada vez mais atacada por rivais que agem como vira-latas do marketing. São empresas que começaram como pure players, dedicadas a segmentos específicos do mercado, mas que se adaptaram e diversificaram.
Por exemplo, a Amazon começou dedicada ao e-commerce, o Twitter a mensagens, o Pinterest a imagens, Snapchat e TikTok a vídeos. Mas, à medida que o mercado evoluiu, elas mudaram e diversificaram sua área de atuação. Mesmo o Google e o Facebook tiveram de ampliar seus negócios e se tornaram vira-latas.
"Todas as sete plataformas estão continuando sua jornada de raças puras a mestiços. As antigas denominações de busca, e-commerce, social e mobile são muito antigas e devem ser retiradas imediatamente. Tratam-se de plataformas de negócios e marketing multimídia e multi-recursos", afirma Tobaccowala.
"Eles integram comércio e geração de leads; podem ser microdirecionados ou aumentados. Eles podem fornecer uma mistura de criadores de conteúdo e redes de influenciadores para acelerar as pegadas de distribuição do comerciante e as possibilidades de narrativa e conteúdo", completa.
Nos Estados Unidos, esses sete vira-latas de marketing estão sendo acompanhados por pelo menos dois outros grandes players, Walmart e Target, que estão investindo profundamente para se tornarem empresas de mídia. Também aqui se verá a combinação de mensagens, utilidades, distribuição e comércio em toda a jornada do consumidor/cliente.
No Brasil, o Magazine Luiza provavelmente é a empresa mais próxima deste modelo de vira-lata digital. E vale notar que o termo não é usado de maneira pejorativa. É justamente o contrário. Vira-latas são notoriamente resistentes e adaptáveis graças à sua diversidade.
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Maga Lu, influenciadora virtual do Magazine Luiza
E, à medida que o dinheiro da TV migra para os vira-latas, outra grande mudança acontecerá no setor de produção de conteúdo, a estrutura tradicional de produtor de conteúdo, editor, agregador e distribuidor será desmantelada.
Os vira-latas dão cada vez mais voz e poder a quem antes era refém de tradicionais grupos de mídia que controlavam a distribuição e monetização da informação. Hoje, um jornalista pode optar por trabalhar para um grupo de mídia ou abrir a própria plataforma e monetizá-la com ferramentas acessíveis e baratas, desde que tenha criado sua própria audiência.
No passado, influenciadores como Felipe Neto e Whindersson Nunes só seriam possíveis se estivessem empregados em uma TV (ou no rádio, se voltarmos mais décadas). Mas isso é passado, influenciadores se tornaram donos dos próprios negócios e meios de distribuição. E esse é um movimento que está somente começando.
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Anúncio de The Mandalorian, disponível no Disney+
À medida que as plataformas digitais se diversificam, o conteúdo se tornará mais determinante. Foi o conteúdo que deu à Netflix e ao Disney+ a liderança na guerra do streaming e provavelmente os tornará vitoriosos. Com os vira-latas do marketing, não será diferente.
E é por essa razão que ouvimos cada vez mais discussões sobre monetização do conteúdo. Do Google ao Facebook fechando acordos para pagar por conteúdo jornalístico, passando por TikTok e Clubhouse criando programas de remuneração para criadores de conteúdo em suas plataformas, acirrando a disputa com o YouTube e Spotify, que também criam meios de monetização para criadores.
Mas o TikTok está levando a prática a novos patamares, permitindo lives para vender produtos dentro da plataforma. Já o Pinterest se tornou um grande e-commerce, seguido por Instagram e Facebook que agora também permitem que o influenciador crie sua loja online.
À medida que a tecnologia cada vez mais se torna um commodity, maior o valor da propriedade intelectual dos conteúdos. Vale lembrar que o Clubhouse é uma companhia de menos de 10 pessoas e que grande parte de sua tecnologia é fornecida pela Agora Inc., uma startup chinesa que oferece conferências de vídeos e voz para qualquer empresa interessada.
Ou seja, copiar a tecnologia do Clubhouse é fácil. Mas o valor do Clubhouse está na capacidade que tem de reunir milhares de entusiastas gerando conteúdo em salas de bate-papo, não em sua tecnologia.
Este texto é argumentativo e não expressa necessariamente a opinião do Notícias da TV. A Coluna de Mídia é publicada toda quinta-feira.
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