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João Miguel Junior/TV Globo
William Bonner e Fátima Bernardes em 2010: ele foi chefe dela durante 12 anos, o que hoje seria proibido
DANIEL CASTRO
Publicado em 28/2/2019 - 5h47
Se estivesse em vigor há dez anos, o Código de Ética e Conduta da Globo seria um obstáculo para aquele que foi o principal casal do telejornalismo brasileiro. Como editor-chefe do Jornal Nacional, William Bonner não poderia dividir a bancada com Fátima Bernardes, com quem era casado na época. Há quase quatro anos, a emissora proíbe que um casal trabalhe no mesmo departamento se um deles for chefe. Tem bastante gente sendo afetada pela regra.
Nunca falado na imprensa e pouco conhecido internamente, o código foi atualizado em abril do ano passado. Está em segunda edição. O documento é peça-chave do Programa de Compliance do Grupo Globo, que envolve uma equipe de profissionais dedicada e uma Comissão de Ética e Conduta, composta por três membros.
Compliance é uma nova área nas empresas, que visa proteger a imagem dela perante o público e o mercado por meio da adoção de normas de conduta para seus profissionais e de procedimentos para os processos produtivos. Abrange de práticas que visam impedir a corrupção e o favorecimento pessoal às atividades políticas de seus funcionários.
No código de ética da Globo, ao qual o Notícias da TV teve acesso, os funcionários e contratados são chamados de "integrantes". A eles se impõe uma série de orientações, como a intolerância ao abuso de poder e ao assédio sexual. O veto à contratação de parentes dentro de um mesmo departamento quando um deles tem cargo de chefia visa impedir favorecimento e conflitos de interesse.
Giovanna Antonelli não pode mais ser dirigida pelo marido
A nova regra torna inviável a existência de casais que até pouco tempo eram comuns na Globo. Além de William Bonner, que foi chefe de Fátima Bernardes no JN entre 1999 e 2011, houve inúmeros casos semelhantes. Patricia Poeta, que substituiu Fátima no JN até 2014, durante muito tempo foi chefiada por seu então marido, Amauri Soares, ex-executivo do Jornalismo, hoje responsável pela Programação.
Na dramaturgia, Helena Ranaldi não poderia ter interpretado a marcante Raquel, a professora que apanhava a raquetadas do marido em Mulheres Apaixonadas (2003). A novela foi dirigida por Ricardo Waddington, com quem ela era casada.
Giovanna Antonelli também não poderá mais ser dirigida por seu marido, Leonardo Nogueira, como ocorreu em Sol Nascente (2016).
ramon vasconcelos/tv globo
Giovanna Antonelli é dirigida pelo marido, Leonardo Nogueira (centro), em Sol Nascente
O código de ética, contudo, ainda faz algumas vistas grossas. Andréa Beltrão está sendo dirigida por seu marido, Maurício Farias, na minissérie sobre Hebe Camargo.
Até novembro passado, Ana Furtado era apresentadora (ou substituta) de programas (É de Casa, Encontro com Fátima Bernardes e Mais Você) em que seu marido, J.B. de Oliveira, o Boninho, era o chefe supremo --em dezembro, essas três atrações passaram para o guarda-chuva de Mariano Boni.
Faustão é chefe da mulher, que é diretora do programa
No Domingão do Faustão, há um caso dúbio para a aplicação do código de ética. Fausto Silva, o apresentador, é casado com Luciana Cardoso, diretora de criação do programa. A subordinada aqui é Luciana, apesar do cargo de direção.
Essas vistas grossas, na verdade, são exceções permitidas. No departamento Artístico, a coexistência de um casal no mesmo trabalho em que um é subordinado ao outro pode ser autorizada por Silvio de Abreu, diretor de Teledramaturgia. É o caso da minissérie Hebe.
No Jornalismo, a tolerância é mais difícil. Se ainda fossem casados e ainda trabalhassem no Jornal Nacional, Bonner e Fátima teriam que pedir autorização para o presidente do Grupo Globo, Roberto Irineu Marinho. Nem o diretor-geral da emissora, Carlos Henrique Schroder, tem o poder de permitir exceções a essa regra.
Isso já repercute no dia a dia dos profissionais. Em São Paulo, a repórter Bruna Vieira não produz para o Jornal da Globo porque tem um relacionamento com Jorge Sacramento, editor-chefe do telejornal.
Recentemente, Sandra Camanho, coordenadora do Bom Dia Brasil, teve que pedir demissão, depois de 18 anos de casa, para poder acompanhar o marido, Luiz Fernando Ávila, promovido a diretor de Jornalismo em Brasília.
Pelo código de ética, Sandra não pode ser chefiada por Ávila, o que seria inevitável na estrutura da emissora no Distrito Federal. Consultada, a Globo diz que ela pediu demissão por motivos pessoais, e não por recomendação da área de Compliance.
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