Análise
Reprodução/TV Globo
Caio Blat e Ricardo Pereira em cena em que seus personagens transam em Liberdade
RAPHAEL SCIRE
Publicado em 13/7/2016 - 6h35
Depois da polêmica com o beijo gay no primeiro capítulo de Babilônia (2015) e a consequente rejeição que a trama sofreu, a Globo volta a cutucar a ferida de um tema caro ao conservadorismo. Visto como um caso imoral pela sociedade da época em que Liberdade, Liberdade é ambientada, o romance entre André (Caio Blat) e Tolentino (Ricardo Pereira) pouco a pouco foi ganhando contornos até culminar na primeira cena de sexo entre dois homens numa telenovela brasileira.
É bem verdade que em termos de ousadia, a novela das onze fica atrás de outras produções do horário, mas é de se considerar que finalmente a Globo abriu a cabeça para retratar um tema atual com naturalidade. Se o sexo é elemento constante em todos os folhetins, por que deixar de lado momentos íntimos com personagens gays ou fingir que eles não existem? Irônico é que tal cena tenha ocorrido em uma trama ambientada no século 19.
André é sensível, delicado e refinado, em uma interpretação calculada de Blat, ao passo que Tolentino, coronel da Guarda Real, mantém um quê de brutalidade. Seria, a um primeiro instante, uma aproximação impensada que os recursos folhetinescos logo trataram de tornar plausível. Os dois começaram a história como amigos, mas o desejo entre eles tornou-se latente. E a amizade existente não passou despercebida pela língua ferina e pelo preconceito de Branca (Nathalia Dill), a vilã da novela que ganhou ares cômicos com suas tiradas.
Após sofrer mais uma das constantes humilhações de Rubião (Mateus Solano), que acredita ter sido Tolentino o responsável pela fuga de Ascensão (Zezé Polessa), o coronel isola-se na estalagem onde mora. Eis que André o procura para ajudá-lo. O diálogo dá a deixa para o ato. Sem conseguirem mais controlar a atração que sentem um pelo outro, os dois entregam-se ao sexo em uma cena marcada pela delicadeza da direção, sem cortes nem sutilezas de ângulos e tomadas de câmera.
O beijo represado e o silêncio entre os personagens enquanto se despiam chamaram a atenção. Não foi preciso que a cena fosse explícita para ser impactante. A importância da sequência vai além da nudez mostrada.
Considerada um crime de lesa-majestade, a sodomia (como a homossexualidade era conhecida então) previa a prisão e a morte daqueles que a praticassem. O relacionamento de André e Tolentino tem tudo para ganhar mais recheios, o que contribui positivamente para a trama.
Liberdade, Liberdade começou um tanto quanto truncada, mas foi ganhando terreno e passou a tratar de temas pertinentes ao Brasil de 2016. Sem muito alarde, a cena do sexo gay exibida nesta terça (12) mostra que a novela soube cumprir seu objetivo principal: mais do que entreter, colocar em pauta um tema necessário à discussão _o combate à intolerância, sem causar gritaria desnecessária como em Babilônia. Mostra tão somente um amadurecimento, tanto da emissora quanto do público.
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