Análise | Teledramaturgia
Reprodução/TV Globo
Rafael Cardoso e Alinne Moraes em cena do último capítulo de Além do Tempo, ontem (15)
RAPHAEL SCIRE
Publicado em 16/1/2016 - 8h16
De uma novela marcada sobretudo pelo folhetim rasgado como foi Além do Tempo, era de se esperar um último capítulo essencialmente melodramático. Mas o que autora Elizabeth Jhin escreveu foi surpreendente. Ela priorizou a ação em detrimento da emoção, depois de uma reta final morosa, sem maiores acontecimentos que empolgassem os telespectadores.
Pedro (Emílio Dantas) dominou todo o capítulo e roubou os holofotes. A loucura do vilão movimentou o desfecho do casal protagonista. Primeiro, sequestrou o garoto Alex (Kadu Schon) e protagonizou uma perseguição de avião. Ainda que inverossímil, a sequência em que Felipe (Rafael Cardoso) tenta salvar o filho com um carro foi muito bem dirigida e conseguiu prender a atenção do público.
Depois, o mesmo Pedro reinou absoluto na cena em que tentou matar Felipe e Lívia (Alinne Moraes), numa cópia quase fiel à mesma cena que fechou a primeira fase da história. Agora, em vez do espadachim, ele empunhava uma arma. Dependurados em um penhasco, Felipe e Lívia foram salvos por Melissa (Paolla Oliveira), que se redimiu das maldades cometidas ao longo da novela. A cota de fantasia aqui foi preenchida pela presença do anjo Ariel (Michel Melamed) a salvar o casal principal de outra morte trágica.
No mais, o último capítulo não fugiu dos conhecidos clichês: teve casamentos (dois), personagens coadjuvantes realizados, vilões punidos ou redimidos e gravidez. Já a cena do elenco todo reunida, narrada pelos anjos da novela com um discurso piegas que parece ter saído de um livro espírita, teve clima de festa da firma no fim do ano. A sequência final dos mocinhos se beijando, entrecortada por imagens das duas fases da trama, ganhou ainda uma narração do médium Chico Xavier.
Porém, não é porque seu último capítulo surpreendeu que a novela foi livre de defeitos. A grande expectativa apresentada em Além do Tempo foi a passagem da primeira para a segunda fase da história, justificando, assim, seu título. Mas ironicamente, a novela mostrou-se muito melhor no início do que na fase ambientada na atualidade. Toda a carga folhetinesca existente na trama do século 19 se esvaziou com a mudança de tempo e a novela embarrigou. Se a primeira fase foi de tirar o fôlego, a segunda foi de tirar a paciência: faltou história e sobrou enrolação. Esticada diante do sucesso, Além do Tempo não aguentaria mais uma semana no ar.
Para compensar a falta de ter o que contar, Elizabeth Jhin apelou para flashbacks, uma maneira de lembrar exaustivamente o público do link dos personagens com seus passados. Não era necessário, uma vez que os telespectadores já estavam habituados à história. A reiteração é um recurso válido para o gênero, mas quando usado à exaustão, cansa.
O grande trunfo da novela, sem dúvida, foi o elenco, que se manteve correto nas duas fases, imprimindo nuances, expressões e maneirismos diferentes para seus personagens entre uma época e outra. Destaque principal para Irene Ravache e Julia Lemmertz (Doroteia). Emilio Dantas segurou a responsabilidade de encarar seu primeiro papel de destaque na televisão como um antagonista. Até mesmo quem entrou no final não destoou, caso de Zécarlos Machado (Queiroz).
Da trilogia espírita escrita por Elizabeth Jhin, Além do Tempo termina como sua melhor novela. As incursões anteriores da autora pelo tema, Escrito nas Estrelas (2010) e Amor Eterno Amor (2012), deram a ela o termômetro necessário do que não fazer em uma próxima trama e isso explica o sucesso alcançado de Além do Tempo. Jhin fugiu de um artifício cilada e diminuiu o didatismo, investiu na fantasia e cativou o público, mas no final ficou claro que o melhor de sua história foi seu início.
Em tempo: o último capítulo registrou média de 21 pontos no Ibope da Grande São Paulo, segundo dados preliminares, um crescimento de cinco pontos em relação à mesma faixa horária nas últimas quatro semanas.
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