ANÁLISE
Divulgação/Disney+
Dafne Keen em cena da série The Acolyte, do Disney+; plataforma se fundiu com Star+ para crescer
Na última quarta-feira (26), Disney+ e Star+ se fundiram em uma única plataforma no Brasil, com o propósito de aumentar a participação da empresa do Mickey Mouse no mercado. No fim de fevereiro, HBO Max e discovery+ já tinham feito algo similar com o lançamento da Max. São apenas dois movimentos recentes que mostram que a guerra do streaming, que tanto agitou o mercado no fim da última década, chegou ao fim. E ninguém a venceu. Nem mesmo a Netflix, líder do setor. Pelo contrário, todo mundo perdeu --principalmente você, consumidor.
Mensalidades cada vez mais caras, com aumentos sem aviso prévio, tornaram praticamente impossível assinar, pelo menos, as principais plataformas. Planos mais acessíveis vêm acompanhados de intervalos comerciais, que transformam o streaming em uma espécie de TV paga "de luxo", sob demanda.
Para piorar, a ideia de que as séries e os filmes estariam disponíveis para sempre caiu por terra, e alguns conteúdos simplesmente são retirados do catálogo sem nenhuma explicação: deseja ver Hemlock Grove (2013-2015), uma das primeiras produções originais da Netflix? Sinto muito, a gigante do streaming a excluiu em 2022. Idem para a série Willow (2022-2023), que o Disney+ lançou para surfar na nostalgia do longa de 1988 --ela sumiu apenas quatro meses depois de concluir sua primeira (e única) temporada.
O motivo principal? Corte de custos. Executivos dos grandes conglomerados perceberam que seria insustentável investir dezenas de bilhões de dólares em conteúdo do streaming e ter como única fonte de receita as assinaturas.
Para explicar, segue um cálculo extremo, mas fácil de entender: a Amazon gastou mais de US$ 1 bilhão (R$ 5,59 bilhões, na cotação atual) apenas para comprar os direitos de adaptação dos livros e para produzir O Senhor dos Anéis: Os Anéis de Poder.
O Prime Video precisaria adicionar 50 milhões de clientes só para pagar pela série. E isso nos Estados Unidos, onde a assinatura sai por US$ 19,99 (R$ 111,6). Pelo preço do Brasil, seriam necessários mais de 279 milhões de novos contratos --ou seja, nem se toda a população nacional decidisse assinar o streaming haveria receita suficiente para bancar uma única atração.
Pioneira no streaming e líder do mercado mundial, a Netflix até consegue se pagar (e com folga), depois de anos de prejuízo. Segundo a própria empresa, ela teve lucro operacional de US$ 6,9 bilhões (R$ 38,5 bilhões) em 2023. Mas, para isso, precisou frustrar seus clientes com o cancelamento de séries queridinhas e uma política que proíbe o compartilhamento de senhas, algo que a própria plataforma incentivava no passado.
A gigante também deixa a desejar com os fãs do esporte. Para não gastar verdadeiras fortunas com direitos esportivos, a Netflix tem comido pelas beiradas no gênero, com documentários sobre personalidades e eventos "alternativos", como um jogo de tênis entre Rafael Nadal e Carlos Alcaraz no fim do ano passado ou uma luta de boxe entre Mike Tyson e o youtuber Jake Paul, marcada para 15 de novembro.
A partir do ano que vem, a plataforma também terá os programas da WWE, maior empresa de luta livre do mundo --ela desembolsou US$ 5 bilhões (R$ 27,8 bilhões) para contar com o telecatch pela próxima década. Mas os embates com resultado combinado são mais entretenimento do que esporte.
Principal plataforma brasileira, o Globoplay deve dar lucro pela primeira vez neste ano. Mas, para isso, também precisou mudar sua estratégia. Não foi por acaso que a Globo escalou Manuel Belmar, seu diretor financeiro, para ocupar o lugar de Erick Brêtas, que deixou a empresa em fevereiro --e que valorizava a qualidade do conteúdo acima das finanças, de olho num retorno a longo prazo.
O primeiro grande sinal de que a gestão de Belmar será de aperto no cinto veio nesta semana, com o adiamento (por tempo indeterminado) da série Mata-Mata, desenvolvida por Cauã Reymond e que estava com a pré-produção bem avançada, roteiros escritos e gravações previstas para setembro.
A Globo --e, por consequência, o Globoplay-- vai reduzir custos onde puder para aumentar seus lucros. Algo esperado de uma empresa que precisa sobreviver, é claro. Mas é preciso também levar em conta as consequências dessas decisões: a emissora já sente o aperto na hora de escalar elencos de suas novelas. Será que o cliente do streaming vai continuar pagando por sua assinatura se sentir que não recebe conteúdo de qualidade em troca?
Lançada há quatro anos, ainda sob o título de HBOMax, a Max também sofre com a escassez de projetos próprios. Nesse período, a plataforma lançou apenas 11 séries de drama em língua inglesa --dez já foram canceladas, e o futuro do reboot de Pretty Little Liars ainda é incerto. Entre as comédias, o desempenho é um pouco melhor --mas não muito: dos 13 lançamentos, apenas cinco seguem em produção.
Para piorar a situação, o CEO da Warner Bros. Discovery, David Zaslav (que já provou várias vezes que não é do tipo que gosta de abrir a carteira), anunciou que séries muito esperadas da Max, como a adaptação televisiva de Harry Potter e Welcome to Derry (do universo de It, sobre o palhaço Pennywise) não serão mais exclusivas do streaming e terão transmissão simultânea na HBO.
Correndo por fora, o Paramount+ enfrenta problemas que vão muito além do streaming: o conglomerado que o controla, a Paramount Global, está prestes a ser vendida --para quem, ninguém sabe. A Sony, a produtora Skydance e a empresa de gestão de ativos Apollo Global Management fizeram propostas, e até a Warner Bros. Discovery demonstrou interesse (por pouco tempo).
Quando o futuro de toda a empresa está em risco, fazer planos a longo prazo para uma plataforma de conteúdo parece contraproducente. Afinal, os resultados da negociação vão afetar diretamente os próximos passos do Paramount+. Por enquanto, o streaming sobrevive de derivados de Star Trek e outras propriedades intelectuais da Paramount. Mas até quando?
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