OPINIÃO
REPRODUÇÃO/PRIME VIDEO
Arsenio Hall e Eddie Murphy em Um Príncipe em Nova York 2, disponível no Prime Video
Sou de uma geração que assistiu inúmeras vezes, e sempre como se fosse a primeira, a Um Príncipe em Nova York. Verdadeiro clássico da Sessão da Tarde, é um dos longas icônicos da década de 1980. O filme de 1988 foi tão marcante e com roteiro e interpretações tão exatas que acompanhei com ressalvas o lançamento de sua continuação, O Príncipe em Nova York 2, no Prime Video.
Até porque, tentar recriar um sucesso do passado, seja filme, novela ou espetáculo, geralmente não costuma dar muito certo. Sempre fica aquele gosto de cópia mal feita, sobretudo para quem aplaudiu o original.
Lançado em 1988, com o título em inglês Coming To America, o longa foi estrelado por Eddie Murphy, como o príncipe Akeem, e dirigido com sagacidade por John Landis. O filme ultrapassou fronteiras geográficas e étnicas para tornar-se um clássico da cultura pop.
Com fina ironia, o roteiro colocou negros em plano principal, algo até então pouco comum em Hollywood, três décadas antes do sucesso de Pantera Negra (2018) ou mesmo dos protestos antirracistas de 2020.
A produção ainda criou um interessante contraponto entre uma África conservadora e antiquada e uma América libertária e moderna, descoberta com curiosidade e paixão pelo príncipe em Nova York e seu fiel escudeiro Semmi, defendido com química por Arsenio Hall.
Não custa lembrar que Um Príncipe em Nova York foi grande referência para jovens negros, com seu milionário príncipe africano que andava sobre pétalas de rosas e fingia ser um pobre faxineiro de uma lanchonete do Queens para conquistar o amor de verdade.
reprodução/paramount pictures
Primeiro filme da franquia, lançado em 1988
Pois resolveram mexer na história que deu certo. Coming 2 America, que no Brasil virou Um Príncipe em Nova York 2, é uma continuação que gerou não só expectativa como o medo de que a retomada terminasse em desastre.
O próprio Arsenio Hall contou ao The New York Times que jamais pensava que haveria uma continuação, já que durante décadas ele e Eddie Murphy concordavam que não se deveria mexer em um passado perfeito.
Contudo, mudaram de ideia. Valeu a pena? A continuação pelo menos chega perto do que foi o primeiro filme? A resposta deste crítico, depois de assistir a Um Príncipe em Nova York 2, é só uma: não.
Se o reino de Zamunda original foi precursor do que viria ser a Wakanda de Pantera Negra, o tempo não fez bem à terra de Akeem, transformada em um lugar insosso e sem ritmo, por mais que tenham enfiado até um desperdiçado Morgan Freeman no elenco, isso sem falar em Wesley Snipes.
E olha que os roteiristas do primeiro filme, David Sheffield e Barry W. Blaustein, foram contratados para se unirem ao novato Kenya Barris, mas é perceptível a falta da inspiração original. O resultado é um roteiro rígido e de pretensões politicamente corretas, que deixam o humor engessado e sem gosto.
REPRODUÇÃO/PRIME VIDEO
Jermaine Fowler interpreta o futuro herdeiro
Agora, o centro da história não está mais em Eddie Murphy, já casado há 33 anos com a mulher amada, Lisa, vivida pela mesma Shari Headley. Ambos parecem estacionados em um matrimônio de meia-idade tão morno quanto o filme.
Tudo gira em torno de um filho concebido durante a primeira viagem de Akeem, descoberto por ele na morte de seu pai, o sempre perfeito James Earl Jones. Diante da novidade, ele retorna à América para transformar o rapaz em seu legítimo herdeiro, já que as sexistas leis de Zamunda não permitem que nenhuma das três filhas mulheres o suceda no trono.
Sem o carisma do original, o futuro príncipe, interpretado pelo canastrão Jermaine Fowler, na verdade é um cambista e foi fruto de uma relação fugaz de um drogado Akeem com a espalhafatosa Mary, interpretada com devoção por Leslie Jones. O rapaz foi criado com a ajuda do tio materno espertalhão, defendido por Tracy Morgan.
O retorno a Nova York de Akeem é rápido e sem a magia daquela primeira viagem, com o filme preferindo concentrar boa parte da história em Zamunda.
Só que, a partir daí, O Príncipe em Nova York 2 não tem muito a oferecer. O filme mostra-se tão cansado e sem graça quanto a monotonia da vida de Akeem em Zamunda, da qual um dia ele desejou fugir para a América em sua juventude. A continuação não chega aos pés do original. Ao fim, fica aquele gosto amargo de que os bons tempos não voltam mais.
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MIGUEL ARCANJO PRADO é jornalista pela UFMG, pós-graduado em Mídia, Informação e Cultura pela ECA-USP e mestre em Artes pela Unesp. É crítico da APCA, criador do Prêmio Arcanjo de Cultura e coordena a Extensão Cultural da SP Escola de Teatro. Passou por Globo, Abril, Folha, Record, Band e UOL. Clique para ver mais textos do Miguel e conheça também o Blog do Arcanjo
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