NÚMEROS DA COVID-19
REPRODUÇÃO/TV GLOBO
William Bonner no Jornal Nacional; telespectadora processou Globo por divulgação de dados da Covid-19
FERNANDA LOPES e LI LACERDA
Publicado em 27/7/2020 - 6h55
A Globo ganhou muitos "haters", pessoas que criticam o trabalho do Jornalismo da emissora, durante a pandemia do coronavírus --como o caso da mulher que invadiu uma transmissão para dizer que a emissora mentia. Mas uma telespectadora foi além. Ela entrou com liminar contra a emissora por ser contra a maneira com que os telejornais divulgam os números da Covid-19 e por achar que isso causa pânico na população.
Em São João de Meriti, na região metropolitana do Rio de Janeiro, uma mulher chamada Rosemary Matias de Lima entrou com a ação judicial em junho para solicitar que a Globo mudasse a forma de divulgar as estatísticas sobre os casos confirmados e óbitos pelo novo coronavírus.
Rosemary considerou que a emissora deveria divulgar somente os números diários sobre a doença, e não os dados acumulados desde o início da pandemia (os telejornais da Globo oferecem ambos os tipos de informação).
A telespectadora alegou que, por divulgar os números acumulados de casos e mortos, a Globo faltaria com dignidade às pessoas; que os dados divulgados seriam contraditórios e não dariam a exata dimensão da doença; que a emissora passaria a ideia de que a pandemia torna-se mais intensa a cada dia e que, consequentemente, essa forma de divulgação geraria pânico na população.
Também deu a entender que a Globo estava lhe prejudicando pessoalmente: segundo ela, ao dar informações tão preocupantes sobre o coronavírus, a emissora causa insegurança e mal-estar em todos os brasileiros e compromete medidas governamentais. Isso a abalava no sentido de que estava impedida de exercer seu trabalho como saladeira (pessoa que prepara saladas num restaurante).
O caso foi avaliado pela juíza Paula de Menezes Caldas, da 49ª Vara Cível, no Rio de Janeiro. Ela considerou que Rosemary por si só não tem legitimidade para defender os interesses de toda a sociedade ou de todos os profissionais da saúde. Além do fato de que a Globo já divulga os dados sobre a Covid-19 tanto de forma cumulativa quanto diária.
A juíza ainda considerou que a Globo não pode ser responsabilizada pela interrupção de atividades econômicas durante a quarentena.
"Ora, a forma de divulgação dos dados pela ré não possui qualquer interferência na liberação ou não das atividades econômicas interrompidas em razão da pandemia, uma vez que o afrouxamento das medidas de isolamento social constitui opção técnica/política do Poder Público".
Assim, a ação já foi extinta pela juíza ali mesmo, e a Globo não precisou sequer se defender. O advogado de Rosemary Matias da Silva, Homero Duarte, falou ao Notícias da TV sobre o caso. Ele e sua cliente discordam da maneira como a juíza tratou a ação, mas não pretendem recorrer da decisão.
Confira a nota enviada pelo advogado da telespectadora:
"Não concordamos com a decisão da magistrada, reconhecendo que a autora não possui legitimidade para a propositura da ação. No nosso entender, trata-se de matéria de interesse comum, ou seja, que diz respeito a qualquer cidadão.
Na verdade, o objetivo da ação nada mais era do que fazer com que qualquer veículo de comunicação publicasse as suas estatísticas relacionadas ao coronavírus com base nos dados diários, isto é, de acordo com o número de contaminações e de óbitos verificados naquele dia, e não cumulativamente.
É de se ressaltar que os direitos individuais, conquanto previstos na Constituição, não podem ser considerados ilimitados e absolutos, em face da natural restrição resultando do princípio da convivência das liberdades, pelo que não se permite que qualquer deles seja exercido de modo danoso à ordem pública e às liberdades alheias.
Não se nega ao jornalista, no regular exercício da sua profissão, o direito de divulgar fatos e até de emitir juízo de valor sobre uma situação ou fato específico, com a finalidade de informar a coletividade.
Daí a divulgar os números da pandemia, assunto de grande relevo nacional, repita-se, sem o cuidado necessário, vai uma barreira que não pode ser ultrapassada, sob pena de configurar o abuso de direito em detrimento da sociedade em geral."
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