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PEJOTIZAÇÃO

Receita Federal x artistas da Globo: Sócios e imóveis entram na mira de investigação

JOÃO MIGUEL JÚNIOR/TV GLOBO e DIVULGAÇÃO/RECEITA FEDERAL

Montagem de fotos com Reynaldo Gianecchini em ensaio feito pela Globo e fachada da Receita Federal

Reynaldo Gianecchini é investigado pela Receita Federal; fiscalização avançou para sócios

VINÍCIUS ANDRADE

vinicius@noticiasdatv.com

Publicado em 14/6/2021 - 7h00

Após fiscalizar e multar um grupo de artistas, diretores e autores que prestaram serviços para a Globo, a Receita Federal deu um novo passo no processo que apura os contratos PJ (pessoa jurídica) feitos pela emissora nos últimos anos. O Notícias da TV apurou que o órgão do governo federal começou a investigar familiares que são sócios dessas pessoas, além de questionar valores declarados de bens imóveis.

Esse é um novo passo da devassa que começou a ser feita em janeiro do ano passado. Depois de fiscalizar os atores na pessoa física (CPF), a Receita começou a apurar os ganhos na pessoa jurídica (CNPJ).

De acordo com o advogado tributarista Leonardo Pietro Antonelli, que representa a maior parte das celebridades nessa ação, existe uma prática "mais comum do que se imagina" nesse setor: o artista ter um familiar que participa como sócio da empresa. Ele explica:

Há casos em que a irmã, a mãe, o tio, a mulher ou marido integram as sociedades (leia-se: empresas dos atores). O mercado funciona 'baseado' numa confiança que o artista vai se desenvolvendo e progredindo na carreira ao longo dos anos, e aquele 'time' o acompanhando. Então, a partir do momento em que se inicia uma fiscalização da empresa, naturalmente a participação nos resultados dos sócios poderá ser investigada. Mas não por ser familiar de um ator e, sim, por ser sócio, muitas vezes gerente, da empresa. É assim aqui e no mundo.

Inicialmente, a Receita fez uma fiscalização na relação de emprego entre ator e emissora. A defesa mantém sob sigilo os nomes de quem já recebeu as notificações de pagamento, mas na lista de investigados estão celebridades como Deborah Secco, Reynaldo Gianecchini, Malvino Salvador e Maria Fernanda Cândido.

Também são investigados autores, diretores e jornalistas. Em abril, o colunista Ricardo Feltrin, do UOL, antecipou com exclusividade que o âncora William Bonner e outros 20 profissionais que prestam serviços para a Globo foram autuados. A líder de audiência é o principal alvo da operação contra a "pejotização", que também já atingiu profissionais de Record, SBT e CNN.

Uma das atrizes da Globo chegou a ser multada em R$ 10 milhões. A defesa tem tentado reverter a necessidade desse pagamento. Antonelli considera o entendimento do órgão como confisco tributário.

"A discussão travada pela Receita é de que o artista estaria usando uma empresa (pessoa jurídica) para economizar o imposto de renda de 27,5%. Mas as empresas dos atores ofereceram à tributação de todas as suas receitas: pagaram PIS, Cofins, Imposto de Renda Pessoa Jurídica e contribuição sobre o lucro, ISS que, juntos, podem chegar a 20%. Então, com todo o respeito à Receita Federal, entendemos que todos os tributos devidos já foram pagos na pessoa jurídica. Cobrar tudo de novo na [pessoa] física é estar cobrando duas vezes pelo mesmo serviço", aponta o tributarista.

Investigação de patrimônio

Nessa nova etapa da investigação, a Receita ampliou a fiscalização para os bens adquiridos pelos sócios: atores e familiares. Um dos questionamentos do órgão do governo federal é sobre a diferença do valor declarado do imóvel em relação ao preço de mercado. Essa é uma maneira de identificar se o patrimônio do artista é compatível ao que ele informou que recebeu ou se houve algum tipo de sonegação.

"Inexiste correlação entre a relação de trabalho do ator com a emissora e o patrimônio adquirido. Aqui não há dúvidas de que o serviço foi prestado, não há nada simulado, é tudo público e notório, confirmável via Globoplay. Ademais, por uma (mais uma) distorção do sistema tributário brasileiro, os imóveis adquiridos por todo e qualquer contribuinte não sofrem reavaliação (não há correção monetária do valor declarado originalmente no Imposto de Renda). Então, a depender da data da compra, evidentemente estará desatualizado", justifica Leonardo Antonelli.

De acordo com a lei, não há como atualizar na declaração de Imposto de Renda o preço do imóvel conforme a variação de mercado, a não ser em casos de grandes reformas. Ou seja, se uma pessoa declarou um apartamento de R$ 100 mil em 1995 e não fez mudanças significativas, ele continua valendo R$ 100 mil no IR, apesar dos mais de 500% de inflação no período.

Por conta dessa defasagem, os proprietários de imóveis precisam pagar ao "Leão", no momento da venda, pelo menos 15% de imposto sobre o ganho de capital. O Legislativo tem discutido uma mudança na lei, algo que é defendido pelo advogado tributarista.

"No Brasil, o rico não paga tributos. Cria-se uma off-shore (empresa num paraíso fiscal, legalmente declarada e que todos os bancos brasileiros oferecem no private) e/ou se abre um fundo de investimentos. A lei, nesses e outros casos, não exige o pagamento de nenhum tributo! Repito: não há pagamento de tributos", diz ele, que complementa:

Outro exemplo: pagou seu IPVA (Imposto sobre Propriedades de Veículos Automotores) anual sobre o seu carro? Se fosse barco, avião ou helicóptero, apesar de ser automotor, não seria cobrado. E, no final do dia, o ator que trabalhou e recolheu os seus tributos é o culpado. Culpado e, talvez, condenado criminalmente por fraude e sonegação fiscal, tendo em vista a representação penal oferecida pela Receita ao Ministério Público. São por essas razões que seguimos firmes e confiantes de que, ao final, serão canceladas as diversas cobranças.

A Globo, que nos últimos anos passou a trocar contratos de jornalistas, executivos e apresentadores de PJ para CLT, diz que os seus acordos são legais e que todos os impostos são pagos.

"Todas as formas de contratação praticadas pela Globo estão dentro da lei, e todos os impostos incidentes são pagos regularmente. Assim como qualquer empresa, a Globo e as empresas que lhe prestam serviços são passíveis de fiscalizações, tendo garantido por lei também o direito de questionar, em sua defesa, possíveis cobranças indevidas do fisco", sustenta a emissora, em nota.

Em agosto do ano passado, a Receita Federal explicou à reportagem que fiscaliza a chamada "pejotização" em inúmeros setores econômicos, mas que não poderia detalhar as ações em razão do sigilo fiscal.


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