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MEMÓRIA DA TV

Em 1995, Globo arrumou briga com Edir Macedo ao demonizar evangélicos

REPRODUÇÃO/TV GLOBO

Zezé Polessa e Edson Celulari estão em uma espécie de palanque em cena de Decadência (1995)

Zezé Polessa e Edson Celulari em Decadência (1995), minissérie que irritou Edir Macedo

THELL DE CASTRO

Publicado em 5/9/2021 - 9h00

Há exatamente 26 anos, a Globo arrumou uma grande confusão com os evangélicos e, principalmente, com a Igreja Universal do Reino de Deus, fundada por Edir Macedo, mesmo dono da Record, ao retratar a religião em Decadência. A minissérie de Dias Gomes (1922-1999) foi exibida em 12 capítulos entre 5 e 22 de setembro de 1995.

Para viver o pastor Mariel, um rapaz pobre que fica milionário após fundar o Templo da Divina Chama, Edson Celulari passou meses visitando templos evangélicos e assistindo aos programas religiosos que inundam as madrugadas da televisão desde aquela época.

Dizendo-se escolhido por Deus, Mariel forma seu rebanho e adquire estações de rádio e televisão no Brasil e no exterior, além de contratar PJ Tavares (Luiz Fernando Guimarães), uma espécie de PC Farias (1945-1996), para atuar como lobista junto aos deputados em Brasília.

"Os pastores que têm boas intenções não podem se incomodar com este personagem. Ele só vai servir de carapuça para os que agem de má-fé", declarou o ator ao jornal O Globo de 9 de julho de 1995.

O lançamento da minissérie foi o estopim para retornar a guerra entre Globo e Record. Em agosto daquele ano, o Fantástico mostrou reportagens críticas sobre a coleta de dinheiro e o exorcismo que eram praticados em igrejas evangélicas pentecostais.

Ainda em 1995, o Jornal Nacional mostrou denúncia, com vídeos, sobre como Edir Macedo, líder da IURD e dono da Record, ensinava seus pastores a convencerem os fiéis a darem ofertas e dízimos nos cultos.

O troco veio logo em seguida. Em 4 de setembro de 1995, um dia antes da estreia da produção global, o programa de debates 25ª Hora teve como tema a discussão do papel das Organizações Globo (atual Grupo Globo) na sociedade brasileira.

Além disso, a Folha Universal, jornal da IURD, passou a atacar a emissora concorrente em suas manchetes. "Desmoralização e arbitrariedade no Jornalismo da Globo", "Desespero: a 'fantástica' Globo está em decadência" e "Globo admite: Universal é a igreja que mais cresce" foram alguns dos destaques.

Pouco depois, em 12 de outubro, ocorreu o famoso caso do chute do pastor Sérgio Von Helder em uma imagem de Nossa Senhora Aparecida no programa O Despertar da Fé, também da Record. O acontecimento teve grande repercussão em todo o Brasil.

Sátira de Edir Macedo

Reportagem da Veja de 6 de setembro de 1995 destacou que Mariel era uma sátira de Edir Macedo: "Há diversas semelhanças entre o pastor fictício Mariel Batista e o bispo da Universal. Ambos usam cabelo gomalinado, possuem emissoras de rádio e se tomam milionários. Nos cultos mostrados em Decadência, como nos da Universal, há sessões de exorcismo e se fala de Satanás com bastante intimidade".

"Assim como já aconteceu com o real Edir Macedo, o fictício Mariel também enfrenta um momento de sua vida em que é preso e acusado de charlatanismo e curandeirismo. O que certamente irá irritar os seguidores da Universal é que o personagem de Celulari é um charlatão da cabeça aos sapatos que usa a fé do povo para enriquecer", escreveram Marcelo Camacho e Edna Dantas.

"Pesquisei vários líderes evangélicos, não foi só o Edir Macedo. Se ele se sentir identificado com o Mariel, se vestir a carapuça, o problema é dele", provocou o autor Dias Gomes na mesma matéria.

"Não quero me inspirar neste ou naquele pastor, nem especificar uma determinada religião. Isso acontece tanto aqui como no Japão e, por isso, não será preciso escolher um só nome", assegurou o ator ao jornal O Globo de 3 de maio de 1995, já prevendo a confusão.

A Record, inclusive, chegou a pensar em produzir uma minissérie sobre uma história muito parecida com a de Roberto Marinho (1904-2003). O autor seria Romero da Costa Machado, ex-funcionário da Globo, que escreveu o livro "Afundação Roberto Marinho".

"Será a história de um jornalista medíocre que herda um jornal falido do pai, faz um pacto com a ditadura, funda uma emissora de TV e enriquece loucamente", disse Romero. Eduardo Lafon (1948-2000), então diretor de programação da Record, confirmou que a produção, que nunca saiu, estava nos planos da emissora.

Para abrandar o caso, a Globo tomou uma atitude. A Central Globo de Produção e a vice-presidência de Operações da emissora, comandada por José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, decidiram incluir na abertura da minissérie um texto que dizia ser "imprescindível renovar seu respeito a todas as religiões". Lida por Celulari, a mensagem enfatizava que Decadência não pretendia criticar nenhuma religião em particular, nem qualquer de seus representantes.


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