Menu
Pesquisar

Buscar

Facebook
X
Threads
BlueSky
Instagram
Youtube
TikTok

Análise

Coisa Mais Linda é vítima da ânsia devoradora de séries da Netflix

Divulgação/Netflix

Mel Lisboa em imagem de Coisa Mais Linda: drama é vítima do modelo da Netflix de disponibilizar séries - Divulgação/Netflix

Mel Lisboa em imagem de Coisa Mais Linda: drama é vítima do modelo da Netflix de disponibilizar séries

JOÃO DA PAZ

Publicado em 21/4/2019 - 6h18

O drama brasileiro Coisa Mais Linda é a prova mais recente de que séries da Netflix têm prazo de validade curto. Afinal, não faz nem um mês que a atração estreou e só se fala de outras coisas. É triste, porque a produção é rica de temas que mereciam um debate mais profundo, como violência doméstica, estupro no casamento e sexismo no trabalho.

Coisa Mais Linda chegou a ser tendência, mas por pouco tempo. Logo após a estreia, em 22 de março, a série foi devorada (por mídia e público) e virou assunto em todos os lugares, de grandes portais de notícias a almoços com parentes ou colegas do trabalho. A ânsia para não ficar fora da série do momento provocou uma maratona insana dos sete episódios, um consumo desenfreado que não resultou em uma digestão ideal para tudo o que foi apresentado na trama.

A mídia ressaltou as características principais de Coisa Mais Linda, principalmente o fato de ter quatro mulheres protagonistas que batem de frente com o machismo no Rio de Janeiro do fim dos anos 1950. O público que engoliu a série também a valorizou. Mas no meio disso tudo, questões cruciais se perderam.

Criada pela norte-americana Heather Roth e pelo brasileiro Giuliano Cedroni (Copa Hotel, Passionais), Coisa Mais Linda seria muito melhor aproveitada se os episódios fossem disponibilizados semanalmente, ao invés de liberados todos de uma vez.

Esse modelo de maratonar séries já foi criticado por ninguém menos do que Jenji Kohan, vencedora do Emmy e criadora de Orange Is The New Black, série símbolo da Netflix. Para a revista The Hollywod Reporter, em 2015, ela abriu o jogo: "Eu sinto falta de o público estar acompanhando a série ao mesmo tempo. Sinto falta de ficar online e discutir [o episódio da semana] no dia depois da exibição".

Em Coisa Mais Linda, Fernanda Vasconcellos gastou seu talento dramático na pele de Lígia


Sexismo no trabalho

Coisa Mais Linda é farta em tópicos que provocariam debates necessários. Depois do segundo episódio, as discussões na internet poderiam ser sobre sexismo no trabalho. Talvez uma hashtag pudesse ser criada, pela qual mulheres denunciariam situações nas quais foram vítimas de machismo. E postariam sobre momentos em que foram desvalorizadas no trabalho apenas por serem mulheres.

A violência doméstica exibida no quarto episódio de Coisa Mais Linda teria, nesse cenário hipotético, uma força de trazer à tona o quanto é real nos dias de hoje o temor pelo qual as mulheres passam dentro de relacionamentos abusivos. Mesmo tendo por base uma série que se passa há mais de meio século.

Outro tema de suma importância foi retratado no terceiro episódio e não merecia ser desperdiçado: o estupro dentro do casamento. Esse ato de violência ganharia destaque se atrizes e atores que participaram da série viessem a público e comentassem a cena. Os produtores e roteiristas poderiam explicar por que escolheram filmar tal agressão e qual mensagem queriam transmitir.

Um caso idêntico exibido na rival HBO mostrou o poder que uma série tem na sociedade. Na quinta temporada, em 2015, Game of Thrones exibiu uma de suas personagens mais queridas sendo estuprada pelo marido. A série e a cena foram notícia durante dias e extrapolaram o mundo do entretenimento.

Surgiram reportagens e artigos sobre o caso em editorias (como comportamento) que não falariam de Game of Thrones. O drama fantasioso da HBO colocou na roda um assunto tabu e permitiu que esclarecimentos sobre esse crime fossem debatidos publicamente. E ganhou divulgação.

Coisa Mais Linda tem material de sobra para desencadear conversas desse nível. Mas, infelizmente, parece que seu tempo já passou. Por isso, é bem-vinda qualquer oportunidade de resgatar a relevância da série.

O modelo da Netflix não vai mudar, e a produção da vez é o filme O Date Perfeito. Em maio chega Lucifer e depois vem Ela Quer Tudo, uma por cima da outra. Stranger Things reestreia em julho, junto com os novos episódios de La Casa de Papel... E assim segue o jogo. É uma pena que os debates se percam pelo caminho.

Mais lidas


Comentários

Política de comentários

Este espaço visa ampliar o debate sobre o assunto abordado na notícia, democrática e respeitosamente. Não são aceitos comentários anônimos nem que firam leis e princípios éticos e morais ou que promovam atividades ilícitas ou criminosas. Assim, comentários caluniosos, difamatórios, preconceituosos, ofensivos, agressivos, que usam palavras de baixo calão, incitam a violência, exprimam discurso de ódio ou contenham links são sumariamente deletados.