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Apesar de texto fraco, O Escolhido prende público com mistério e paisagens

Fotos: Emiliano Capozoli/Netflix

Gutto Szuster, Paloma Bernardi e Pedro Caetano na primeira temporada de O Escolhido, da Netflix - Fotos: Emiliano Capozoli/Netflix

Gutto Szuster, Paloma Bernardi e Pedro Caetano na primeira temporada de O Escolhido, da Netflix

LUCIANO GUARALDO

Publicado em 28/6/2019 - 5h27

Depois de explorar futuro distópico em 3%, comédia familiar em Samantha! e drama de época em Coisa Mais Linda, a Netflix estreia nesta sexta-feira (28) sua primeira incursão pelo suspense sobrenatural no Brasil. O Escolhido chama a atenção por colocar na tela paisagens pouco exploradas pela TV, mas perde pontos com diálogos muito fracos.

Os roteiristas da atração são Raphael Draccon e Carolina Munhóz, celebrados autores de livros do gênero suspense. Os méritos do casal na literatura são inquestionáveis --somados, eles já venderam mais de 800 mil cópias em um mercado que sofre para criar novos leitores. Mas o que funciona no papel nem sempre consegue boa tradução na TV, e O Escolhido escancara essa falha.

Personagens soltam frases de efeito a torto e a direito, alguns falam apenas em tom enigmático com o claro intuito de enrolar o público sobre os mistérios da história, e outros adotam um linguajar formal demais para o local em que a trama se passa. Há ainda uma tentativa (falha) de abordar racismo e machismo, mas os temas são abandonados com a mesma velocidade com que foram inseridos minutos antes.

Os diálogos literários demais prejudicam o desenrolar da história, mas não chegam a ofuscar por completo os méritos de O Escolhido, que tem uma sinopse interessante e uma trama envolvente --baseada na série mexicana Niño Santo (2011).

A história gira em torno de três médicos que estão viajando pelo Pantanal com a missão de vacinar toda a população local contra uma mutação do zika vírus. Mas Lucia (Paloma Bernardi), Enzo (Gutto Szuster) e Damião (Pedro Caetano) se deparam com algo muito maior ao chegarem a Aguazul, vilarejo onde ninguém adoece e todos obedecem a um líder místico, chamado apenas de Escolhido (Renan Tenca).

Renan Tenca, com experiência no teatro paulistano, interpreta o misterioso personagem-título


Índios e cérebro de jacaré

Os mistérios da série prendem o público, que fica curioso para tentar descobrir exatamente o que está acontecendo na pequena cidade. A cada resposta, surgem novas perguntas, em uma trama que embola fé, ciência, índios, mortes, sacrifícios e até cérebros de jacaré.

Não espere soluções rápidas: nos quatro primeiros episódios (de um total de seis) que a Netflix disponibilizou à imprensa, O Escolhido planta mais dúvidas do que as soluciona. As poucas respostas dadas nem sempre fazem sentido, mas os roteiristas buscam apoio na mística religiosa para justificarem suas decisões.

O elenco, repleto de rostos desconhecidos, se esforça para fazer o melhor que pode. Destaque para Gutto Szuster, que esbanja sarcasmo como o médico gaúcho Enzo, e Francisco Gaspar (o divertido barqueiro Silvino), além de Mariano Martins e da veterana Tuna Dwek, que vivem respectivamente Mateus e Zulmira, dois moradores que respeitam as tradições de Aguazul mas veem sua realidade mudar por completo com a chegada dos médicos à vila.

A direção de Michel Tikhomiroff (de O Negócio) é competente e consegue aliar o clima de mistério que paira no ar às belas paisagens do Tocantins, praticamente inexploradas pelo audiovisual brasileiro --a série foi rodada na minúscula Natividade, cidade de apenas 9.200 habitantes, que faz as vezes de Aguazul.

O Escolhido é uma produção que merece ser vista, nem que seja para valorizar a produção nacional. Apenas não espere um roteiro inspirado, sutil ou repleto de subtexto. É entretenimento popular, um novelão no streaming --como se Walcyr Carrasco, de A Dona do Pedaço, escrevesse um suspense na Netflix.

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