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Análise | Teledramaturgia

Liberdade troca sexo por violência e choca público com atrocidades

Felipe Monteiro/Gshow

Mateus Solano e Andreia Horta em cena de Liberdade, Liberdade a ser exibida nesta quinta (4) - Felipe Monteiro/Gshow

Mateus Solano e Andreia Horta em cena de Liberdade, Liberdade a ser exibida nesta quinta (4)

RAPHAEL SCIRE

Publicado em 4/8/2016 - 6h18

Menos ousada do que outras produções que já ocuparam a faixa das 23h na Globo, Liberdade, Liberdade chega ao fim hoje (4) marcada por uma trama que, embora com bons índices de audiência, demorou para engrenar. Porém, se faltaram ousadia e tensão sexual na narrativa, sobraram sangue e carnificina. A novela priorizou a violência, se não para chamar a atenção, ao menos para chocar o público com as atrocidades de uma época pouco retratada na teledramaturgia.

O início do século 19, quando a história de Liberdade, Liberdade acontece, sempre foi mostrado por uma ótica mais cômica ou colorida, a exemplo da minissérie O Quinto dos Infernos (2002), de Carlos Lombardi, ou então de Escrava Mãe, no ar na Record. A novela das onze da Globo optou por apresentar uma concepção estética mais realista, assimilando a falta de assepsia na caracterização a uma fotografia mais suja.

É possível traçar um paralelo entre essa tônica sombria e pesada e as atrocidades que foram amplamente divulgadas ao longo dos meses em que a novela esteve no ar. Cenas de torturas, enforcamentos, personagens sendo cegados ou até mesmo castrados, tudo isso foi mostrado sem a menor sutileza, o que pode explicar em partes a falta de burburinho em torno da história.

O público, a princípio, não embarcou na ficção, mas é bem verdade também que a história de Liberdade, Liberdade demorou a acontecer. Muito preocupada no início em situar o telespectador historicamente, a narrativa da trama só foi mesmo deslanchar a partir do momento em que a função folhetinesca da história ganhou mais força.

Personagens receberam contornos mais delineados, como a protagonista Joaquina (Andreia Horta), e histórias paralelas passaram a ter forma. O melhor exemplo foi o desdobramento da trama de Bertoleza (Sheron Menezzes), seu sequestro e posterior salvação até culminar na vingança da personagem, quando mandou cegar seu algoz Gaspar (Romulo Estrela).

felipe monteiro/gshow

Os atores Ricardo Pereira e Caio Blat em cena de enforcamento de Liberdade, Liberdade

Faltou também mais humor, embora a vilã de Nathalia Dill (Branca) tenha sido responsável por momentos de riso involuntário com suas tiradas absurdamente preconceituosas. Mão de Luva, um bandido impiedoso inicialmente, também sofreu alterações e ganhou mais leveza. O bandoleiro, aliás, teve em Marco Ricca um intérprete que soube trabalhar muito bem essas nuances de personalidade. O sucesso do personagem pode ser comprovado na sua sobrevida na internet, com o spin off para o GloboPlay intitulado A Lenda de Mão de Luva.

Outra personagem que teve alterações de percurso foi Dionísia (Maitê Proença). De início, parecia ser uma voraz devoradora de escravos, mas aos poucos ganhou uma abordagem psicológica mais atormentada, e a tensão sexual de antes cedeu espaço à violência. Dionísia feriu o ex-marido Terenciano (Jackson Antunes), achou que o havia matado, e terminou por emparedá-lo vivo.

Por fim, Rubião (Mateus Solano) mostrou-se um dos vilões mais violentos da teledramaturgia. Em termos dramatúrgicos, Rubião deixou outro personagem de Solano no chinelo: perto dele, Félix de Amor à Vida (2014), foi um santo. Solano manteve o tom de interpretação do início ao fim e dominou a novela, em uma ótima parceria cênica com Andreia Horta.

Liberdade, Liberdade conseguiu reverter a monotonia e o didatismo iniciais e termina com uma trama central ágil e eletrizante, ainda que à custa de um excesso de violência, que, no fim das contas, combinou com a crueza estética retratada no vídeo.


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