Memória da TV
Divulgação/Globo
As atrizes Marília Pêra e Celia Biar em cena de Brega & Chique (1987); personagem de Marília era preconceituosa
THELL DE CASTRO
Publicado em 12/1/2020 - 6h00
O canal Viva anunciou que vai exibir a partir de 19 de fevereiro a novela Brega & Chique, de Cassiano Gabus Mendes (1929-1993), produzida originalmente pela Rede Globo em 1987. A trama das sete fez muito sucesso, mas também teve polêmicas intensas, que envolveram o modelo que apareceu pelado na abertura, piadas com a comunidade japonesa e com moradores de um bairro nobre da capital paulista.
O primeiro contratempo surgiu logo no capítulo de estreia, no dia 20 de abril de 1987. A abertura da novela, que tinha a música Pelado, do grupo Ultraje a Rigor, mostrava o modelo Vinícius Manne com o bumbum à mostra por alguns segundos.
Indignados, muitos telespectadores ligaram para a Globo reclamando do fato. Até o então ministro da Justiça, Paulo Brossard (1924-2005), entrou no meio da confusão, ameaçando censurar a vinheta.
O tema tomou conta das discussões por todo o Brasil e, no segundo capítulo, a Globo decidiu colocar uma folha de parreira para cobrir a nudez do rapaz. A medida durou apenas dois dias, pois outros telespectadores reclamaram da censura. Brossard desistiu, e a pressão popular fez a emissora liberar a imagem, que prosseguiu até o final da novela e estampou a capa do disco internacional da novela.
Outro imbroglio começou quando a ricaça Rafaela Alvaray (Marília Pêra [1943-2015]), uma das protagonistas da trama, empobreceu e deixou o Jardim Europa, na capital paulista. Ela citava com desprezo o Itaim Bibi, fazendo piada com o "Bibi". Moradores da região protestaram, e o autor escreveu uma cena para a personagem se redimir, afirmando que havia se confundido, pois o bairro "era muito chique".
Alguns meses depois, em junho de 1987, o Jornal do Brasil destacou que as secretárias executivas do Rio de Janeiro não gostaram de um comentário feito pelo personagem Teddy (Tarcísio Filho), que disse que "secretária de chefe é assunto particular". Elas também consideraram inadequados os trajes e a maneira de agir de Silvana, vivida por Cássia Kiss, e estavam preparando uma carta de protesto para enviar à Globo.
Já em julho, era a comunidade japonesa que estava revoltada com a trama. O jornal Diário Nippak estampou a seguinte manchete: "Novela da Globo deprecia o japonês". O motivo da discórdia era novamente Rafaela, que prometeu "casar com o primeiro que aparecer, qualquer um, leiteiro, lixeiro, faxineiro, tintureiro, nem que seja japonês".
De acordo com reportagem do Jornal do Brasil de 10 de julho daquele ano, diversas entidades, como a Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e a Associação dos Lojistas da Liberdade, reuniram-se para decidir medidas a serem encaminhadas à Globo.
Manoel Carlos, que atuava no departamento de divulgação da emissora, confirmou ao jornal que a fala estava no texto original, não se tratando de um improviso da atriz. "Manoel disse que o autor não tinha pensado nessa conotação, depreciativa, podendo até tentar corrigir essa impressão nos capítulos próximos", enfatizou.
"Mas a colônia não está tomando providências só por causa do preconceito de raças, mas defendendo as profissões também. Por que depreciar o leiteiro, o lixeiro e o faxineiro", questionou William Kimura, editor do jornal.
Cassiano Gabus Mendes não deu muita trela para o protesto. "É mais uma dessas coisas que nem me preocupam mais. O público se preocupa com muita besteira. A colocação não é preconceituosa nem depreciativa. É só comicidade, pois a personagem da Marília só fala besteira", concluiu o autor.
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