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COLUNA DE MÍDIA

Arrogante, Netflix vira piada entre concorrentes ao copiar estratégias

DIVULGAÇÃO/NETFLIX

Elenco da série Stranger Things em cena de tensão, ator mirim com expressão de susto no meio, outros dois ao lado dele dando risada

Stranger Things é uma das poucas franquias de sucesso da Netflix, que está perdendo assinantes

GUILHERME RAVACHE

ravache@proton.me

Publicado em 11/5/2022 - 11h41

O jornal The New York Times revelou na segunda-feira que a Netflix irá acelerar os planos de lançar publicidade em sua plataforma. A ideia é que, com um plano mais barato, a empresa consiga reverter a crise que se intensificou nos últimos meses com a fuga de assinantes.

Apesar das dezenas de lançamentos semanais, quem acessa a plataforma parece ter cada vez menos opções relevantes de entretenimento. Prova disso é que a empresa espera perder mais de 2 milhões de assinantes entre abril e junho deste ano. Entre as reclamações mais comuns sobre a Netflix nas redes sociais estão o alto preço da assinatura e o conteúdo cada vez menos interessante.

Os investidores notaram. As ações da empresa despencaram. A Netflix, que em novembro do ano passado chegou a valer US$ 307 bilhões, na segunda-feira (9) valia menos de US$ 79 bilhões. Agora, a gigante do streaming vale um quarto do que valia há seis meses.

Mudança de discurso, de novo

Segundo um comunicado da Netflix para funcionários, ao qual o The New York Times teve acesso, o plano é que no último trimestre deste ano a empresa já tenha publicidade.

A notícia representa outra mudança. Primeiramente, a companhia surpreendeu a todos em abril deste ano ao anunciar que adotaria comerciais. 

Durante anos, a Netflix e seus executivos desprezaram propagandas na plataforma. Segundo Reed Hastings, fundador e co-CEO do serviço de streaming, o plano era começar com publicidade entre um e dois anos. Mas, como ficou claro com a notícia de que a publicidade começa ainda este ano, a segunda afirmação de Hastings veio por água abaixo ainda mais rápido. A mudança aponta para uma Netflix cada vez mais "apertada" por concorrentes e investidores.

Além de congelar contratações e pedir que seus funcionários fossem mais criteriosos com as despesas, a empresa estaria tentando cortar 25% dos valores das produções, inclusive reduzindo o número de capítulos nas temporadas. Apesar de comentários de produtores em relação a isso, Bela Bajaria, executiva da Netflix, negou esta informação e disse que as histórias sempre têm o tamanho que precisam. 

A Netflix também estaria avaliando aumentar os esforços para licenciar seu conteúdo original para emissoras e canais de TV e concorrentes, uma prática já adotada por outros streamings. 

Brasil deve ser um dos primeiros

Na América Latina, a necessidade de um plano mais barato é particularmente alta para a empresa. No primeiro trimestre deste ano, a Netflix perdeu mais 350 mil assinantes na região. A plataforma terminou 2021 com 39,96 milhões de clientes na América Latina, e, no final de março, o número caiu para 39,61 milhões, segundo o relatório de resultados divulgado pela própria empresa. O Brasil representa cerca de 50% do número de assinantes no continente.

Em abril, logo após o anúncio de que se estudava lançar publicidade na plataforma, a Netflix acelerou o processo para recrutar um executivo brasileiro do mercado de TV para liderar seus esforços comerciais no país. A ideia é que esse profissional monte uma equipe de vendas e traga anunciantes dispostos a exibirem suas campanhas no streaming.

O aumento do preço dos planos foi um fator relevante para os cancelamentos na Netflix. Com uma assinatura mais barata, mesmo que com publicidade, a ideia é atrair novos usuários e recuperar aqueles que cancelaram por acharem o valor alto

O Brasil deve ser um dos primeiros mercados a lançar este plano mais barato e suportado por publicidade. Se tudo correr conforme planejado, a mudança deve acontecer ainda em outubro ou início de novembro deste ano.

Arrogância e conteúdo inferior

Os preços mais altos da Netflix não são o único problema. Existe ainda o rápido crescimento dos concorrentes no streaming, com conteúdo cada vez mais atraente para os assinantes. As novidades vão de séries das franquias Marvel e Star Wars no Disney+ a grandes campeonatos de futebol no Amazon Prime Video e outras plataformas digitais. 

"A Netflix cresceu enquanto não tinha concorrentes", diz um executivo de TV. "Eles realmente acreditavam que eram mais inteligentes e criativos. O livro do Hastings (A Regra é Não Ter Regras, sobre a cultura da Netflix) ajudou a aumentar essa ficção. Quando a concorrência chegou no streaming, seguiram acomodados e achando que nada os afetaria".

Para o executivo, "a crise que vemos hoje começou à medida que a Netflix, em vez de inovar, fazia piada dos concorrentes e não os levava a sério. Hoje, eles viraram a piada, já que as empresas tradicionais parecem melhor estruturadas e se acostumaram a cortar custos nos últimos anos".

A profecia se realizou, e a Netflix é a nova TV, inclusive com os mesmos problemas: queda de audiência, aumento de custos de produção e redução de receita.

Quando se fala da Netflix, uma palavra aparece com frequência nos comentários de produtores, diretores, artistas e executivos de empresas concorrentes: arrogância.

"Eles se achavam melhores do que todos", diz um roteirista. "Fico preocupado com o impacto que a crise da Netflix terá nas produções e suas equipes, mas não vou negar o prazer que tenho de vê-los ferrados". 

"O processo na Netflix era caótico", afirma um produtor. "Eles são super simpáticos, mas tudo é decidido fora e não ouvem ninguém. Gastam horrores de maneira sem sentido. Eu mandava um script e, para cada cinco linhas que eu escrevia, vinham 50 linhas de comentários e sugestões. Era aquela sensação de muita gente querendo mostrar serviço e sempre tendo de dizer algo". 

Segundo este produtor, após meses trabalhando em um roteiro de uma produção que já tinha até diretor e artistas contratados, a Netflix cancelou a atração sem dar maiores explicações. "Pagaram tudo certinho, inclusive as multas dos contratos. Foi uma fortuna jogada fora, mas a falta de transparência deixou a frustração ainda maior", disse ele.

Antes de melhorar, vai piorar

A notícia de um plano mais barato, mesmo que com publicidade, é boa. Pesquisas apontam que a maior parte dos usuários de streaming não se importa em assistir a publicidade se puder pagar menos (ou nada). Mas também tem notícia ruim vindo da Netflix.

No mesmo dia em que afirmou estudar a criação do plano mais barato com publicidade, a Netflix adiantou que vai intensificar o combate ao compartilhamento de senhas. A ideia é cobrar cerca de R$ 15 a mais de quem compartilha uma senha se não mora no mesmo endereço da pessoa que também usa o serviço.

A novidade está sendo testada no Chile, na Costa Rica e no Peru e já tem causado bastante controvérsia, inclusive com protestos nas redes sociais.

Mas a lógica é simples: ao combater o compartilhamento de senhas, a Netflix deverá levar mais assinantes para seu plano com publicidade. A gigante tem 222 milhões de assinantes no mundo, mas, segundo a própria plataforma, outros 100 milhões de lares assistem ao conteúdo usando senhas compartilhadas.

Nem tudo está perdido

A Netflix já saiu de outras crises ao longo de sua história. O momento é ruim, mas está longe de ser o fim da companhia, que segue faturando bilhões de dólares e passou a dar lucro no ano passado.

A empresa também aposta em oferecer games na plataforma, além de investir em experiências no mundo real, ao estilo da Disney com seus parques e shows na Broadway.

Os fãs das séries Bridgerton e Stranger Things podem participar de experiências imersivas em algumas cidades nos Estados Unidos e em países da Europa, onde as atrações estão disponíveis. Telespectadores de Bridgerton podem interagir com atores vestidos com as roupas de época da série. Já os seguidores de Stranger Things podem entrar em um parque multimídia semelhante ao GExperience, parque temático da Globo.

Fica cada vez mais claro que as novidades que tornaram a Netflix líder do streaming já foram copiadas e aprimoradas. Concorrentes como Globoplay, HBO Max e Paramount+ lançaram publicidade em suas plataformas muito antes da Netflix. Para seguir no topo, a líder do streaming terá de ir além de copiar. Ela precisa voltar a inovar e, principalmente, produzir conteúdo de qualidade consistentemente, para ser ainda melhor que o dos concorrentes.


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