COLUNA DE MÍDIA
Reprodução/CNN
Jeff Zucker, chefão da CNN no mundo, deixa a rede de notícias após revelar romance no trabalho
O mundo jornalístico foi pego de surpresa na quarta-feira (2) com o anúncio da saída de Jeff Zucker da presidência da CNN Worldwide. O executivo liderou o canal de notícias nos últimos nove anos e foi forçado a deixar o cargo. Ele afirmou ter renunciado, mas teria sido demitido se não o fizesse.
Segundo a WarnerMedia, controladora da CNN, a razão para a saída de Zucker é que ele não divulgou um relacionamento romântico com a colega de trabalho, Allison Gollust, vice-presidente executiva da rede e diretora de Marketing. Não tornar o relacionamento público é uma violação dos Padrões de Conduta Empresarial da empresa.
Allison ainda segue na CNN, mas deve deixar a posição em breve. A avaliação é que não existe clima para que ela siga no cargo. Tanto Zucker quanto Allison são divorciados. O agora ex-chefão do canal também deixará o cargo de presidente de notícias e esportes da WarnerMedia.
O problema é que o affair no escritório de Zucker e Allison tem sido um segredo aberto há anos. Então, qual a verdadeira razão para que ele esteja deixando a empresa agora?
Zucker é uma lenda na imprensa mundial, na linha ame ou odeie. Ele saiu em desgraça da NBCUniversal e passou por uma tentativa de demissão na CNN, mas conseguiu se segurar no cargo. Ainda teve problemas de saúde, como duas crises de câncer de cólon e uma cirurgia cardíaca, e até bateu de frente com Donald Trump. O ex-presidente norte-americano divulgou um comunicado no mesmo dia do anúncio da saída de Zucker comemorando a notícia da queda do rival.
Mas os dois já tiveram uma relação diferente. Foi o executivo que reabilitou a carreira do político em 2004 permitindo que ele fizesse o reality O Aprendiz. Zucker também teve um áudio vazado em 2016 no qual dava conselhos para um membro da equipe do candidato sobre o que ele deveria falar em um debate. A relação azedou à medida que Trump subia nas pesquisas divulgando fake news e depois entrou na Casa Branca atacando a CNN.
O relacionamento de Zucker e Allison é uma história antiga e até certo ponto conhecida nos círculos jornalísticos, como afirma Shawn McCreesh, na NYMag:
"Para começar, o relacionamento de Zucker e Allison foi um dos maiores segredos abertos na mídia. Os funcionários da CNN navegavam desajeitadamente pela dupla, já que toda vez que lidavam com ela, estavam cientes de que ela estava envolvida com o chefe. Eles estavam revirando os olhos com a declaração da própria Gollust que dizia 'recentemente, nosso relacionamento mudou durante a Covid'."
"Já estava acontecendo há muito mais tempo: o Page Six insinuava sobre eles de vez em quando, e os dois se conhecem desde que trabalharam juntos na NBC décadas atrás. Como Katie Couric escreveu em seu livro de memórias: 'Eu tive que me perguntar por que Jeff estava tentando tanto trazer Allison a bordo' no talk show de Couric, Katie. 'Ela, o marido e os filhos se mudaram para o apartamento logo acima do de Jeff e Caryn --todos que ouviram sobre o acordo acharam super estranho."
Para muitos, a verdadeira razão da saída de Zucker seria uma vingança pessoal.
A WarnerMedia, dona da CNN, está concluindo a fusão com a Discovery, um negócio de US$ 43 bilhões e que criará um dos maiores grupos de mídia do mundo. O comando da operação ficará com a Discovery.
David Zaslav, CEO da Discovery, assumirá o controle da nova companhia que se chamará Warner Bros. Discovery. O executivo é amigo pessoal de longa data de Zucker, e os dois trabalharam juntos no início de suas carreiras. O agora ex-CNN foi um dos principais articuladores da fusão das duas companhias, aproximando a Discovery da direção da AT&T, dona da WarnerMedia.
Assim, a saída se torna um complicador para Zaslav, que herdará uma CNN sem duas de suas principais lideranças e atormentada por escândalos.
Por trás da saída de Zucker está o processo iniciado por Chris Cuomo, ex-âncora da CNN, que o executivo demitiu em dezembro depois que veio à tona que o apresentador dava consultoria de mídia, de maneira inadequada e sem seguir às políticas da CNN, ao irmão Andrew Cuomo, ex-governador de Nova York, envolvido em escândalos de assédio sexual.
O jornalista foi demitido por justa causa, sem indenização e nunca aceitou o fato. Ele se sentiu traído por Zucker, de quem era próximo (Allison inclusive trabalhou como chefe de Comunicação de Andrew Cuomo antes de se mudar para a CNN). Pouco depois de sair da CNN, Chris teria entrado em contato com ex-amigos da rede e chamou a atenção para um relacionamento entre os executivos.
Antes de Zucker demitir Chris Cuomo, a CNN contratou o escritório de advocacia Cravath para investigar o caso dentro da empresa. A prática é comum, principalmente em casos que podem gerar repercussão e envolvem milhões como o de Cuomo --a ideia é não ser pego de surpresa nos tribunais.
A investigação interna ainda está em andamento, e o ex-âncora trava uma batalha judicial com o canal para receber os milhões que restaram do seu contrato. No processo de investigação, vários funcionários foram questionados pelos advogados de Cravath, e Zucker deu seu depoimento na semana passada.
Quando o então chefão reconheceu o relacionamento com Allison, sua "violação" foi posteriormente levada a Jason Kilar, CEO da WarnerMedia.
Mas, se a relação era consensual, conhecida por muitos e a CNN está sendo vendida, por que a WarnerMedia forçou a saída de Zucker agora?
Jason Kilar e Zucker se odeiam. O executivo ficou furioso pelo CEO ter mexido no organograma da CNN para que Allison e outros funcionários da direção da empresa se reportassem diretamente à WarnerMedia. Para Zucker, foi um ataque a sua autoridade e uma humilhação pública.
Antes do anúncio da fusão da WarnerMedia com a Discovery, a saída de Zucker do comando da CNN era dada como certa. Mas, ao promover a fusão com a Discovery, o chefão deu um golpe de mestre e mudou sua sorte. Jason Kilar não apenas perdeu poder, mas deixará o cargo de CEO quando a fusão for concluída nos próximos meses, e Zaslav, amigo de Zucker, assumir o comando.
Para muitos, Kilar forçou a saída de Zucker como uma vingança final. A WarnerMedia tem apresentado bons resultados nos últimos meses, e muitas das ideias de Kilar, apesar de polêmicas, foram bem-sucedidas neste processo. Ex-funcionário da Amazon e com histórico no Vale do Silício, ele é notório pela maneira pouco polida, mais efetiva, com que resolve os problemas.
Segundo Dylan Byers, do Puck, quando Kilar foi informado pelos advogados da Cravath do affair de Zucker com Allison, ele levou o caso "ao conhecimento de John Stankey", o CEO da AT&T, dona da WarnerMedia e CNN.
"Não importa o que ele pensasse de Zucker ou Kilar, Stankey certamente não tinha apetite para tolerar qualquer escândalo que pudesse atrapalhar o iminente acordo WarnerMedia-Discovery". Ou seja, Kilar teria "forçado" a saída da rival com a informação da investigação.
Kilar encontrou com jornalistas da CNN no mesmo dia do anúncio da saída de Zucker. O CEO disse que "os fatos são os fatos" e se recusou repetidamente a "entrar em detalhes" sobre certas questões.
Quando um repórter questionou se ele havia consultado outros executivos durante o processo, Kilar disse que não responderia. Segundo a newsletter Reliable Sources, da própria CNN, o executivo citou repetidamente "valores e princípios" da empresa em suas respostas e disse: "Sinto-me confortável em minha decisão". Os funcionários não pareciam persuadidos.
A operação da CNN Brasil é uma licença e, neste momento, a saída de Zucker deve ter pouco impacto por aqui. Mas o executivo via com bons olhos a operação brasileira. Porém, a chegada de Zaslav e da Discovery pode colocar em xeque o atual modelo.
É difícil determinar o peso que a Discovery dará à CNN. Sem Zucker, uma peça central na fusão da WarnerMedia e Discovery e figura chave no Jornalismo, a CNN perde, inclusive no Brasil.
Para piorar, um dos grandes projetos da rede global é o lançamento do CNN+, um streaming de notícias no qual a empresa investe bilhões e tem produzido bastante conteúdo original. A empresa não divulgou como o streaming funcionará fora dos Estados Unidos, mas, em tese, pode se tornar um concorrente da CNN brasileira. Além disso, a CNN Brasil vê um crescente aumento de concorrentes na TV.
Por hora, a aposta de muitos é que as mudanças no comando da CNN terão grande impacto no Jornalismo global. E mais revelações do caso devem vir à tona. Enquanto isso, Zucker, os irmãos Cuomo e Trump estão sem emprego. Kilar e Allison serão os próximos.
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