COMÉDIA NACIONAL
Divulgação/Paris Filmes
Felipe Abib e Daniel Rocha em Quem Quer Ficar com Mário?; filme já está em cartaz nos cinemas
Protagonistas de Quem Quer Ficar com Mário? (2021), Daniel Rocha e Felipe Abib temem uma repercussão negativa com o público LGBTQ+ por causa de seus trabalhos no longa. Heterossexual, a dupla interpreta um casal gay na comédia romântica e acredita que alguns podem não receber muito bem suas escalações.
Em uma época na qual o debate sobre a representação de minorias em obras audiovisuais está em alta, a escolha por dois atores héteros para interpretarem homossexuais pode soar estranha --e até ofensiva-- para algumas pessoas. Por conta disso, os atores confessaram ter receio da opinião do público.
"Neste filme, neste momento, talvez tenham mais dúvidas ou críticas sobre nós, igual já questionam outras pessoas [cis] interpretando homens transexuais", admitiu Abib em entrevista exclusiva ao Notícias da TV.
Apesar de compreender uma possível não aceitação do público e de confessar também ter dúvidas sobre a sua escalação, o ator de 38 anos argumenta que, na sua profissão, situações como essa ainda são passíveis de acontecer. E cita a frase de uma das maiores atrizes da história do Brasil.
Como disse Fernanda Montenegro, 'ator não tem sexo'. É estranha [a escalação], eu tenho dúvidas. Quando pensamos também em um público careta, super-rígido com sua posição sexual e não aceitando outras orientações, assistindo a um ator heterossexual interpretando um homem gay, isso pode ajudar na busca por aceitação. Acho que essa situação também pode ser colocada [na discussão].
Para Abib, o fato de um homem heterossexual e branco ir assistir à dupla em Quem Quer Ficar com Mário? pode "quebrar algumas cascas" construídas pelo conservadorismo que impera na sociedade brasileira. Nessa visão, o humor da produção poderia ajudar a abrir um diálogo sobre bissexualidade com maior facilidade.
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O casal Mário e Fernando no filme
Par romântico do ator, Daniel Rocha disse concordar com a visão de Abib e revelou que, após a divulgação do primeiro trailer do filme, o número de pessoas que foram questioná-lo sobre a sua opção de aceitar o papel foi muito maior.
"Quando a gente aceita fazer um filme, são novos desafios e personagens diferentes. Eu quero dar voz a ele assim como Sean Penn, em Milk [2008], e Heath Ledger em O Segredo de Brokeback Mountain [2005]. Eu quero entrar para a história com essa performance", acrescentou.
Segundo Rocha, um dos motivos que o influenciou a aceitar atuar no longa foi a possibilidade de sentir, mesmo que na ficção, o preconceito pelo qual passam tantas pessoas. Ele ainda pontuou que deseja ver, no futuro, outras artes incluindo todos os tipos de pessoas.
"Meu sonho é ver uma mulher trans interpretando uma mulher cis. Tudo vai poder e será visto como normal. Mas é uma luta diária, e nós vamos conseguir nos próximos anos", concluiu.
Diretor responsável por Quem Quer Ficar com Mário?, Hsu Chien, que é homossexual assumido, justificou a escolha por Daniel Rocha e Felipe Abib pela vontade de trabalhar com a dupla e ressaltou que ambos poderiam aprender com a experiência.
Por que dois atores héteros? Eu sou gay, sou um diretor que faz parte da comunidade e já trabalhei em vários projetos com atores e temas LGBTQ+. Para mim, ator não tem sexo nem gênero. Às vezes, a escolha fica com o nosso ator. O personagem vai em busca de seu intérprete. Todos vieram de um amor que eu tenho pelo trabalho deles. Era mais interessante trabalhar com Daniel, Felipe, Rômulo [Arantes Neto] e estarem na pele de personagens que sofrem homofobia para aprender com isso. Por que o Brasil é o que mais mata homossexuais? As pessoas precisam entender isso.
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Elisa Pinheiro interpreta Bianca no longa
Mesmo que a homofobia seja um dos principais assuntos do longa, Quem Quer Ficar com Mário? não se resume a isso. Plural, o filme também aborda o machismo estrutural e a maneira como o conservadorismo afeta as mulheres da sociedade.
Intérprete de Bianca, a irmã mais velha dos personagens de Rocha e Arantes Neto, Elisa Pinheiro explicou que a grande "batalha" da produção não é apenas contra o preconceito, mas contra o patriarcado.
"Claro que a homofobia é o tema central do filme, mas por trás disso tudo existe o patriarcado e o machismo estrutural que provocam todas essas 'confusões' sociais pelas quais passamos, como a misoginia. No caso da Bianca, ela sofre de uma forma nada velada e realmente é massacrada. Toda a qualidade dela é esmagada por uma crença de que a mulher 'não pode'. Isso mostra como as coisas estão ligadas e setorizadas", explicou.
Na opinião de Elisa, o filme é cirúrgico ao mostrar que há machismo mesmo entre homens gays, fruto de uma sociedade patriarcal do Brasil. "Existem gays machistas e mulheres machistas. Acho que esse filme tem o mérito de abordar todos os temas que surgem desse patriarcado tão nocivo, que nós combatemos no dia a dia. É mais uma ferramenta de combate contra todo esse preconceito", finalizou.
Confira abaixo à entrevista completa com o elenco de Quem Quer Ficar com Mário?:
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