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BANDERSNATCH

Criadores de Black Mirror se recusaram a fazer filme vencedor do Emmy na Netflix

Stuart Hendry/Netflix

O ator Fionn Whitehead aparece desanimado em cena de Black Mirror: Bandersnatch, da Netflix

Fionn Whitehead em cena de Black Mirror: Bandersnatch, vencedor do Emmy de melhor telefilme

LUCIANO GUARALDO, no Rio de Janeiro

Publicado em 24/9/2019 - 5h24

Ganhador do Emmy de melhor telefilme deste ano, Bandersnatch quase não saiu do papel. É que os showrunners da série Black Mirror, Charlie Brooker e Annabel Jones, não queriam fazer um episódio interativo de sua criação. "Parecia um artifício gratuito demais, pensei: 'Não existe a menor possibilidade de fazermos isso. Não, não e não'", conta Annabel.

Até então, a Netflix só tinha feito programas interativos, em que o público pode escolher certas atitudes dos personagens, voltados para crianças. Bandersnatch marcaria a estreia do gênero para os telespectadores adultos. Mas, apesar de estarem certos de que não queriam isso, os produtores tiveram uma posição diferente ao se reunirem com executivos da plataforma de streaming.

"Quando nos chamaram, logo no começo, e perguntaram se queríamos fazer um episódio interativo, Charlie e eu apenas acenamos a cabeça educadamente e falamos: 'Que ideia ótima'. É a Netflix, você vai fazer o quê? Mas saímos da reunião dizendo que jamais faríamos uma coisa dessas", diz a produtora ao Notícias da TV.

A dupla só mudou de discurso quando Brooker bolou a ideia que acabou se transformando em Bandersnatch, sobre Stefan (Fionn Whitehead), programador que precisa adaptar um livro em que o leitor escolhe seu destino para um game.

"Nosso protagonista precisava estar ciente de que nós estamos dizendo a ele o que fazer, e isso nos permitiu pegar o elemento interativo e subvertê-lo. Era uma coisa quase pós-moderna, um filme interativo que sabe que é interativo. O espectador se sente cúmplice, e isso enfatiza a conexão emocional com Stefan. Assim, a história toda fica deliciosamente horrível", filosofa Annabel.

divulgação/rio2c

Os produtores Annabel Jones e Charlie Brooker durante palestra na Rio2C, em abril deste ano


'Pesadelo feliz'

Depois que deram o braço a torcer e aceitaram fazer Bandersnatch, Charlie Brooker e Annabel Jones sofreram para desenvolver a história. O produtor teve de estudar uma linguagem de programação de games, a Twine, para criar todas as ramificações de cada decisão que o público toma.

"Em alguns episódios de Black Mirror, como San Junipero, eu não tenho tudo tão metodicamente planejado com antecedência, vou improvisando conforme escrevo. Com Bandersnatch, que é tão complexo, não dava para fazer isso. Então foi uma experiência difícil, mas empolgante, extremamente libertadora e, ao mesmo tempo, confusa. Foi um pesadelo feliz", divaga Brooker, tão confuso quanto sua criação.

Tanta dificuldade se deve ao fato de que o método de escrever era oposto ao de um episódio tradicional. "Normalmente, em Black Mirror, nós tentamos simplificar a história, decidir tudo o que tem de ficar de fora. Com Bandersnatch, eu precisava criar mais e mais. E a cada peça que eu adicionava, era como se eu colocasse um cômodo novo em casa, que depois eu precisava mobiliar por completo", diz ele.

Foi por causa de toda essa complexidade que, apesar de teoricamente deixar o público tomar as próprias decisões, alguns destinos de Bandersnatch são pré-definidos. "Nós percebemos que, se você fica livre demais, e as escolhas se abrem muito, acaba construindo algo que não é coeso, com finais que parecem arbitrários e não revelam nada sobre o personagem ou seu mundo", explica Annabel.

"O nosso grande desafio foi elaborar algo em que as decisões dos telespectadores independem das escolhas do Stefan, para que ele seja um personagem coerente ao longo de toda a narrativa, não importa que caminho você toma", fala Brooker.

Tanta dedicação foi recompensada com mais um Emmy para a prateleira da dupla. Black Mirror já levou sete estatuetas do Oscar da TV: além da conquistada por Bandersnatch no domingo (22), o episódio USS Callister venceu quatro troféus no ano passado, e San Junipero ganhou outros dois na edição de 2017.

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