Diabo é sucesso de audiência na Record, mas bota medo na Globo em Renascer

O diabo não é tão feio quanto pintam na dramaturgia da Globo quando se trata das novelas da Record. O demônio é uma figurinha fácil nos folhetins bíblicos, desde as fracassadas como Apocalipse (2015) às bem-sucedidas como Gênesis (2021). Por lá, o coisa-ruim nunca espantou o público --pelo contrário, sempre foi o antagonista perfeito para os seus protagonistas.

A emissora de Edir Macedo nunca teve muitos dedos para falar sobre o diabo, mesmo com o público majoritariamente cristão de suas produções. O príncipe das trevas deitou e rolou --atrapalhando de Jesus (Dudu Azevedo) a Abraão (Zécarlos Machado)-- sem afastar qualquer telespectador.

A Globo, por outro lado, tem redobrado os cuidados com uma das principais tramas de Renascer. O cramulhão de José Inocêncio (Marcos Palmeira), que foi um dos protagonistas da primeira versão, virou praticamente um coadjuvante de luxo e que nunca dá as caras.

Pantanal (2022) foi muito mais direta ao abordar o pacto do violeiro Trindade (Gabriel Sater) com o belzebu, naquele que se tornou um dos pontos mais altos da história. Há dois anos, o demônio aparentemente não colocava medo no público do horário nobre.

Um dos principais problemas da abordagem de Renascer ao pacto mefistofélico é que Inocêncio é um personagem bastante dúbio. O fazendeiro não é exatamente um herói, mas também está longe de ser um vilão. Ele é a personificação de quem reza para Deus e o diabo ao mesmo tempo.

O principal ponto de rejeição ao produtor rural é justamente esse caráter duvidoso, que já não tinha sido bem recebido em 1993. Até aqui, o diabo está pagando por pecados que não são necessariamente dele.

O esforço para reduzir o "peso" do cramulhão nos telespectadores também não faz muito sentido quando se olha para as mudanças no perfil de Lívio (Breno da Matta). O pastor atinge uma parcela mais progressista dentro dos evangélicos --com uma visão menos maniqueísta do mundo e mais propícia a aceitar as incoerências de José Inocêncio narrativamente.

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