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Memória da TV

Em 1993, Aqui Agora exibiu suicídio de adolescente e chocou o Brasil

Reprodução

Ivo Morganti e Christina Rocha foram apresentadores do Aqui Agora, telejornal popular do SBT, em 1993 - Reprodução

Ivo Morganti e Christina Rocha foram apresentadores do Aqui Agora, telejornal popular do SBT, em 1993

THELL DE CASTRO

Publicado em 5/9/2014 - 11h38
Atualizado em 7/9/2014 - 7h15

RESUMO: Uma das maiores polêmicas dos jornalismo brasileiro na década de 1990 foi a exibição de um suicídio pelo Aqui Agora, do SBT. O programa mostrou uma adolescente de 16 anos se jogando de um prédio em São Paulo, chocando telespectadores e até mesmo jornalistas. O telejornal foi acusado de sensacionalismo e de estimular o suicídio, um tema tabu na imprensa

Um suicídio exibido em rede nacional. No dia 5 de julho de 1993, essa foi a principal reportagem do Aqui Agora, telejornal do SBT que fez muito sucesso no começo da década de 1990. Às 20h30 daquele dia, foram exibidas as cenas do suicídio de Daniele Alves Lopes, na épca com 16 anos.

A jovem pulou, por volta das 11h, do sétimo andar de um prédio no centro de São Paulo, em queda livre de 25 metros. Daniele, que era recepcionista, ficou durante 15 minutos sentada no beiral do prédio antes de se atirar. Socorrida por policiais, ela morreu a caminho do hospital.

O porteiro do prédio de onde Lopes se atirou chamou o Corpo de Bombeiros quando viu a atitude da garota. A equipe de reportagem do SBT, liderada pelo jornalista Sérgio Frias, chegou junto com os socorristas, já que estava na região central de São Paulo quando recebeu um chamado urgente do jornalismo da emissora. O SBT tinha jornalistas sintonizados na mesma frequência de rádio da polícia e dos bombeiros. Seus jornalistas chegaram ao prédio antes de a garota pular.

“Ela pulou, ai meu Deus”, disse Frias no momento da queda, que foi sucedida por um forte estrondo. As imagens foram gravadas pelo cinegrafista José Meraio.

No jornal Folha de S. Paulo de 6 de julho de 1993, uma reportagem detalhou o acontecido. Vânia Maria Duarte de Oliveira, 15 anos, amiga de Daniele, disse que a causa do suicídio foi um amor frustrado. A garota vivia havia três anos uma paixão não correspondida por um rapaz de 19 anos. Daniele não deixou nenhum bilhete de despedida.

Daniele Lopes teve seu suicídio exibido para todo o país no antigo programa Aqui Agora, do SBT

Audiência subiu 33,5%

A exibição do suicídio aumentou a audiência do Aqui Agora em 33,5%, de acordo com o Ibope. Os dez minutos de reportagem tiveram audiência média de 20 pontos na Grande São Paulo, correspondendo, na época, a 800 mil domicílios sintonizados. O telejornal ainda ia bem no Ibope e alcançava, geralmente, 15 pontos.

Evidentemente, a repercussão do caso foi muito negativa. Em entrevista à Folha, Maria Baccega, professora da Escola de Comunicações da USP, disse que a reportagem foi uma exploração da atração pelo mórbido: “O SBT misturou realidade com ficção. Não sabemos se a menina se suicidou porque queria morrer ou porque iria sair na televisão”.

Já o psicanalista Jurandir Freire Costa afirmou ter ficado horrorizado, e que o Aqui Agora trabalhava com dissimulação. “Eles se apresentam cheios de bons sentimentos, se horrorizam junto com o público, mas são abutres”, ressaltou.

O então diretor nacional de jornalismo do SBT, Marcos Wilson, também falou sobre o caso, alegando que se tratava de um flagrante da cidade: “Nós tivemos a preocupação de avisar o telespectador que as imagens eram fortes, pedimos para as crianças não assistirem e mostramos que o suicídio nunca é a saída. A saída é a vida”.

Alguns dias depois, na mesma Folha, Wilson disse que a exibição foi “uma decisão editorial”, mas reafirmou que não houve abuso. “Abuso teria sido reprisar as imagens em câmera lenta”, ponderou. Os pais de Daniele processaram o SBT, recebendo uma indenização milionária da emissora por danos morais.

As imagem do suicídio de Daniele Lopes chocaram o país e geraram discussão (Repodução)

Outros casos de suicídio na TV

Outros casos de suicídio mostrados na televisão já levantaram debates sobre os limites desse tipo de cobertura. São exemplos os incêndios dos edifícios Joelma, em 1974, em São Paulo, e Andorinha, em 1986, no Rio de Janeiro. O último é lembrado até hoje pela reportagem de Leila Cordeiro sobre o momento em que algumas pessoas se atiraram do prédio.

Um caso famoso no mundo todo foi o suicídio de Budd Dwyer, que era secretário do Tesouro do Estado da Pensilvânia, nos Estados Unidos, e foi acusado de receber suborno. Dwyer, que jurava inocência, se matou durante coletiva de imprensa em 22 de janeiro de 1987, com um tiro na boca.

Emissoras do mundo todo receberam as imagens na íntegra, mas abordaram o caso de diferentes formas. Nos Estados Unidos, nenhuma delas exibiu o vídeo por inteiro. No Brasil, por exemplo, a Globo mostrou o caso no Jornal Nacional, mas a imagem foi congelada quando Dwyer colocou o revólver na boca, sendo ouvido apenas o barulho do tiro.

À revista Veja de 14 de julho de 1993, o então diretor de jornalismo da Globo, Alberico de Souza Cruz, explicou: “Para informar aquele suicídio não precisamos chocar os telespectadores. Como regra geral, não sonegamos a notícia, mas evitamos cenas gratuitas”.


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