OPINIÃO
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Nadia (Mina El Hammani), Lu (Danna Paola) e Rebeka (Claudia Salas) em cena da terceira temporada de Elite
HENRIQUE HADDEFINIR
Publicado em 20/3/2020 - 5h10
A série Elite é um dos maiores hits da Netflix. Menos de 24 horas após o lançamento da terceira temporada, a produção já era a mais vista do catálogo, posição que mantém uma semana depois. A fórmula de mistério, sexo e vaivém de casais é certeira entre os jovens, o que explica o sucesso --mesmo que na sua concepção a série seja uma colcha de retalhos nada original. Em seu terceiro ano, mais do que nunca.
Desde sua chegada ao streaming, Elite foi construída em torno de um suspense. Era como se, na mesma série, houvesse pitadas de Riverdale, um pouco de The O.C. (2003-2007) e algumas doses cavalares de How To Get With Murder, a série produzida por Shonda Rhimes que sempre começa suas temporadas mostrando um crime acontecendo e sendo desvendado ao longo dos episódios.
A mistura é calculada para alcançar o público, pescando-o em todas as frentes. Mas, ao olhar para trás e lembrar que no começo havia a chance de explorar o choque social entre os alunos "pobres" que entravam na escola dos "ricos", percebe-se que não sobrou quase nada dessa premissa. A rotina escolar foi deixada de lado.
Se na primeira temporada a ideia era desvender quem matou Marina (María Pedraza), na segunda tudo foi uma questão de desmascarar o assassino. Então, para o terceiro ano, a produção assumiu novamente a posição do primeiro, e levantou mais suspeitas sobre quem teria eliminado outro personagem central.
Em torno desse novo mistério, as vidas dos protagonistas seguem em uma eterna dança das cadeiras emocional, com menos espaço para os dramas individuais. Omar (Omar Ayuso) passa os episódios vivendo as turbulências e traições do relacionamento com Ander (Arón Piper). Sua irmã Nadia (Mina El Hammani) não se entende com Guzmán (Miguel Bernardeau), Samuel (Itzan Escamilla) e Carla (Ester Expósito) muito menos. E há, como de praxe, o trisal do ano.
É por meio dessas trocas de parceiros que a série explora seu carro-chefe: o sexo. A terceira temporada é a mais sombria e sexualizada de todas, com poucas razões dramatúrgicas sensatas para muitos dos enlaces que surgem durante os episódios. E se Rebeka (Claudia Salas), Valerio (Jorge López) e Cayetana (Georgina Amorós) foram boas aquisições para a segunda temporada, o mesmo não se repete agora. Os personagens novos são totalmente superficiais.
Usados apenas como muletas para proporcionar essas trocas de pares, eles em nada contribuem para a costura da narrativa central. A mínima exceção é Malik (Sergio Momo), que chega como uma via de escape para Nadia tentar sair do controle dos pais, mas que acaba se revelando uma fraude. Ele ainda é uma ferramenta para provocar traições, mas encosta positivamente na trajetória da moça.
Há alguns investimentos enfadonhos em Carla, uma apatia em Guzmán, e os roteiros se esforçam bastante para tirar de Rebeka boa parte de seu carisma anterior. Entretanto, mesmo que seja a vítima da sexualização da temporada, Omar tem uma trajetória coerente. Isso sem falar numa estranha e deslocada aparição de Kevin McHale, o Artie da série Glee (2009-2015).
Lucrecia (Danna Paola), quem diria, é a personagem que melhor se desenvolve nessa terceira temporada. Além de não estar focada em relacionamentos, mas sim numa bolsa de estudos que pode salvá-la da opressão paterna, Lu acaba se aproximando de Nadia, e as duas protagonizam as melhores sequências da temporada.
O recurso do "quem matou?" foi estilizado para fugir do lugar folhetinesco em que poderia ser jogado facilmente. Mas essa estilização caiu direto na fonte de How To Get Away With Murder, com um bando de jovens se unindo para acobertar um assassinato e perpetuar as posições de privilégio onde a maioria deles está inserida. A estrutura plagia tanto a série de Shonda Rhimes que, em alguns momentos, parece que Viola Davis vai entrar em cena articulando mais um plano.
O planejamento em torno desse mistério também proporciona a tomada de decisões que são importantes para o futuro da atração. A Netflix já renovou Elite para mais duas levas de episódio, porém, a segunda e terceira temporadas se passam no último ano do colégio, e vários personagens precisam estruturar seus futuros.
Os criadores Carlos Montero e Dario Madrona poderiam ter cristalizado a fórmula e encontrado uma maneira de manter os personagens no mesmo lugar. Mas segundo as recentes declarações dos dois, Elite vai voltar na quarta temporada bem diferente e com muitos novos personagens, o que pode significar que algumas das despedidas que vimos serão definitivas.
Essa também será a chance da série se reinventar e tentar encontrar um lugar particular. A produção espanhola repete o sucesso de La Casa de Papel e Vis a Vis ao acessar todos os códigos estéticos e narrativos de produções norte-americanas, levando o público a um lugar confortável, em que tudo parece ajustado ao que já estamos condicionados a ver --apenas com um idioma diferente.
Seguindo esses moldes, Elite é uma série americana em solo espanhol, sem nenhuma identidade cultural, mas muito bem-sucedida. As três temporadas estão disponíveis no catálogo da Netflix.
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