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Análise | Estreia

Sete Vidas merece horário nobre, mas erra ao criar casal em protesto

João Miguel Júnior/TV Globo

Isabelle Drummond e Jayme Matarazzo vivem casal em manifestação na novela Sete Vidas, da Globo - João Miguel Júnior/TV Globo

Isabelle Drummond e Jayme Matarazzo vivem casal em manifestação na novela Sete Vidas, da Globo

RAPHAEL SCIRE

Publicado em 9/3/2015 - 19h33

Ao fim do primeiro capítulo de Sete Vidas, a nova novela das seis da Globo, a sensação que fica é a de que houve um erro de programação na emissora. Pela qualidade das imagens e o alto nível dos diálogos da trama, o folhetim certamente se adaptaria à grade do horário mais nobre da emissora, às 21h.

Sete Vidas tem como mote a busca de laços sanguíneos desconhecidos de Miguel (Domingos Montagner), um doador de sêmen que tem filhos espalhados pelo mundo. Incapaz de se manter ligado afetivamente com alguém, Miguel rompe a relação que mantinha com Lígia (Debora Bloch), e parte em uma expedição para a Antártida. Desolada, a única coisa que resta a ela é se descobrir grávida.

Na outra ponta, está a busca dos filhos desse doador pelo pai, cuja identidade é conhecida apenas por um número, 251. Logo, a notícia chegará a Lígia, que acredita que manter contato com eles pode ser uma maneira de se manter ligada a Miguel.

Obviamente, nesse enredo haverá espaço para o amor proibido entre supostos irmãos, Julia (Isabelle Drummond) e Pedro (Jayme Matarazzo). O noveleiro mais atento, porém, já sacou que os dois não são irmãos e o possível incesto serve apenas como conflito dramatúrgico para separá-los.

Ainda na onda dos clichês folhetinescos, em sua viagem pelo sul do continente, Miguel sofrerá um acidente e perderá a memória, o que causará o sofrimento dos que estão à sua volta, em especial de Lígia. Defendida por Debora Bloch (impressionante por sua atuação densa), a personagem foge dos tipos cômicos que marcaram a carreira da atriz.

Salta aos olhos a marcação do distanciamento de Miguel com o mundo, solidão pontuada tanto no roteiro quanto na interpretação de Montagner. São características dos personagens como essa e situações cotidianas da vida que servem de impeditivo de uma história que, até então, não apresentou nenhum vilão maniqueísta, o que configura um ponto bastante positivo.

Prevista para ter 107 capítulos, a novela mais enxuta é uma fórmula que comercialmente pode não ser a ideal, mas que funciona para que as histórias fluam de maneira natural. Mais do que realista, Sete Vidas é uma trama naturalista, um espelho do dia a dia, característica que se estende à maneira de interpretar dos atores e passa até pelo figurino, limpo, sem extravagâncias.

Com ela, a autora Lícia Manzo reforça a sua capacidade de focar em temas familiares, sobretudo nas relações humanas, característica que já havia sido mostrada em sua trama anterior, A vida da Gente (2011). Já deu para notar as faíscas de uma relação que promete ser explosiva, a de Julia e sua mãe Marta (Gisele Fróes).

Sete Vidas apresenta um texto sensível e de qualidade, diálogos bem pontuados e agilidade. Sem dúvida alguma, a cereja do bolo é a escrita da novela, mas o deslize do primeiro capítulo foi a ingenuidade do casal jovem de pensar que uma manifestação é o local ideal para marcar um encontro com um desconhecido.

É uma situação que serviu dramaturgicamente para o capítulo, mas impensável na vida real. Também fez falta um núcleo cômico para aliviar a tensão dramática da história, mas nada que não consiga ser resolvido ao longo dos capítulos.

Por fim, as imagens da Antártida apresentadas nos clipes de divulgação da novela ainda não entraram em cena. E nem precisa: o potencial dramático do texto de Sete Vidas já foi bastante impressionante.


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