Sacrifício de Fuzuê no ar: Entrada de socorrista de novela é confissão de culpa

A força-tarefa que a Globo armou para tentar salvar Fuzuê do fracasso histórico envolve uma medida drástica: o autor Ricardo Linhares, um dos veteranos no quadro de talentos da emissora, foi convocado para colocar nos eixos a trama pensada por Gustavo Reiz. A entrada de um "socorrista" é uma admissão de que colocar a novela das sete como foi idealizada no ar foi um erro.

Linhares, de 61 anos, tem experiência no cargo de socorrista. Ele ajudou novelas como A Lei do Amor (2016), Deus Salve o Rei (2018) e Amor de Mãe (2019). Mas também já esteve do outro lado da moeda e viu Silvio de Abreu intervir em Babilônia (2015). Agora, tem a missão de tentar fazer Fuzuê chegar ao seu fim da melhor maneira possível.

Um melhor planejamento poderia ter contornado esse drama. "Se é evitável de acontecer? Os equívocos fazem parte da jornada humana. Mas, em certos casos, talvez uma análise, um estudo um pouco mais aprofundado da estética e da linguagem geral do projeto à luz das ciências e do quadro psicossocial pudesse diminuir os erros. Ainda mais em tempos tão conturbados", diz Mauro Alencar, doutor em teledramaturgia pela USP (Universidade de São Paulo).

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Não dá para disfarçar o sacrifício de uma trama no ar. "Quando um autor (supervisor, no caso) vem em socorro de outro ou substitui o autor titular da história, estamos diante de um problema. O caso mais famoso ocorreu em Anastácia, a Mulher Sem Destino, de Emiliano Queiroz (o ator), em 1967, na Globo. Produção onerosa, com elenco numeroso, tramas que não empolgavam", lembra o especialista em telenovelas.

À época, Janete Clair (1925-1983), que fazia sua estreia na Globo, assumiu a história e provocou um terremoto que matou a maioria dos personagens para ela poder conduzir Anastácia até o fim.

Felipe Simas e Marina Ruy Barbosa na novela

Compromisso com anunciantes

Alencar, que atualmente é diretor na TV Cultura, trabalhou na Globo e em outras emissoras. Ele sabe mais do que ninguém que não dá para simplesmente descartar uma novela que fracassa.

"Na maioria dos casos, quando há problemas em que a empresa produtora precisa reconduzir a história, opta-se por afastar o autor titular. Vez ou outra, um autor assume o papel de supervisor. Essa estratégia dá certo na medida em que a empresa não pode jogar fora o 'bolo' que está feito", detalha.

"Você reúne todos os ingredientes para o bolo: farinha, açúcar, milho, fubá; compra uma embalagem bonita. E esse bolo fica cru no meio!", continua Alencar. E, aí, o que fazer?

O bolo está assando (tal e qual as chamadas da novela), o cheiro bom pela casa e, quando você tira do forno, percebe que o bolo assou na lateral, mas ficou cru no meio. Só resta uma saída para minimizar o prejuízo: recuperar o bolo cru. Mas esse bolo nunca será 'aquele' bolo, o bolo bom, que você saboreia.  

Isso é o que ocorre com uma novela problemática, aponta o autor de a Hollywood Brasileira - Panorama da Telenovela no Brasil. Há contratos com os atores, anunciantes, os patrocinadores, ações de merchandising, custos a serem diluídos nos capítulos. Não dá para descartar uma novela quando ela está no ar apenas porque fracassou.

"O melhor é convocar um novo autor ou um supervisor para acompanhar o autor titular e trazer novos caminhos para a história. Portanto o 'dar certo' é relativo."

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