Ousada e problemática, novela censurada pela ditadura reestreia no Globoplay

Nesta segunda (8), estreia no Globoplay a novela O Espigão, que foi ao ar originalmente em 1974. A trama faz parte do projeto Fragmentos, em que a plataforma de streaming disponibiliza títulos mais antigos, muitos com algum nível de danificação nos arquivos da Globo, mas que tiveram grande importância para a história da teledramaturgia.

O Espigão está quase completa no arquivo da Globo (apenas um capítulo não está disponível) e ficou marcada por problemas com empresários e com a Censura Federal durante a Ditadura Militar (1965-1984).

A novela teve como protagonista Lauro Fontana, interpretado por Milton Moraes (1930-1993). Trata-se de um empresário do ramo hoteleiro que, após ter infância num orfanato e passar a juventude fazendo vários bicos, cresceu na vida ao dar o golpe do baú numa ricaça.

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Ele então multiplicou seu patrimônio e anunciou a construção de um hotel majestoso no Rio de Janeiro, um prédio de 50 andares --que, no jargão da época, era um tipo de edificação chamada de espigão.

Para construir esse hotel, ele pretendia comprar uma área onde ficava uma mansão, em Botafogo, com grande área verde preservada. O imóvel pertencia a quatro irmãos, três que não queriam vender a propriedade e um que queria.

Na época, a novela trouxe problemas para a Globo ao tratar de questões como preservação ambiental e especulação imobiliária. Sérgio Dourado (1930-2018), dono de uma construtora responsável por vários empreendimentos no Rio de Janeiro e amigo da família Marinho, achou que o personagem era inspirado nele e não gostou disso.

O autor Dias Gomes (1922-1999) teve de fazer uma leve mudança na sinopse na história de Lauro. Originalmente, o personagem construiria um prédio de apartamentos, mas, para atenuar a situação com o setor imobiliário, a construção megalomaníaca dele foi um hotel.

O Espigão foi exibida em 1974, com 150 capítulos, na faixa das 22h. Em 1982, a Globo quis colocar no ar uma reprise da novela, em versão compacta. No entanto, essa reapresentação foi proibida pela Censura, que considerou que a trama tinha cenas violentas demais.

O setor empresarial também teria pressionado para que a novela não fosse reprisada, segundo depoimento da jornalista e apresentadora Cidinha Campos ao Jornal do Brasil:

"Sabendo da influência da Rede Globo, os empresários pressionaram para a novela não entrar no ar. E isso foi feito de uma maneira terrivelmente convincente: se a novela fosse reprisada, as construtoras e imobiliárias não colocariam mais anúncios nos classificados de O Globo", disse ela.

A Globo não reprisou O Espigão nem em 1982 nem em qualquer outra ocasião depois disso. A novela chega agora ao Globoplay com 149 capítulos disponíveis --falta apenas o 28-- em homenagem aos 50 anos de sua exibição original e 25 anos do aniversário de morte de Dias Gomes.