HISTÓRIA REMENDADA
Fotos Reprodução/TV Globo
Tiago (Humberto Carrão) é massageado por Marina (Alice Wegmann) em A Lei do Amor
MÁRCIA PEREIRA e FERNANDA LOPES
Publicado em 27/3/2017 - 5h23
Vitória (Camila Morgado) foi estuprada e engravidou quando já estava esperando um bebê? Marina/Isabela (Alice Wegmann) fez faculdade de fisioterapia e se tornou uma massagista com mãos de fada em poucos meses? A Lei do Amor chega à sua última semana com uma história mal contada, cheia de furos e soluções absurdas para tapar os remendos feitos pelos autores em busca de audiência.
A trama sobre os bastidores da política virou uma colcha de retalhos mal costurada, inverossímil. Muitos personagens se revelaram com dupla personalidade. Nem o mocinho da trama se salvou de derrapar ao trair seu grande amor e defender isso como algo sem importância.
Os desvios nas características de alguns personagens são gritantes. Entre eles estão a transformação de Hércules (Danilo Granghéia) de bobão em assassino e de Letícia (Isabela Santoni) _a "chatícia" como é chamada nas redes sociais_ de manipulável a garota fofa e pacificadora de conflitos.
Laura (Heloísa Jorge) e Pedro (Reynaldo Gianecchini) foram flagrados na cama por mocinha
Claudino Mayer, doutor em ciências da comunicação pela USP (Universidade de São Paulo) e especialista em teledramaturgia, afirma que a novela de Maria Adelaide Amaral e Vincent Villari se perdeu logo no começo, com muitos personagens, muitos atores novatos e desconhecidos e uma edição que deixou a história incompreensível.
No segundo mês, os novelistas promoveram uma série de ajustes que aceleraram o enredo e mudaram os destinos dos personagens secundários. No quarto mês, foi promovida uma faxina, retirando de cena personagens que não eram necessários. Começou aí o reinado da vilã Magnólia (Vera Holtz), quase tudo girou em torno de sua queda.
Na reta final, após repetir histórias e criar diferentes situações que não acrescentaram nada, A Lei do Amor não tem fôlego nem surpreende. A novela será lembrada como mais um Frankeinstein do horário nobre. Assim como Babilônia (2015), a atual trama das nove é a prova de que mesmo sendo uma obra aberta, um folhetim precisa ter alicerces bem firmes para não ruir com os vendavais.
Confira os principais erros da novela, que termina nesta sexta-feira (31):
Vitória (Camila Morgado) dançou até o dia raiar com Antonio (Pierre Baitelli) em festa
Quando foi o estupro de Vitória?
Vitória revelou na segunda semana da trama que estava grávida do marido, Ciro (Thiago Lacerda). Atormentada com a possibilidade de ele ter outra, a loira brigou com o mau-caráter, que sugeriu que ela cometesse suicídio tomando uma cartela de remédios tarja preta. Arrasada e prestes a se matar na terceira semana da novela, a filha de Magnólia foi com Luciane (Grazi Massafera) à festa de Venturini (Otávio Augusto).
Ela passou a noite com Antonio (Pierre Baitelli) e apareceu tomando café da manhã toda feliz, dizendo que se divertiu horrores com o loiro. Se estava esperando um bebê, como agora podem revelar que ela foi estuprada e engravidou de Leonardo (Eriberto Leão) naquela mesma festa? Faltou aos autores explicar melhor quando isso aconteceu.
Quem assiste à novela, acha que se trata da mesma festa, o que não dá para engolir. Aliás, na cena do estupro, Camila Morgado aparece com roupa diferente da que sua personagem usou na única festa de Venturini que foi mostrada na trama.
Faculdade de fisioterapia mágica
Isabela virou Marina, passou de garçonete e estudante de cursinho pré-vestibular para fisioterapeuta formada e massoterapeuta de mãos cheias em poucos meses. Como? Além do crime de falsidade ideológica, a personagem terá de explicar como conseguiu o milagre de se tornar uma profissional competente e elogiada em um passe de mágica. Está previsto que no último capítulo ela se revelará Isabela e se acertará com Tiago (Humberto Carrão). Ainda dá tempo de os autores mudarem isso inventando que Marina não é Isabela...
Montagem divulgação/TV globo
Alice Wegmann não mudou só visual: personalidade, idade e profissão são diferentes
Patrícia Prieto, fisioterapeuta credenciada pelo Crefito (Conselho Regional de Fisioterapia) e dona de uma clínica de massagem e estética em São Paulo, explica que a faculdade de fisioterapia tem duração de quatro anos. Depois, o profissional faz especializações que duram em torno de dois anos cada uma.
"Existem cursos de massoterapia a partir de um ano, um curso técnico. Existem também cursos muito pequenos de massagem pelo Brasil, tipo workshops de três ou quatro dias, mas com tão pouco tempo, a pessoa não pega mão", comenta a especialista, que ainda alerta para o perigo que uma Isabela poderia causar se sua história fosse real.
"Se a pessoa faz só isso de aula e sai aplicando massagem por aí, corre o risco de machucar, porque a massagem feita de forma errada machuca também, gerando dor e piorando uma inflamação."
Lia (Mônica Torres) viajou com filho e perdeu o marido para angolana sem ter se separado
Repetições e amnésia
Magnólia deve se suicidar no final da trama, o que será sua terceira tentativa. Ela já tentou se jogar de uma ponte e tomar veneno para acabar com a própria vida. Esse é um exemplo das repetições em A Lei do Amor.
A quarentona Helô (Cláudia Abreu) engravidou duas vezes seguidas mesmo sendo uma mulher que teve uma gestação tubária e teria dificuldades para engravidar. Pedro descobriu duas filhas que não sabia que tinha, outro caso de falta de criatividade. A lista de repetições conta ainda com Helô flagrando o amado na cama com outra duas vezes e Letícia sofrendo com câncer no início e no final da trama.
A novela também minimiza questões importantes ao mudar a trajetória de seus personagens. Além do caso de Vitória já estar grávida na festa de Venturini, Olavo (Tato Gabus Mendes) começou a namorar Laura (Heloísa Jorge) como se não fosse casado.
Apenas um diálogo no capítulo de sábado (25) foi dado para explicar que sua mulher, Lia (Mônica Torres), que saiu para velejar com o filho, David (Rafael Lozano), já está em outra. Retirada da história, a personagem teria reatado o casamento com seu primeiro marido.
"A novela colocou um e outro em viagem para fora do Brasil, atores desapareceram. Com esses atalhos, ganhou-se certo fôlego, mas o público de uma certa maneira não criou uma identificação pela qual possa torcer pelos personagens", comenta Claudino Mayer.
Luciane (Grazi Massafera), Salete (Cláudia Raia) e Hércules (Danilo Granghéia) em comício
Abandono do tema principal
Para o especialista, os erros cometidos em A Lei do Amor precisam levar em conta a nova demanda do mercado. O tema principal, política e corrupção, foi abandonado sem qualquer aprofundamento.
"Estamos voltando ao boom da telenovela dos anos 1970. As pessoas querem ver um romance água com açúcar e não querem ver mais a realidade na telenovela. Já tem operação Lava Jato e tudo o mais [nos telejornais]. Então, a novela com mais isso [questões políticas] ninguém aguenta", conclui.
A Lei do Amor chega à última semana com média de 27 pontos, dois a menos que sua antecessora, Velho Chico.
Confira quatro reportagens especiais sobre A Lei do Amor:
Ator é obrigado pela namorada a assistir novela da Record
Claudia Raia fez teste do sofá com sarados e apimentou a trama
Para levantar novela, Globo cortou falas de empregadas e doença de criança
Bumbum de Grazi Massafera virou a grande sensação do folhetim
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