Firmino, Vanclei ou José? Atriz entrega final perfeito de Xaviera em Mar do Sertão

Não há homem para Xaviera (Giovana Cordeiro) em Canta Pedra. Isso é óbvio para a intérprete da personagem de Mar do Sertão. Para ela, Firmino (Odilon Esteves) nutre pela bonitona um amor de amigo, José (Sergio Guizé) a despertou para um novo momento, e Vanclei (Marcello Melo Jr.)... Bom, sem condições. O rapaz é um trambiqueiro de marca maior, além de desvalorizá-la como mulher. Se depender da atriz, só há um futuro possível para a moça: solteira, milionária e longe de perrengues.

"Ela foi apresentada como uma mulher esperta, oportunista, da vida. Todo mundo ficou com pé atras, porque ela tinha a promessa de ser uma grande vilã. Mas tivemos essa redenção, que, dramaturgicamente falando, é positiva. As pessoas se identificam, torcem por uma reviravolta, porque ela merece", conta a atriz em entrevista ao Notícias da TV.

Também é um desejo de Giovana enquanto intérprete da sofrida. Ela não aguenta mais fazer cenas correndo atrás de ônibus, sendo banhada com lavagem de porcos ou inundada por poeira do sertão. Tudo o que ela queria era reprisar o único momento de paz da personagem: o que ela mergulha na banheira cheia de sais de banho de José.

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Enquanto isso, ela curte o momento trágico da ex-golpista na novela. Esse sofrimento todo, numa narrativa torta da redenção, fez com que o público se apegasse à personagem -e até a titulasse como "protagonista moral" do folhetim. 

"É uma personagem muito bem escrita. O que eu faço é incorporar essa dualidade da Xaviera. Ela não é 100% boa, nem 100% má, e pensa estar sendo castigada. Principalmente depois de ter se passado pela compadecida, quando ela obteve muita fé. Eu, como atriz, vou cativando histórias para ela gerar identificação. E as pessoas vibram porque se enxergam no fato de de ela ser popular, carismática e ficar pelo lado do humor", diz.

Xaviera como Compadecida na novela

O momento em que a moça incorporou a santa, à la O Auto da Compadecida (2000), é um dos mais lembradas pelo público. Teve até quem elevasse a atriz ao status Fernanda Montenegro, que viveu a Compadecida no longa-metragem. É curioso, porque Giovana foi neta da veterana em O Outro Lado do Paraíso (2017). E, naquela novela, Fernanda também abordava a fé, por meio da mística curandeira Mercedes.

Novos estereótipos?

Autor do livro que inspirou o filme, Ariano Suassuna (1927-2014) é uma das referências da artista para compor a personagem. Assim como Jorge Amado (1912-2001), o escritor é um dos principais responsáveis pelo imaginário coletivo sobre o Nordeste brasileiro. Ela, porém, diz se esforçar para não reproduzir caricaturas que não cabem mais à região. As obras desses dois autores foi tão reproduzida que muitos sudestinos resumem o nordeste às paisagens secas, cangaceiros e personagens cômicos.

"Eu acho que, no começo, as pessoas tiveram esse receio. Mas ter atores nordestinos na novela traz uma propriedade muito grande do que está sendo dito e representado. Eu, como sudestina, bebo muito dessa fonte, respeito muito as tradições nordestinas. Tive muito cuidado, troco muito com os atores e busco ser respeitosa. E também construo uma personagem que é humana, que traz todas as camadas ", explica.

A novela trata de arquétipos porque é uma fábula, um formato da dramaturgia que funciona, e as pessoas gostam da história por causa disso também. Mas os personagens são humanos. Não consigo enxergá-los como personagens chapados, que reproduzem estereótipos.

Nesse sentido, outra questão importante é o sotaque da personagem. Não é de hoje que as novelas da Globo, normalmente produzidas e interpretadas por profissionais do eixo Rio-São Paulo, recebem críticas por forçar dialetos ou jeitos de falar. Mar do Sertão foge disso ao escalar 15 atores nordestinos para o elenco --inclusive nos papéis dos protagonistas. Com isso, a minoria sudestina, como Giovana, consegue ter boas referências para construir sua fala.

"Converso muito com a Suzy Lopes [a Cira da novela]. Com ela, consigo entender mais sobre o sotaque. E, antes das gravações, fiz um estudo longo sobre isso para outro trabalho [...] Também há a questão do principio da voz. O sotaque não carrega só a cultura da região, tem uma cultura pessoal, da personagem também. Quem é a Xaviera, de que forma ela se comunica, de onde ela é... Porque ela é da capital, e, com isso, é mais despojada que os canta-pedrenses. São muitos elementos para me apropriar. Enfim, eu fico muito feliz quando alguém fica surpreso por eu ser carioca", afirma.

De picareta a protagonista

O sofrimento pode até ter feito o público se bandear para o lado da personagem, mas também não dá trégua pra ela. Só nas últimas semanas, Xaviera foi roubada, pediu esmola, foi presa e demitida pelo menos três vezes. A atriz confessa que também não entende o porquê de tanta tragédia. "Ela, no mínimo, tem que ganhar na loteria", brinca.

Depois de tantas desgraças, também há a possibilidade de que a moça se rebele. Ela, que estava acostumada com a vida de oportunista, já admitiu não ter ganhado nada ao tentar ser boazinha. Soma-se a isso o fato de Vanclei insistir em que ela volte a aplicar golpes com ele. Giovana vê a personagem como uma grande admiradora de José; é praticamente impossível que ela queira passar a perna nele.

Xaviera após correr atrás de ônibus

Mas, no fim, quem decide é Mario Teixeira. Para a atriz, resta fazer com que o público entenda os motivos de Xaviera para tomar certas atitudes. "Poucas pessoas estenderam a mão para ela, sabe? Seria justificável se ela se revoltasse. Na moralidade da vida, não é do meu caráter. Eu torço muito pela Xaviera dar uma reviravolta --tomara que não pela picaretagem."

A atriz, contudo, também não deseja que a espevitada siga por esse caminho. Ela acredita na mudança das pessoas e gostaria que isso fosse representado nas telas. 

"Parece um papo clichê, mas, por mais errado que a pessoa tenha agido, por mais difícil que seja, sempre há uma oportunidade de aprender. É isso que engradece o ser humano. Todo ser humano é capaz de tudo. Saber lidar com as nossas forças e as nossas potências para se refazer, para se reerguer, é o grande sentido da vida. Acredito muito na mudança das pessoas. Não só para uma segunda chance: para uma terceira, quarta... Enquanto existir vida, há mudança", defende.

Feminista sem saber

Se sucumbir ou não, o fato é que Xaviera precisou jogar o jogo do golpismo para sobreviver. Basta remontar a infância da moça, mencionada poucas vezes durante a trama. Ela não teve pai ou mãe, trabalhou em situação análoga à escravidão desde criança e deve ter sofrido muito assédio e situações de abuso de poder.

Vanclei pressiona Xaviera (em fase beata)

"Dentro de todos os nossos privilégios, nós sofremos com isso. Imagina uma menina sozinha, na rua, sem estrutura familiar..." Depois de tudo isso, a jovem foi construindo, pouco a pouco, seu lado feminista.

É bonito também ver que ela está tomando essa consciência. Como naquele momento de virar beata. Não deu certo para ela, mas foi uma tentativa para ser valorizada. Só que ela percebeu que, para isso, não precisa deixar de ser sensual, de usar as roupas que gosta de usar. Ela quer que o mundo mude, não que precisar se tapar ou se esconder para ser ouvida.

Por isso, não há chance de ela voltar com Vanclei. O rapaz literalmente já disse que, quando eles eram um casal, "ele usava a cabeça, e ela, a gostosura". Esse pensamento machuca Xaviera, que também quer ter sua inteligência valorizada. Firmino a vê com dignidade, mas seria tão importante para a moça que um homem gostasse dela sem qualquer interesse sexual...

"Isso ainda está muito aberto. Eles vão construir uma amizade muito interessante de ver, e o autor que vai escolher qual o caminho disso. Mas eu torço por uma amizade, respeito, amor genuíno. É importante pra Xaviera algum homem ajudá-la sem ser num lugar de interesse sexual. E, mulé --olha eu falando como ela--, eu jurava que a Xaviera ia criar confusão nas relações amorosas, mas até agora não pegou ninguém. Agora ela está na defensiva... Não sei se alguém vai amolecer o coração dela", finaliza.

Mar do Sertão está no ar na faixa das 18h da Globo. O folhetim é escrito por Mario Teixeira e dirigido por Allan Fiterman. Leia os resumos dos próximos capítulos da novela das seis.

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