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NOVELA DAS ONZE

Atores de Liberdade querem mais negros em cena e nos bastidores

João Miguel Júnior/TV Globo

Os atores David Jr. e Heloisa Jorge durante as gravações de Liberdade, Liberdade - João Miguel Júnior/TV Globo

Os atores David Jr. e Heloisa Jorge durante as gravações de Liberdade, Liberdade

FERNANDA LOPES

Publicado em 13/5/2016 - 5h21

Todos os seis atores negros do elenco de Liberdade, Liberdade já interpretaram papéis de escravos ou serviçais em outras produções da TV. Nenhum deles deu vida a juízes, fazendeiros ou professores. Nenhum foi protagonista de uma novela brasileira. Nesta sexta-feira (13), no 128º aniversário da abolição da escravatura, negros ainda são absoluta minoria na televisão, apesar de serem maioria na população brasileira. As principais novelas da Globo têm 29 atores negros, mas só três interpretam personagens com curso superior. Os profissionais, que sofrem racismo na trama e na vida real, reclamam que falta representação e sobra estereótipo na teledramaturgia nacional. 

Na novela das onze da Globo, a história do negro brasileiro é contada de forma mais ampla do que o padrão das produções de época. Na trama, que se passa em 1808, há um escravo que mantém relações sexuais frequentes com sua senhora branca, uma negra que foi criada como irmã de uma branca e um negro liberto que serve como coronel da infantaria portuguesa.

Para o ator Bukassa Kabengele, 43 anos, que interpreta o militar, a trama das 23h se diferencia por fugir dos clichês sobre escravos e exibe cenas que nunca estiveram em primeiro plano em outras produções. Mas, mesmo assim, ele acha que o negro precisa de mais espaço no horário nobre.

"Se a gente for falar de um público que hoje com certeza é real, consome e dá audiência, eu acho que deveria haver uma relação de mais presença, evidência e número na TV. Dá a impressão de que [a situação] mudou e mudou sim, mas a população [negra] é imensa, então a proporcionalidade ainda deixa a desejar", afirma.

De acordo com o último Censo, 43,1% da população brasileira se considera parda e 7,6% se autodeclara preta. Entre pardos e pretos, seriam 97 milhões de negros, o que daria a maioria da população do país, já que a contagem é de 2010, quando o Brasil tinha 190,7 milhões de habitantes. 

Reprodução/tv globo

David Jr. em cena como escravo sexual de Dionísia (Maitê Proença) em Liberdade, Liberdade

Escravo pela terceira vez

David Jr., 30 anos, o Saviano de Liberdade, Liberdade, faz papel de escravo pela terceira vez em sua carreira _as outras foram na série A Cura (Globo, 2010) e em uma peça. Também já deu vida a um segurança em Geração Brasil (2014) e a cangaceiro chamado Meia-Noite em Cordel Encantado (2011). Agora, é duplamente escravo, já que presta serviços sexuais obrigatórios à patroa, Dionísia (Maitê Proença). Olívia Araújo, a escrava Celeste, fez papel de empregada em suas últimas três novelas. Lucy Ramos, que faz a escrava chantagista Malena, também já foi criada na segunda versão de Sinhá Moça (2006). A exceção foi psicóloga vítima de racismo que ela interpretou em I Love Paraisópolis (2015).

Os três são alguns exemplos de como a maioria dos profissionais negros ainda são escalados para personagens com nível baixo econômico e que vivem dramas sociais. "Falta representação sim. Tem, mas precisa ter mais. Quanto mais referências na TV, melhor para as pessoas se aceitarem, se assumirem, entenderem suas identidades e entenderem que têm mais de um tipo de negro [fisicamente]. Tem que colocar os negros em todos os postos. Tem que ter médica, advogada, não só faxineira, cozinheira", defende Lucy Ramos.

Entre as quatro principais novelas no ar na Globo atualmente (Eta Mundo Bom!, Totalmente Demais, Velho Chico e Liberdade, Liberdade), apenas 29 atores dos elencos principais são negros. Desses, só três interpretam personagens que trabalham em profissões que exigem curso superior.

Por meio de assessoria de imprensa, a Globo afirma que "não segmenta seu elenco por etnia, classe social, sexo nem religião. O elenco é escalado de acordo com a compatibilidade artística do personagem e adequação à história".

Reprodução/globo

Lucy Ramos em cena como Malena, escrava que chantageia sua patroa, Branca (Nathalia Dill)

Luta contra o racismo

A atriz Heloisa Jorge, que interpreta a escrava Luanda em Liberdade, Liberdade, é angolana e já foi protagonista de uma novela em seu país. Ela acredita que, apesar de o racismo fazer parte da sociedade brasileira e ter consequências em diversos segmentos (político, social, econômico e artístico), o povo negro também está se posicionando contra isso.

"A luta do movimento negro e as leis de reparação vigentes aqui no Brasil vêm traçando um caminho sem volta. Representatividade importa e está longe de ser besteira", afirma.

David Jr. já recebeu tratamento diferente por ser negro e acha que a mudança no meio artístico deve acontecer de forma mais ampla. "Nos Estados Unidos, os profissionais, sem fazer distinção de etnia, se produzem, se dirigem, acho isso bacana. Não que não falte espaço, mas acho que também falta mais isso". opina. 

João cotta/tv globo

O ator Bukassa Kabengele em cena como o personagem Omar de Liberdade, Liberdade

Poder nos bastidores

Há entre os atores a visão de que, se mais diretores, autores, produtores e profissionais dos bastidores fossem negros, a situação seria outra. "Há autores não negros que também brigam por essas questões [de etnia], a gente não sabe por que elas passam ou não. Mas acho que se tivesse mais negros ocupando cargos em que se decide o que será feito e quais são os perfis que serão colocados em pauta, as chances [de ter mais representação negra na TV] aumentariam", diz Kabengele.

Entre os principais autores de novelas da Globo, nenhum é negro. Xica da Silva (Manchete, de 1996), escrita por Walcyr Carrasco, foi primeira trama a ter uma protagonista negra _Taís Araújo, que mais tarde também fez a primeira protagonista negra em uma novela da Globo (Da Cor do Pecado, de João Emanuel Carneiro, exibida em 2004). Hoje, ela e Lázaro Ramos são os personagens principais da série Mister Brau.

"A TV Globo é a que mais tem produtos de teledramaturgia, está muito à frente, e por isso tem aberto mais portas. Mas eu não digo que seja o suficiente para contemplar a população brasileira. O fato é que o número [de profissionais negros na TV] ainda está abaixo do que o Brasil merece como história e como realidade", completa.


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