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COLUNA DE MÍDIA

YouTube atua contra a Jovem Pan e pode selar destino da mídia bolsonarista

Divulgação/Jovem Pan

Tutinha, da Jovem Pan

Tutinha diz a amigos que não recebe verba do governo; agora, pode perder dinheiro do YouTube

GUILHERME RAVACHE

ravache@proton.me

Publicado em 19/9/2022 - 6h25

A Jovem Pan talvez viva um dos momentos mais difíceis de sua história. Se os últimos anos foram de crescimento acelerado e recorde de lucros, a empresa foi do Céu ao inferno em poucas semanas.

A amigos, Antônio Augusto Amaral de Carvalho Filho, o Tutinha, dono da Jovem Pan, tem lamentado não receber dinheiro de Jair Bolsonaro (PL). De fato, a maior parte do dinheiro do grupo ainda vem das rádios espalhadas pelo país. 

Mas um fato pouco comentado é que o YouTube é uma das principais fontes de receita da Jovem Pan. A empresa do Google chega a pagar R$ 30 milhões por ano para a emissora. Cifra semelhante ao que o SBT receberia da plataforma. O Google também tem um acordo de publicidade com a Jovem Pan, o que rende mais alguns milhões por ano.

Em 2021, a Jovem Pan viu seu faturamento crescer mais de 30%, indo de R$ 77,8 milhões para R$ 101,6 milhões. Já o lucro líquido da empresa foi de R$ 9 milhões para R$ 15,7 milhões. Um crescimento de quase 75%.

A principal razão para o aumento foi o crescimento no digital, particularmente no YouTube. "No YouTube, o número de views de 2020 para 2021 aumentou 32%, e tivemos um aumento de 49% em horas assistidas. Um total de 3,9 bilhões de views no ano todo e um aumento de 132% nas receitas", afirmou Roberto Araújo, CEO do Grupo Jovem Pan, em entrevista ao Notícias da TV em julho.

A estimativa é que até 40% da receita anual da Jovem Pan venha do Google, o que torna a gigante de tecnologia a maior fonte de receita do grupo.

O peso do Google na Jovem Pan

Mas após se tornar a vitrine do bolsonarismo e perder os anunciantes mais moderados, a Jovem Pan agora corre o risco de ver o Google pular do barco, perdendo até 40% de seu faturamento.

O desconforto do Google com a Jovem Pan foi crescente nos últimos meses. Mas a gota d'água teria sido a divulgação, na última terça (13), de um relatório do NetLab, centro de pesquisa em Comunicação da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e publicado pela Folha de S.Paulo, mostrando que o YouTube priorizava a distribuição de vídeos da Jovem Pan para seus usuários. Parte desses vídeos era favorável ao presidente Jair Bolsonaro e críticos ao ex-presidente Lula (PT).

A jornalista Ana Clara Costa, da Piauí, revelou que pela primeira vez o YouTube desmonetizou durante um dia ganhos com anúncios do programa Os Pingos nos Is, principal atração da Jovem Pan. Além disso, reduziu o alcance da atração na plataforma, diminuindo o número de notificações para os mais de 5 milhões de inscritos do canal. 

Segundo a reportagem, "como resultado da falta de aviso, a audiência que acompanha o canal ao vivo caiu para 70 mil usuários simultâneos, ante os mais de 150 mil que costuma amealhar. A audiência total do programa também foi impactada pela falta de divulgação do canal na plataforma: até a tarde desta quinta-feira (15), totalizara 553 mil visualizações, o segundo pior resultado do ano --o pior foi em 18 de janeiro, com 550 mil visualizações, segundo levantamento da consultoria Novelo Data. Trata-se de um tombo expressivo, já que a audiência média de cada episódio nas últimas semanas tem chegado a 900 mil visualizações".

Ana Clara também revelou em longa reportagem na Piauí o peso do Google na estratégia da Jovem Pan. Quando o ex-juiz Sérgio Moro desembarcou do governo, Tutinha teria decidido abandonar o apoio a Bolsonaro, mas mudou de ideia ao ver os números de audiência e receita que os apoiadores de Bolsonaro traziam, principalmente nos meios digitais.

Essa não é a única dor de cabeça para a Jovem Pan. Segundo reportagem do Notícias da TV, com medo de ser tirada do ar, a direção da Jovem Pan teria pedido a seus profissionais para reduzir os elogios a Bolsonaro.

"Na semana passada, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) notificou a Jovem Pan por divulgação de notícias falsas contra Lula e espaço desigual de elogios a Bolsonaro durante a cobertura da campanha presidencial. O fato assustou a empresa. [...] O órgão regulador das eleições tem monitorado diariamente os programas jornalísticos do canal de notícias".

Futuro incerto na Jovem Pan

Mas se o cenário atual é ruim, o futuro pode ser pior. O Google tem sido cada vez mais pressionado em diversos países por governos e órgãos reguladores. Como escrevi na última semana, de certo modo o Brasil ainda é um porto seguro nesse sentido. Se Bolsonaro deixar o governo, isso pode mudar. 

Como o Google irá seguir caso Bolsonaro não seja presidente é uma questão aberta. Mas o atual governo foi fundamental para barrar a aprovação da Lei das Fake News, vista como altamente negativa pelas empresas de tecnologia, incluindo o Google.

Uma eventual saída de Bolsonaro do poder também pode levar o Google a tentar criar relações mais próximas com um novo novo governo, o que pode ser um desafio para a relação com a Jovem Pan, já que é uma emissora alinhada com Bolsonaro. 

Curiosamente, a notícia de que a Jovem Pan irá reduzir os ataques a Lula e diminuir o apoio a Bolsonaro (supostamente para atender ao TSE) chega no mesmo momento em que o Intercept divulgou a notícia de que a Record (do Bispo Edir Macedo, da Igreja Universal) estaria se preparando para retirar o apoio a Bolsonaro no segundo turno. Na sexta-feira, Macedo em uma rede social que seguia apoiando Bolsonaro. 

Pode ser coincidência. Mas seja como for, se Lula vencer, descobriremos até que ponto Jovem Pan e Record foram motivadas pela ideologia bolsonarista ou por simples conveniência. Presidentes passam, mas a grande mídia fica.

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