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ESTREIA NO LIFETIME

Diretora enfrenta repressão e machismo afegão para rodar filme vencedor do Oscar

Divulgação/Lifetime

Meninas afegãs com lenços enrolados na cabeça e capacetes fazem aula de skate em cena do documentário Aprendendo a Andar de Skate em Zona de Guerra (Se Você For Menina)

Meninas afegãs aprendem a andar de skate em documentário vencedor do Oscar neste ano

LUCIANO GUARALDO

luciano@noticiasdatv.com

Publicado em 12/10/2020 - 6h55

Marcado pelos horrores da guerra iniciada em 2001, o Afeganistão vive em constante estado de tensão. Mas foi no país asiático que a diretora Carol Dysinger encontrou a inspiração para contar uma história de superação e resistência. Ela mesma precisou enfrentar a repressão e o machismo afegãos para rodar um projeto que lhe rendeu o Oscar de melhor documentário em curta-metragem deste ano.

Aprendendo a Andar de Skate em Zona de Guerra (Se Você For Menina) estreia nesta segunda (12), às 20h50, no canal Lifetime. O título é um bom resumo da história de 40 minutos: em uma escola chamada de Skateistan, meninas afegãs aprendem a ler, a escrever e a fazer cálculos. E também têm aulas de skate. Tudo isso enquanto encaram os perigos de uma guerra: bombas podem explodir na vizinhança a qualquer momento --e, de fato, explodem.

Carol Dysinger já tinha rodado um documentário no país, Camp Victory, Afghanistan (2010), sobre o treinamento dado pela Guarda Nacional dos Estados Unidos ao exército afegão. Nesse meio tempo, entrou em contato com a população local e se encantou --ela trabalha em outro projeto, One Bullet, que mostra como uma família é afetada por uma tragédia da guerra.

"A matriarca dessa família, Bibi, tem 53 netos. Então choviam crianças naquela casa, elas entravam pela janela, rolavam pelas escadas (risos). E eu pensei: 'Meu Deus, preciso descobrir um jeito de registrar como essas meninas são quando elas não estão agindo como uma garota deveria agir naquele país'. E aí o Lifetime me procurou com esse projeto sobre o Skateistan, e eu aceitei na hora. Sabia que ali eu ia conseguir mostrar o comportamento dessas meninas quando acham que ninguém está olhando", lembra a cineasta.

As aulas sobre as pranchas de madeira são intercaladas com lições sobre o mundo, e o início que mostra as jovens estudantes tentando definir para a professora o que é coragem não é mera coincidência: cada uma das pessoas naquela sala demonstra a bravura de deixarem suas casas para tentarem construir um futuro melhor.

"A ideia sempre foi usar o skate como uma metáfora sobre como superar o preconceito e a opressão. Como tínhamos pouco tempo, eu precisava de uma estrutura que funcionasse, independentemente do que conseguíssemos filmar. Eu queria fazer um projeto todo sobre skate, mas vi que não seria possível nem tão interessante. E aí entendi que era um filme sobre coragem", explica a diretora em entrevista ao Notícias da TV.

Além de cineasta, Carol é professora e encontrou nas meninas do Skateistan uma vontade de aprender que nunca tinha visto antes. Se não fossem até a escola, afinal, elas ficariam trancadas em casa, ajudando as mães e cuidando dos irmãos, como determina a tradição afegã.

"Eu adoro quando uma das meninas diz que 'coragem é ir para a escola para ler o Alcorão e outros livros'. Porque esses outros livros, sim, exigem muita coragem delas (risos). Então, fiz um filme sobre a coragem. Coragem de falhar, de cair do skate, de ir até a lousa sem saber a resposta, de querer ser boa em alguma coisa, de levantar a mão e pedir para falar", define.

Para filmar em uma zona de guerra, com crianças que se arriscam todos os dias, Carol e sua equipe tiveram de tomar uma série de cuidados. "Por questão de segurança, não podia rodar nenhuma externa no mesmo dia que ia para a escola. Então, no Skateistan, acho que fomos só quatro vezes. E só podíamos filmar duas ou três horas por dia lá, então nosso tempo foi bem limitado."

A cineasta Carol Dysinger durante filmagem no Afeganistão (Divulgação/Lifetime/A&E Movies)

Ela também precisou convencer as famílias dessas crianças a autorizarem as filmagens --e, em alguns casos, mães e tias das meninas também aparecem. "Como são garotas que vão para uma escola de skate, as famílias são mais liberais, então eu meio que já tinha eliminado aqueles pais que venderiam a própria filha por uma bateria de carro, entende? Em alguns casos, a mãe aprovou porque o pai é drogado e ausente. Foi um processo bem diferente", recorda a diretora.

Vencedora de prêmios importantes como o do festival de Tribeca e o Bafta, Carol foi para a cerimônia do Oscar sem nenhuma expectativa. "Tinham outros filmes incríveis naquela categoria. Não sei se eu teria votado no meu! (risos)", admite ela, bem-humorada. "As outras pessoas diziam que eu ia vencer, e eu só minimizava tudo aquilo."

No fim da noite de 9 de fevereiro, Carol tinha uma estatueta dourada para chamar de sua. "Eu percebi uma coisa importante. Durante décadas, os documentários tiveram a missão de mostrar o que há de errado com o mundo. Agora, as pessoas já sabem que as coisas estão horríveis, mas querem ver que há uma maneira de sobreviver a isso. O filme fez sucesso porque é uma obra sobre como resistir durante uma situação difícil. O mundo não precisa de um filme para dizer que tudo vai para o inferno. Nós já sabemos disso!", define.

Para o público brasileiro que vai assistir a Aprendendo a Andar de Skate em Zona de Guerra (Se Você For Menina) nesta segunda, a cineasta deixa um pedido. "Quero que vocês façam uma festa! E que me convidem (risos)! Eu acho que sempre haverá esperança enquanto as crianças puderem aprender e brincar. Se elas não puderem mais fazer isso, não tiverem um futuro, não amarem a vida, aí temos um problema. Mas acho que o Brasil já é muito bom em amar a vida, então acho que o filme vai apenas lembrá-los de algo que vocês já sabem. E que eu espero que nunca esqueçam", encerra.

Confira o comercial do documentário que será exibido pelo Lifetime:


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