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ANÁLISE

Desesperada para vender, Globo planeja festa careta para comemorar 60 anos

Daniela Toviansky/Globo

Manzar Feres, principal executiva da área comercial da Globo, e Paulo Marinho, vice-presidente, no Upfront 2025; eles vestem roupas prestas

Manzar Feres, principal executiva da área comercial da Globo, e Paulo Marinho, vice-presidente

DANIEL CASTRO

dcastro@noticiasdatv.com

Publicado em 18/10/2024 - 6h10

A Globo reuniu o mercado publicitário na quarta-feira (16) para anunciar as novidades da programação do próximo ano e as quase infinitas oportunidades para se fazer propaganda na emissora. O Upfront 2025, nome do evento, foi mais especial porque desenhou como serão as comemorações dos 60 anos da TV Globo e do centenário do jornal O Globo, fundador do maior grupo de comunicação do país.

Ao mesmo tempo inclusiva e conservadora, a programação que a Globo vendeu ao mercado é emblemática do momento que vive. A emissora vem perdendo relevância e se sentindo cada vez mais ameaçada pelo avanço da publicidade digital, principalmente do Google.

Não foi à toa que Manzar Feres, a executiva número um da área comercial, começou sua fala rebatendo dados divulgados na semana passada pela big tech, de que haveria mais gente assistindo ao YouTube do que a qualquer uma das cinco redes nacionais, o que não é verdade (ainda!).

A Globo passou redundantemente para anunciantes a mensagem de que ela é uma opção melhor do que o Google e de que é um ambiente seguro para marcas, porque produz "conteúdos que marcam", segundo seu novo slogan, ao contrário de seu rival do Vale do Silício, que não investe em conteúdo e "só" carrega qualquer vídeo de terceiros.

Upfronts foram criados pelas redes norte-americanas para vender espaços publicitários e anunciar novos programas e séries. Mas o tom de "estamos à venda" do Upfront 2025 da Globo foi exagerado. Na disputa por verbas de publicidade cada vez mais fragmentadas, a Globo se fragmentou em dezenas de formatos comerciais. Vende até naming rights de banheiro do BBB 25.

Poderia ter sido irônico, mas foi constrangedor o momento em que Tatá Werneck e Eduardo Sterblitch disseram que topavam mudar seus nomes, incorporando neles marcas, e a humorista soltou que por apenas R$ 10 mexeria até no "pinto" de alguém (veja vídeo abaixo).

"A gente quer o dinheiro de vocês, também o amor, mas muito mais o dinheiro", deixou claro Tatá, levando ao extremo o discurso de "anuncie aqui" de quase todos que passaram pelo palco do Auditório Ibirapuera, em São Paulo.

Com receitas estagnadas, Globo perde mercado

A Globo hoje precisa fazer upfronts porque é muito mais difícil vender espaço para marcas numa programação do que antes. Até dez anos atrás, eram os anunciantes que corriam atrás da Globo. Hoje, é possível dizer que é o contrário, que a Globo é refém do mercado. Suas novelas não dão mais 50 pontos. Nem 30.

A verba da televisão está escorrendo para as plataformas digitais. Em 2017, de cada R$ 100 investidos em propaganda via agências de publicidade, R$ 58 iam para a TV aberta, de acordo com o Cenp-Meios. No segundo semestre deste ano, segundo o mesmo estudo, a parte da TV aberta já tinha caído para R$ 37,40 de cada R$ 100. E, pela primeira vez, investiu-se mais em digital (R$ 39,60).

Manzar Feres, a diretora comercial, anunciou no Upfront que em 2024 a Globo terá o maior faturamento em 12 anos. Provavelmente, se referia à receita com publicidade, que atualmente é pouco mais de 60% do faturamento da empresa, e tampouco estaria considerando a inflação do período. Em valores nominais, o melhor ano da Globo foi 2014, quando faturou R$ 16,2 bilhões. Nunca mais ultrapassou essa marca. Em termos reais, a Globo está perdendo market share, suas receitas têm sido menores ano após ano.

Diante da necessidade de fazer receitas, disputando mercado com um player (YouTube) que já é a segunda maior fonte de consumo de vídeo em televisores e celulares, a Globo não pode correr muitos riscos em sua programação.

Logo, a emissora comemorará seus 60 anos com uma grade zero inovadora, reeditando sucessos do passado a pretexto de homenagem, recorrendo a remakes assépticos, como promete ser o de Vale Tudo, e ao musical, principalmente o sertanejo, porque atrai marcas nacionais e regionais (embora afaste o público, dê menos Ibope).

Em 2025, teremos uma novela protagonizada por cantoras sertanejas e uma versão feminina do Amigos, além de um programa semanal por temporada do cantor Daniel. E mais uma série de musicais e festivais de outros gêneros.

A programação dos 60 anos da Globo parece ter sido calculada para correr o menor risco possível. Apesar da alta probabilidade de resultar numa versão inferior à de 1988, é mais seguro refazer Vale Tudo. Ao que tudo indica, será uma novela politicamente correta, porque falar mal do Brasil não é mais legal, como disse a autora Manuela Dias à Folha de S.Paulo.

A Globo é hoje uma empresa inclusiva, que se esforça para escalar um elenco que represente a diversidade racial brasileira, o que por outro lado disfarça uma estratégia de redução de custos. Mas tem sido muito conservadora em sua programação.

Cenas de violência e sexo viraram raridade nas novelas. Os vilões não são racistas, não corrompem funcionários públicos, não fazem o L ou o M. A maldade é controlada, é tudo muito plano. Assim, não se corre o risco de cancelamento nem de envolver alguma marca numa fria. Afinal, a cota de patrocínio para a novela das nove durante todo o ano custa R$ 338 milhões. São duas cotas à venda. É muito dinheiro em jogo.

O conteúdo da Globo está adotando demais a brand safety (segurança de marca), e sua programação de 60 anos, para usar um termo da época de Vale Tudo, tem tudo para ser careta.


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