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MARCOS OLIVEIRA

Eterno Beiçola nunca quis trabalhar na TV: 'Mais um dentro do pote de merd*'

REPRODUÇÃO/INSTAGRAM

Marcos Oliveira posa sorrindo e segurando um salgado com a mão esquerda; ao fundo, é possível ver um painel com ilustrações de humoristas brasileiros.

Marcos Oliveira no Prêmio Prio do Humor, em março; ele lançará livro sobre trajetória como ator

SABRINA CASTRO

sabrina@noticiasdatv.com

Publicado em 3/9/2023 - 9h00

Às vésperas de lançar sua autobiografia, Marcos Oliveira não tem papas na língua ao avaliar sua trajetória como ator --e a arte da dramaturgia como um todo. O eterno Beiçola de A Grande Família (2001-2014) reconhece que o teatro não tem o mesmo aprofundamento de outrora e que muitos produtos televisivos não passam de uma "bananada". O ator, aliás, sequer tinha pretensão de trabalhar na TV. Sabia que nunca seria um galã e também nunca quis se sentir limitado a uma câmera. Seu negócio sempre será a plateia.

A visibilidade que a TV proporciona também nunca lhe agradou muito, como Oliveira confessa ao Notícias da TV. "É tanta gente te analisando e não falando merda nenhuma, entendeu? É uma coisa meio desajustada. Você vira mais um dentro do pote de merda", diz ele, suspirando e aumentando o tom de voz. "Eu gostaria muito [de trabalhar na TV], salvaria minha vida. Mas não querem saber dos velhos. Querem coisa nova, porque coisa nova não pensa."

Ainda assim, foi um trabalho na Globo que lhe rendeu a alcunha que o marcou. Mas o ator não quer se limitar ao pasteleiro, como indica o próprio nome de seu livro, Marcos Oliveira - Muito Além do Beiçola. Apesar dos problemas de saúde e das dificuldades financeiras, o objetivo do artista é seguir atuando.

Enquanto isso, ele precisa pagar as contas. E não tem vergonha de pedir ajuda. "Preciso sobreviver. Ajuda quem quer; quem não quiser, pode meter o pau. Na realidade, toda a minha vida foi essa luta para sobreviver naquilo que eu sei fazer. Se eu fosse um ator ruim, já teria desistido há muito tempo".

Muito Além do Beiçola também vem nessa esteira. Ao contar histórias curiosas de seu passado, o ator pretende juntar mais um dinheirinho para pagar suas dívidas e projetar mais trabalhos. Nessa entrevista exclusiva, ele relembra o início da carreira, descreve seus problemas financeiros e dá atualizações sobre seu estado de saúde.

Notícias da TV - Queria que você me contasse um pouco sobre a sua biografia. De onde veio a ideia de fazer esse projeto? E por quê?
Marcos Oliveira -
São 50 anos de carreira, e eu acho que não é pouca coisa. Tenho muitas histórias e muitas coisas bonitas que consegui captar durante a minha vida. Para mim, é um orgulho ter nas minhas mãos, depois desse tempo todo, o meu filho: Marcos Oliveira - Muito Além do Beiçola. A maioria das pessoas me conhece só como o Beiçola, mas o Beiçola só existiu porque eu vim de muito tempo fazendo teatro. Teatro amador, teatro mental, teatro engajado, teatro político... Eu vim da época da Ditadura Militar [1964-1985], então eu tenho um caminhão de conhecimentos por meio da prática. 

É um prazer estar narrando a existência da minha vida, aquilo que eu acredito. É o meu trabalho. Vou vender [o livro] e lutar para ter condições de ser sempre um intérprete.

Quando e como o senhor decidiu se tornar um ator, afinal?
Eu fui totalmente contra tudo e todos, entendeu? Porque eu comecei com o teatro muito criança. Eu sempre tinha essa vontade de me apresentar para as pessoas, gostava de contar histórias, ouvir histórias. Tenho momentos muito vivos na minha cabeça da minha infância, em que ia assistir às peças de circo... O Lavrador, O Céu, Dois Corações... Eu conheço o Silvio Santos quando ele ia nas caravanas dos circos, então é toda uma relação de experiências que eu tenho guardadas dentro de mim.

Até hoje, eu tenho essa vontade de estar em cena. Mesmo se for só [para falar:] 'Aqui está sua carta'. Acho isso importante. Não fico muito preocupado com o tamanho do papel, fico preocupado em fazê-lo.

Como foi revisitar essas memórias para escrever o livro?
Foi emocionante e, ao mesmo tempo, triste, porque é um tempo que foi, né? E era muito gostoso. Aquela coisa de batalhar para fazer as coisas acontecerem, estudar bastante... Era maravilhoso. Hoje em dia, as pessoas não entendem muito o que era estudar três, seis meses para uma peça.. Hoje não é assim. Você decora e sai repetindo, que nem um papagaio. É objetivo.

Antigamente tinha entrelinhas, tinha coisas que a gente procurava saber como interpretar. Hoje, você faz e pronto. Melodrama, comédia... É tudo matematicamente produzido. Não tem muita sensibilidade.

Qual a sua opinião sobre essa mudança nas produções?
É a evolução. Claro que dentro de um trabalho mais específico e mais profundo, com uma outra vivência, a coisa te pega. Quem está na plateia sente mais forte. Enquanto que, no vídeo.... É mais um vídeo, é mais uma série, é mais uma novela. É mais um preenchimento do nosso vazio humano. A gente quer se divertir e recebe qualquer bananada para isso.

No ano passado, o senhor disse, numa entrevista cedida ao SBT, que "não quer ser só pasteleiro". Como avalia o Beiçola dentro da sua carreira?
Em questão de divulgação, foi maravilhoso. Mas... Para entrar e fazer sucesso é mais ou menos fácil. Agora, continuar nele... Bicho, é um caixão de defunto que é bravo. O que foi legal em Poliana Moça (2022) é que eu tive a possibilidade de fazer outra coisa. Eu agradeço pela chance, ainda mais por causa da minha situação física [ele usava uma sonda na uretra à época, além de uma bolsa de colostomia, que ainda mantém].

divulgação/sbt

Marcos Oliveira como Romeu em Poliana Moça (2022)

Marcos Oliveira em Poliana Moça (2022)

Inclusive, sua "situação física" e sua dificuldade para arranjar trabalhos por causa dela foram questões latentes nos últimos anos. O senhor dividiu bastante suas dificuldades financeiras nas redes sociais. A biografia o ajudará na recuperação?
Eu espero que sim, mas não é uma grande coisa. Pelo menos me ajuda a viver com dignidade... Mas o que eu quero, por meio desse livro, é fazer outros trabalhos. Para eu tentar pagar as contas que um golpista me deixou. Ele me roubou R$ 350 mil, e até agora a Justiça não fez nada. Eu não posso falar muito sobre o assunto, mas eu quero voltar a trabalhar e divulgar meu livro.

E como o senhor acabou na TV? 
Eu fazia participações. Você não vai assumir logo de cara um papel grande, aí você começa a fazer uns bicos ali, outros acolá. Eu fiz muita participação no Você Decide [1992-2000] e no Zorra Total [1999-2015], e isso me ajudou a sobreviver e a entender melhor. Aí comecei a fazer a participação em A Grande Família [2001-2014]. Fiquei dois anos como participação especial, né? Só fui ser contratado depois, e aí fiquei mais 11 anos. 

Mas estar na TV era uma meta ou foi uma casualidade?
Ah, era muito difícil pensar em TV com a minha cara, entendeu? Eu não me acho uma pessoa enquadrada dentro dos moldes televisivos. Eu não ia ser galã. Sou um bom coadjuvante. Ser protagonista não era para o meu caminhãozinho.

E é tanta gente te analisando e não falando merda nenhuma, entendeu? É uma coisa meio desajustada. Você vira mais um dentro do... Do pote de merda. Eu gostaria muito [de trabalhar na TV], salvaria minha vida. Mas não querem saber dos velhos. Querem coisa nova, porque coisa nova não pensa.

Mesmo os atores que tiveram uma carreira longínqua na TV, até dentro desse estereotipo de mocinha e galã, como a Marieta Severo e o Osmar Prado, também foram dispensados pela Globo. É uma tendência não ter mais contrato fixo com as emissoras... 
Sim! Eu até quero escrever no futuro sobre quando "as folhas murcham". E não só no caso do ator, no caso do brasileiro em geral. A gente tem uma qualidade de vida até um determinado tempo. Depois, bicho... Se vira. E tem a porra da aposentadoria, que significa que você não tem mais capacidade de mais nada. Eu tenho capacidade de trabalhar, eu quero trabalhar. 

A sociedade joga você para baixo, para você morrer logo. Tipo "você já foi, porque tem 500 mil pessoas novas querendo vir e acontecer". Não tenho nada contra, também tem espaço. Tem espaço para todo o mundo.

O senhor mencionou brevemente que sofreu um golpe. Uma dúvida recorrente de seus seguidores é se a Justiça foi envolvida nisso. Pelo que entendi, sim, certo?
Sim, mas não chega a nada. Minha advogada já fez boletim de ocorrência, já fez tudo, mas ninguém pega o cara. Eu não fui a primeira pessoa, fui a quarta pessoa. E ele está com todo o dinheiro que me deram lá no começo [quando o ator começou a gravar vídeos pedindo ajuda financeira via doação para seus fãs, em 2021]. E ele ainda fez empréstimo no banco com meu nome e com meus cartões. 

Eu estava deitado numa cama, com duas sondas, e ele me limpou totalmente. Comprou carro, comprou casa na região dos Lagos [no Rio de Janeiro]... E eu não sei mais o que fazer. Eu sei que tenho que pagar essa dívida, de um jeito ou de outro. É uma lamentação. Por isso é que eu chego e peço dinheiro para as pessoas mesmo, não tenho vergonha. As pessoas acham que é antiético, mas eu preciso comer, preciso comprar remédio. Eu estou na batalha. Tem vezes que tem trabalho, tem vezes que não tem...

Fiz uma temporada de um espetáculo e consegui um dinheirinho até maio. Depois, pedi dinheiro para comer, mas não consegui pagar o aluguel. Agora, estou pagando o aluguel atrasado. Tem todo um encadeamento de despesas. Por isso fico correndo atrás de trabalho, para ver se consigo reestabelecer minha vida. Eu ainda estou vivo. Se um dia não der mais para decorar peça, e eu não conseguir andar, falar, ai me coloquem num quartinho e arranjem alguém para dar comida. Antes disso, tenho muita coisa para fazer. 

Quando e como o senhor tomou a decisão de pedir ajuda aos seus fãs?
Eu preciso sobreviver. Ajuda quem quer; quem não quiser, pode meter o pau. Na realidade, toda a minha vida foi essa luta de sobreviver naquilo que eu sei fazer. Se eu fosse um ator ruim, já teria desistido há muito tempo. Mas sei interpretar, é o que sei fazer, e é por isso que cago e ando para os criticos.

Tem muita gente da classe [artística] que fala: 'Ah, mas olha que nível você chegou'. É meu nível, entendeu? Mas nunca coloquei isso em cena. Meu trabalho sempre foi digno. Não estou aqui para agradar a gregos e troianos. Estou aqui para agradar ao meu trabalho. Não tenho mais idade para fazer sala. Só quero minha dignidade. Quem gostar de mim, gosta. Se não, a vida prossegue. 

lourival ribeiro/sbt

Marcos Oliveira em podcast do SBT no ano passado

Marcos Oliveira em podcast do SBT em 2022

Durante a entrevista, o senhor mencionou as sondas que teve na bexiga e a bolsa de colostomia. Como vai sua saúde nos últimos tempos?
Em investigação. Eu não posso fechar a colostomia enquanto não tiver certeza de que não vai ter uma comunicação da urina com as fezes. Tem que esperar meu urologista e o proctologista. Mas isso é um veredicto que só terei daqui a dois ou três meses. Enquanto isso, estou de bolsinha, tranquilo. Se tiver alguma infecção, eu vou até o posto de saúde e tomo um antibiótico.

Inclusive, já vi internautas questionando o fato de o senhor pedir dinheiro para tratamentos, sendo que temos o Sistema Básico de Saúde (SUS). Pelo que entendi, o senhor frequenta as Unidades Básicas de Saúde, certo?
Sim, eu frequento os pontos de saúde e também tenho um plano pequenininho de saúde. Uma amiga paga para mim. Agora, estou em período de carência, porque o plano ficou muito caro e minha amiga transferiu para outro. Consigo fazer exames e aplicação de remédios, mas internação, não. 

Voltando à sua carreira: como foi o período pós-A Grande Família? A divulgação não te trouxe trabalhos?
Não teve muita coisa, não. Quem me chamava era quem já conhecia meu trabalho como ator. Tem lugares que eu chegava e as pessoas pensavam que eu ia fazer show... E não, meu querido, meu negócio é texto, é saber quem está escrevendo, quem está dirigindo... Não tenho nada contra, cada um tem o seu caminho, mas o meu caminho não é botar peruca, fazer maquiagem...

O senhor fará uma participação na Bienal do Livro, né? Como está a expectativa para esse momento?
É a primeira vez que eu vou mostrar uma parte minha. Tive que relembrar um monte de coisa da minha vida, então é uma coisa que, nossa... Dá medo, porque eu vivi muita coisa, em períodos muito difíceis. E esses últimos anos, depois da pandemia... Foram muito difíceis. A morte seria mais fácil. Porque era muito difícil viver num país que não acredita na ciência, que fica preso a essas merdas de costumes, e o ser humano é muito maior que isso. 

Eu espero que nunca mais se tenha esse tipo de mentalidade. Apesar que ainda tem muito. Mas rezo para que as peças abram um pouco a cabeça e vejam que não é por aí. Tem muita coisa importante na Medicina, na pesquisa, na educação, na saúde... As pessoas passam fome. Eu sei o que é isso. Eu passei fome, sabe? E olha que sou diabético, não é tudo que posso comer. É muita gente jogada na rua. Você não tem mais liberdade de andar na rua porque tem muita gente necessitada te pedindo.

E aí vem gente defender arma, defender não sei o quê? Que coisa escrota. Eu tenho que comer, o outro tem que ter remédio. Temos que trabalhar, temos que produzir. Não ficar nessa coisa de luxo. 'Ah, a bolsa que eu comprei foi R$ 20 mil'. 'Ah, a menininha que botou peitinho'. Sabe? Vai ser prostituta, que é muito mais honesto. 

E como o senhor se mantém com a cabeça aberta?
Porque eu tenho tesão na vida, filha. Pode ser que o meu peru não levante, mas o sexo na minha cabeça está a 300 km/h. Eu estou vivo. Eu tenho contato, só que não tenho mais estímulo. Não adianta ficar naquelas de 'aí, eu já tive, hoje eu não tenho'. Foda-se. A gente vai de imaginário.

Outro dia eu vi um vídeo de um velhinho dando um amasso em uma velha... Que coisa linda, meu Deus. Porque estamos vivos, temos desejos. Claro que não vamos fazer o Cirque du Soleil na cama, mas vamos dar uma esfregada ali mesmo, com as coisas murchas, mas vai ter uma sensação de vida, de dois corpos, de tesão, entendeu? Mesmo que o peru não funcione, que a perereca não tenha mais o brilho de antes, não quero ter amargura, bicho. Quero viver.


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