QUEREM ACABAR COMIGO
MAURICIO FIDALGO/TV GLOBO
Roberto Carlos em especial de fim de ano na Globo; cantor completará 80 anos na segunda-feira (19)
Amado pelo público que o transformou em um dos artistas de maior sucesso do país, Roberto Carlos demorou a conquistar a crítica especializada, que o detonava no início da carreira. Ao longo do tempo, o "rei", que completa 80 anos nesta segunda-feira (19), já foi chamado de "debiloide" e "acomodado" por analistas, conforme mostra o novo livro Querem Acabar Comigo.
A obra é assinada pelo pesquisador Tito Guedes, que garimpou centenas de resenhas publicadas sobre o artista em grandes veículos, como Folha de S.Paulo, O Globo, Jornal do Brasil, O Estado de S. Paulo, Manchete e Veja, desde os anos 1960 até a última década.
Lançado em 1959 por Carlos Imperial (1935-1992), Roberto Carlos se tornou um fenômeno popular quando foi contratado em 1965 para comandar o programa Jovem Guarda (1965-1968), da Record, ao lado de Erasmo Carlos e Wanderléa.
"Foi justamente nesse período, com o início do programa e o sucesso da música Quero Que Vá Tudo Pro Inferno, que a crítica especializada começou a prestar atenção em Roberto Carlos. Entre 1965 e 1969, essa relação alternou altos e baixos, em função das mudanças operadas pelo próprio cantor em sua carreira e pela forma com que era visto por outros personagens de relevância na música brasileira", aponta o livro.
Querem Acabar Comigo, título da obra de Tito Guedes, foi uma música lançada por Roberto Carlos em 1966, que dizia "Querem acabar comigo / Nem eu mesmo sei porquê / Enquanto eu tiver você aqui / Ninguém poderá me destruir".
Pouco antes de o artista lançar essa canção, "em 18 de março de 1965, o colunista Sérgio Augusto, em texto publicado no Jornal do Brasil, já definia Roberto como 'um debiloide de pouco mais de 20 anos que se diz homem mau e ficou conhecido graças a um barulhento calhambeque'".
DIVULGAÇÃO/RECORD
Roberto Carlos no programa Jovem Guarda
O livro mostra que, em momentos diferentes, Roberto já foi chamado de oportunista, acomodado, comercial, repetitivo, açucarado, redundante, ultrapassado, insignificante, apelativo e ruim, o que foi mudando com o passar do tempo e com a "bênção" de nomes da música considerada mais "sofisticada".
Os raros momentos de trégua entre o cantor e a crítica no século passado se deram quando medalhões da MPB o abraçaram --na Tropicália, com Caetano Veloso à frente; com o LP de Nara Leão com repertório todo do compositor; ou quando Maria Bethânia gravou o álbum As Canções que Você Fez pra Mim, em 1993, um aplaudido tributo ao "rei".
A mesma crítica que no início da carreira de Roberto detonou o "iê-iê-iê" e seus primeiros sucessos românticos, décadas depois exaltaria canções dessa fase. Talentoso, cantor excepcional, grande compositor, mestre, receptor de mensagens ocultas, decifrador do inconsciente coletivo e genial foram alguns dos bons adjetivos que ele conseguiu ganhar dos especialistas.
Em 1988, em entrevista para a revista Bizz, Roberto Carlos falou sobre esse "preconceito" que os amantes da bossa nova tiveram com a Jovem Guarda: "Era muito difícil que alguém da bossa topasse cantar um iê-iê-iê, embora nós sempre estivéssemos dispostos a cantar uma bossa".
"Sabíamos dessa sofisticação, mas sabíamos também que nosso trabalho tinha uma identificação, um diálogo grande com o povo, que era uma música fácil de cantar, de decorar. Esse preconceito eu só posso explicar por esse lado. De repente é isso mesmo, a gente acha estranho uma coisa nova que aparece", comentou o cantor na época.
Ao Notícias da TV, o autor Tito Guedes conta que Roberto estabeleceu uma relação muito própria com a crítica musical. Isso ajudou o pesquisador, que trabalha no Instituto Memória Musical Brasileira, a pensar sobre vários fenômenos da comunicação e da música no Brasil.
"Além de bom cantor e compositor, Roberto é também um excelente comunicador. Ele sabe como ninguém se comunicar e tocar diretamente o público ao qual se dirige. Quando estreou seu especial na Globo, em 1974, ele encontrou mais um canal de comunicação com seu público, o que fortaleceu e aprofundou a relação de quase intimidade entre ele e seus fãs", diz Guedes.
"Essa proximidade certamente influenciou na fidelidade de seus admiradores ao longo dos anos. Afinal, música e televisão são duas paixões nacionais, e Roberto soube transitar muito bem por esses dois universos", defende o autor.
Mas como Roberto Carlos se tornou tão forte comercialmente e popular mesmo sendo odiado pela crítica? "A crítica musical tem uma importância fundamental para dar legitimidade ou prestígio para os artistas. Mas influencia muito pouco na vendagem de discos ou na consagração popular. Quem lê crítica especializada não é a maioria dos consumidores de música, muito pelo contrário. Os fãs do Roberto não precisavam da chancela desses críticos, a eles só importava a música de seu ídolo", explica Tito Guedes.
O livro Querem Acabar Comigo - Da Jovem Guarda ao Trono, a Trajetória de Roberto Carlos na Visão da Crítica Musical tem 144 páginas e foi publicado pela editora Máquina de Livros neste mês. A obra é encontrada por R$ 42 na versão impressa e R$ 28,90 em e-book.
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