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MEMÓRIA DA TV

Em 1987, entrevista de Hebe Camargo quase tirou o SBT do ar durante 30 dias

Divulgação/SBT

A apresentadora Hebe Camargo, morta em 2012: entrevista controversa quase rendeu suspensão ao SBT - Divulgação/SBT

A apresentadora Hebe Camargo, morta em 2012: entrevista controversa quase rendeu suspensão ao SBT

THELL DE CASTRO

Publicado em 8/4/2018 - 7h59

O programa Hebe de 17 fevereiro de 1987 quase tirou o SBT do ar. Naquele dia, Hebe Camargo (1929-2012) conversou com o jornalista Gilberto Di Pierro sobre o trabalho da Assembleia Nacional Constituinte, que preparava a nova Constituição, promulgada em 1988. Críticas de Giba Um, como é mais conhecido, despertaram a ira dos deputados, que ameaçaram suspender a emissora durante até 30 dias.

De acordo com o Jornal do Brasil de 19 de fevereiro daquele ano, durante a conversa na TV, o jornalista chamou os parlamentares de "malandros, patifes, corja de safados" e os acusou de "só trabalharem em beneficio próprio".

Por sugestão do então deputado Plínio de Arruda Sampaio (1930-2014), na época filiado ao PT, Ulysses Guimarães (1916-1992), do PMDB, então presidente da Constituinte, estudou convocar uma cadeia nacional de rádio e televisão de 15 minutos para expor à nação os trabalhos desenvolvidos pela casa. A proposta também recebeu o apoio da deputada Sandra Cavalcanti, em nome do PFL.

"Entendi-me também com o procurador-geral da República, Sepúlveda Pertence, e, se for necessário, providências serão tomadas no sentido do resguardo, da defesa, mais do que dos constituintes, da democracia deste país", disse Guimarães.

"A instituição foi ultrajada, talvez por leviandade, o que é inadmissível em um programa, principalmente com os meios de comunicação que atingem áreas ponderáveis ou muito grandes da população. O que é pior, no intuito de desmoralizar o Congresso Nacional na sua expressão mais alta, a Assembleia Nacional Constituinte, o que significa desmoralizar a própria democracia", completou.

O discurso de Ulysses Guimarães foi aplaudido pelos deputados, que "se sucederam na tribuna criticando o programa e o que chamaram de campanha na imprensa contra a Constituinte", segundo o jornal.

O Dentel (Departamento Nacional de Telecomunicações), órgão que fiscalizava os meios de comunicação e que foi extinto em 1990, abriu um inquérito e requisitou a fita do programa. Por ter exibido a controversa entrevista, o SBT poderia ser enquadrado em dois artigos do Código Brasileiro de Comunicações, o 52 e o 53.

"No 53, letra I, está prevista pena que vai de advertência à suspensão por até 30 dias nos casos de transmissão que seja considerada calúnia, difamação ou injúria aos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário ou aos seus respectivos membros", explicou a reportagem do Jornal do Brasil.

O então diretor regional do SBT em Brasília, Carlos Henrique de Almeida Santos, esteve no Congresso para se explicar e tentar atenuar a situação. "A empresa não pode se responsabilizar pelo que diz um entrevistado durante um programa ao vivo, mas já diligenciou no sentido de não se repetirem situações como essa", declarou.

Dois meses depois, o jornalista assumiria o cargo de subchefe da Casa Civil do governo Sarney e, posteriormente, também foi porta-voz da Presidência.

"Ele argumentou que o SBT é a única rede de televisão que mobiliza 42 emissoras semanalmente para levar ao ar um programa de debate dos temas constitucionais. Chama-se Você É Constituinte e existe há mais de um ano", completou.

Outro lado
De acordo com o jornal O Estado de S.Paulo de 19 de fevereiro de 1987, o então superintendente do SBT, Luciano Callegari, confirmou ter recebido uma carta do responsável pelo Dentel em São Paulo, Marcelo Aparecido Coutinho da Silva, pedindo a gravação do programa.

"Enquanto providenciava a cópia _à qual a imprensa não teve acesso_, Callegari encaminhou dois cassetes de vídeo para o Ministério das Comunicações, para provar que não houve ofensa grave em hipótese alguma, nada que justifique a apreensão", explicou o Estadão.

Também de acordo com a publicação, a própria apresentadora ficou surpresa com a informação de que poderia ser processada pelas ofensas contra deputados e senadores feitas no programa de sua responsabilidade.

"O único momento em que surgiram críticas ao governo, pelo que lembrou Hebe, foi durante um debate entre várias pessoas sobre o sistema previdenciário. Uma delas, o jornalista Giba Um, pelo que se lembra, disse ter apenas repetido o que escreve em sua coluna no jornal Folha da Tarde _segundo ele, em defesa de aposentados e pensionistas do INPS."

"Giba Um lembra-se também de ter falado da intenção dos deputados da legislatura passada de aumentar seus vencimentos, usando esses termos: 'E essa corja ainda teve o desplante de arranjar 25% a mais em seus vencimentos para garantir a aposentadoria. Existe o direito ao livre pensamento no país; caso contrário temos de volta a censura', disse o jornalista", destacou o Estadão.

O jornalista Gilberto Di Pierro, o Giba Um, durante entrevista à TVFap em 2015 (Reprodução/YouTube)

Influente colunista, principalmente entre os anos 1970 e 1980, Giba Um foi casado com Pepita Rodrigues, jurado de programas de Silvio Santos e Flávio Cavalcanti e é considerado o "pai da fofoca" pela Associação dos Pioneiros, Profissionais e Incentivadores da Televisão Brasileira (Pró-TV), por ter revolucionado o gênero. Há alguns anos, publica notas em site próprio.

O programa Hebe continuou normalmente no ar e foi exibido pelo SBT até 31 de março de 2010. A apresentadora morreu em 29 de setembro de 2012, aos 83 anos, dois dias depois de anunciar que voltaria ao canal após uma rápida passagem pela RedeTV!.


THELL DE CASTRO é jornalista, editor do site TV História e autor do livro Dicionário da Televisão Brasileira. Siga no Twitter: @thelldecastro

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