E AGORA?
Divulgação/Televisa
Roberto Gómez Bolaños em cenas como Chaves e Chapolin Colorado: personagens vão crescer
Desde a última sexta-feira (31), o SBT não pode mais exibir o mexicano Chaves, curinga da emissora há 34 anos. Mas os personagens criados por Roberto Gómez Bolaños (1929-2014) não ficarão para sempre guardados nos cofres da Televisa. A ideia é que eles façam parte de um grande universo midiático, como ocorre com os super-heróis da Marvel.
No ano passado, durante a Mipcom, maior feira de televisão do mundo, o filho de Bolaños, Roberto Gómez Fernández, anunciou seus planos para o UMC (Universo de Mídia do Chespirito), que reunirá vários projetos diferentes sobre o ator mexicano e seus personagens. De uma cinebiografia sobre a vida do comediante a animações e novas séries baseadas em suas criações, tudo estaria ligado no UMC.
Afinal de contas, ao longo de sua vida, Chespirito (apelido carinhoso de Bolaños) criou mais de cem personagens, todos prontos para serem explorados na TV, no cinema, em quadrinhos e até jogos de videogame. Uma galinha dos ovos de ouro, na qual qualquer conglomerado de mídia gostaria de colocar as mãos.
Mas o que esse projeto tem a ver com a retirada dos episódios clássicos de Chaves da emissora de Silvio Santos (e do Multishow, do Prime Video e de todos os outros canais que exibiam a série na América Latina também)? Aí começa a politicagem.
O tal UMC é fruto de uma parceria entre o Grupo Chespirito (empresa de Fernández que administra o espólio de Bolaños) e a THR3 Media Group, produtora de TV e cinema que tem entre seus fundadores Bruce Boren, ex-vice-presidente da Televisa. E a rede mexicana que exibiu e distribuiu Chaves durante décadas? Foi totalmente excluída dessa parceria. E a razão não é nada amigável.
Como Chaves e Chapolin foram gravados pela Televisa no passado, a rede manteve os direitos sobre as fitas dos episódios antigos, que ela distribuía pelos vários canais exibidores das atrações mexicanas até o fim de julho. Em troca, ela pagava um valor para o Grupo Chespirito, responsável por toda a propriedade intelectual de Bolaños (personagens criados por ele e os roteiros dos episódios, entre outras coisas).
Evidentemente, o Grupo Chespirito pode lucrar muito mais com o universo midiático que exclui a Televisa. Mas ele sabe que o principal produto de seu portfólio é aquele que está com a rede mexicana --os episódios das séries. A especulação no país latino é que Fernández pretende aproveitar os scripts de capítulos antigos, que são seus, e regravá-los com um novo elenco. Ou seja, fazer um remake de Chaves.
Não é preciso ter a astúcia do Chapolin para entender que, para o Grupo Chespirito, deixou de ser interessante que a Televisa continue distribuindo os episódios antigos pela América Latina enquanto eles planejam essa nova versão.
Fernández decidiu, então, endurecer as negociações com a rede mexicana e pediu um aumento no valor pago pelos direitos de exibição. As duas partes não conseguiram chegar a um acordo --há dúvidas se o filho de Bolaños pretendia mesmo renovar essa parceria.
Sem trato, todas as fitas antigas vão juntar poeira no cofre da Televisa, e Fernández e a THR3 ficam com o caminho livre para gravar novos episódios, com um novo elenco, mais atual e conectado com os dias de hoje --afinal, conquistar um público jovem, que não tem a ligação nostálgica com Chaves e Chapolin, será essencial.
O Grupo Chespirito ainda terá a liberdade de negociar esses novos produtos com quem quiser. Numa reviravolta da vida, poderia até mesmo licenciá-los para a Televisa --que já conta com uma base de fãs dos personagens entre seu público.
Mas não seria surpresa para ninguém se uma gigante do streaming como a Netflix comprasse os direitos para exibir essa versão de Chaves para século 21. A plataforma já lançou, por exemplo, um remake do anime Cavaleiros do Zodíaco, uma série baseada no filme clássico O Cristal Encantado (1983) e estreia em setembro uma adaptação gringa para a série brasileira Julie e os Fantasmas.
A pergunta que não quer calar, porém, é outra: será que os fãs de Chaves e Chapolin, que promovem chiadeira e panelaço quando um dublador da série original é trocado, aceitariam uma nova versão dos programas? Ou será que, sem querer querendo, Fernández estará dando um grande tiro no pé ao mexer tanto no legado do pai?
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