Pato Fu usa 'tédio criativo' para transformar disco de 2010 em série infantil de 2023

Expoente do pop rock mineiro, o Pato Fu completa neste ano três décadas de seu primeiro disco, Rotomusic de Liquidificapum (1993). Como ocorre com toda efeméride, é natural que a banda tenha olhado o passado para pensar no futuro. E um de seus projetos mais disruptivos, o álbum Música de Brinquedo (2010), serviu de base para a primeira incursão de Fernanda Takai e companhia em uma série de TV.

Também chamada de Música de Brinquedo, a atração estreia no canal Nick Jr. neste sábado (5) e mostra a banda tentando gravar uma canção por episódio (usando instrumentos de brinquedo) em um estúdio habitado por monstros cheios de manias. É a deixa para que os bastidores do trabalho sejam tomados por piadas, intrigas divertidas e muita confusão.

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Em conversa exclusiva com o Notícias da TV, Fernanda conta que Música de Brinquedo (a série) surgiu enquanto a banda fazia Música de Brinquedo (a turnê) e percorria o país em um ônibus com o Giramundo, popular grupo de teatro de bonecos originário de Belo Horizonte. É que Música de Brinquedo (o álbum) tinha sido gravado com crianças ajudando a tocar as canções.

"O Giramundo entrou para o projeto porque a gente não queria levar as crianças que estavam no disco para a estrada. [Os bonecos monstros] Groco e Ziglo fizeram com que o espetáculo se transformasse numa coisa incrível, que a gente nunca tinha feito. E, ainda na estrada, a gente já ficava pensando: 'Será que dá para crescer isso? Será que a gente dá mais falas [para os bonecos]? Será que tem outros números além das músicas?'", conta a vocalista.

"Acho que foi meio inevitável também, no decorrer do trabalho, a gente começar a fazer alguns questionamentos. Quem são esses bonecos? Para onde eles vão? O que eles pensam?", continua Ulisses Tavares, diretor do Giramundo. "Volta e meia um improviso que nasceu nos primeiros momentos da turnê ia se desenvolvendo e se tornou uma cena no show, e aí as gags iam aparecendo, e as personalidades iam aflorando e tal. As coisas foram crescendo muito no convívio mesmo."

"Muita coisa aconteceu no tédio do transporte durante a turnê também, sabe?", completa Marcos Malafaia, diretor-presidente do Giramundo. "Aquela coisa de ficar no ônibus, sem ter muito o que fazer, e a gente ficava viajando [nas ideias] enquanto estava literalmente viajando (risos). Eram momentos de muita risada, de um sentar na beirada da poltrona do outro e imaginava histórias que ainda poderiam ser contadas."

"E desses momentos de tédio, acho que a gente inaugurou o 'tédio criativo' (risos)", brinca Fernanda. "Ficou, desde aquela época, essa vontade guardada de tentar fazer um projeto audiovisual em que a gente tivesse mais espaço para a vida dos monstros e para essa coisa tão divertida que é o encontro dos seres humanos, do mundo real, com esse mundo monstro tão maluco, onde tudo pode acontecer."

John Ulhoa e Fernanda fazem musical com monstros

Música de Brinquedo (a série) é quase um spin-off de Música de Brinquedo (a turnê). Enquanto os shows deixavam os humanos da banda no foco, com os bonecos como coadjuvantes da narrativa, na TV são os monstros que assumem o protagonismo, e os músicos servem de escada para que as histórias insanas de cada episódio se desenvolvam.

Mas os manipuladores do Giramundo precisaram encarar muitos desafios para gravar a série. Inclusive, de resistência física --para que apenas os bonecos apareçam em cena, os atores fazem uma espécie de contorcionismo e se esgueiram por espaços pouco confortáveis. Tudo pela arte.

"A experiência de gravar no set é uma mistura de faquir com locutor de radionovela. Sua postura corporal fica todo torta, você não se encaixa na posição tradicional de manipulação dos bonecos. Às vezes, o corpo está olhando o monitor, a mão está virada para o outro ator, o pé está encaixado numa vaguinha do outro marionetista. E você tem que andar com um pezinho meio de centopeia, se deslocando num carrinho", conta Malafaia.  

"É muito curioso e paradoxal, porque você olha à sua volta e é tudo muito confuso, mas no enquadramento da câmera é extremamente limpo e correto (risos). Para o Giramundo, foi muito diferente de tudo que já fizemos, porque o nosso mundo é da boca de cena, é analógico, é estático. No vídeo, é um frame, é digital, tem corte, tem zoom, tem movimento de câmera. Os parâmetros da manipulação de bonecos são muito mais amplos", continua o diretor. "Música de Brinquedo é um divisor de águas para o nosso grupo. Nada vai ser a mesma coisa depois desse projeto, essa é a sensação."

Pato Fu Só para Baixinhos?

Por entrar na programação do Nick Jr., Música de Brinquedo é uma série voltada para a primeira infância (até os cinco anos), público-alvo do canal. Mas isso não significa que o Pato Fu não tenha pensado nos fãs mais velhos da banda na hora de desenvolver a atração --roteirizada pelo guitarrista John Ulhoa em parceria com Fernando Gomes, também diretor do programa.

"Essa é a chave do Música de Brinquedo, né? Fazer uma coisa que, em primeiro lugar, a gente mesmo se diverte inventando as histórias. E mostrar isso para as pessoas sabendo que é um produto que vai para todas as idades", explica Fernanda. "Muitas vezes a primeira interação da criança com o vídeo vem dos pais. Se a gente conseguir chamar a atenção dos pais para aquilo ali, que tem o Pato Fu, tem o Giramundo, tem música pop variada... Fazer o adulto pensar: 'Nossa, eu tenho que mostrar isso pro meu filho, pra minha filha'.

E a gente tenta sempre ser muito autêntico nas ideias também. Em momento nenhum deixar de ser original em um mundo que está tão previsível. Acho que o Pato Fu e o Giramundo têm em comum esse negócio de: 'Não, vamos tentar jogar aqui uma faisquinha diferente'. Tomara que dê certo.

Música de Brinquedo estreia no Nick Jr. neste sábado (5), às 12h30. Novos episódios serão exibidos semanalmente, no mesmo horário.