SEGREDOS E CRIMES
REPRODUÇÃO/NETFLIX
Jimmy Savile (1926-2011) abusou sexualmente de crianças e adultos durante cinco décadas
Jimmy Savile (1926-2011), apresentador britânico alçado à fama na década de 1960, é tema de um chocante e perturbador documentário da Netflix. Para quem nasceu no século 21 --em tempos de condenações implacáveis do tribunal da internet--, é difícil acreditar que uma figura pública passou 50 anos diante das câmeras, cometendo as piores atrocidades por trás delas, e morreu impune.
Em 29 de outubro de 2011, dois dias antes de completar 85 anos, Savile morreu em sua casa por causa de uma crise de pneumonia. Na época, os boatos em torno dos abusos sexuais, inclusive de crianças, já ganhavam força, mas uma rede de proteção poderosa formada durante mais de meio século de notoriedade impediu que ele passasse um dia sequer na cadeia.
A série documental Segredos e Crimes de Jimmy Savile é dividida em duas partes, de 79 e 91 minutos respectivamente. A primeira apresenta ao público quem é a figura excêntrica e extremamente popular que começou como DJ e se tornou membro da alta sociedade britânica.
Savile é mostrado como um personagem mítico, intrigante, com visual incomum, mas que, acima de tudo, se comunicava bem com a massa. Um de seus programas que marcaram época foi o Jim'll Fix It (ou Jimmy Consegue, como foi traduzido no documentário), no qual ele realizava sonhos de crianças que mandavam cartas para a atração.
E foi exatamente essa pecha de filantropo a responsável por fazer, não uma cortina, mas uma barricada de fumaça em torno de seus crimes. Afinal, quem duvidaria --ou seria capaz de acusar de crimes tão perversos-- um homem responsável por arrecadar uma fortuna estimada em 40 milhões de libras para a caridade?
Mais do que isso, ele dizia dedicar parte de seu tempo para trabalhar como maqueiro de um hospital, no qual tinha livre acesso aos pacientes. O local recheado de pessoas vulneráveis era um verdadeiro parque de diversões para o Savile das sombras, aquele que não era mostrado na TV.
Relatos que só se tornaram públicos após a morte do apresentador revelaram que, além do hospital Stoke Mandeville, o reformatório de meninas Duncroft também fazia as vezes de seu "abatedouro", assim como os bastidores de seus programas na BBC. O documentário mostra, por exemplo, um relato de uma vítima que ainda era adolescente quando foi convencida a fazer sexo oral no apresentador em troca de um passe livre para uma de suas atrações.
A BBC, inclusive, arquivou uma reportagem que investigava os crimes de seu ex-astro em 2011 e preferiu colocar no ar duas homenagens após a morte de Savile. A rede de TV chegou a ser investigada, mas não foi responsabilizada pelos atos criminosos ou por acobertá-los. Ela apenas reconheceu que foi uma "falha" não ter exibido o material contundente sobre os abusos sexuais.
O jornalista responsável, Meirion Jones, cedeu a reportagem para a ITV, concorrente da BBC. As acusações foram ao ar um ano após a morte de Savile, em 2012, com depoimentos de dez vítimas, e só a partir daí que os chamados "boatos" finalmente foram reconhecidos como crimes. Descobriu-se que cerca de 500 pessoas, entre cinco e 75 anos, tinham sido molestadas por Jimmy Savile em mais de meio século no Reino Unido.
Os sobreviventes nunca testemunharam seu algoz pagar pelos abusos sexuais. As únicas punições de Jimmy Savile foram póstumas, como a revogação das honrarias recebidas quando fazia parte da alta roda da sociedade, mas o estrago na vida de centenas de pessoas já estava feito.
O ato mais simbólico talvez tenha sido o de retirar a lápide luxuosa do apresentador do cemitério, na qual havia gravada a debochada frase "foi bom enquanto durou", que poderia servir tanto para a morte quanto para a derrocada em vida almejada, mas nunca vista, por suas vítimas.
Confira o trailer (em inglês) da produção:
© 2024 Notícias da TV | Proibida a reprodução
Mais lidas
Política de comentários
Este espaço visa ampliar o debate sobre o assunto abordado na notícia, democrática e respeitosamente. Não são aceitos comentários anônimos nem que firam leis e princípios éticos e morais ou que promovam atividades ilícitas ou criminosas. Assim, comentários caluniosos, difamatórios, preconceituosos, ofensivos, agressivos, que usam palavras de baixo calão, incitam a violência, exprimam discurso de ódio ou contenham links são sumariamente deletados.