CONTEXTO CABELUDO
DIVULGAÇÃO/WARNER BROS.
Michael Cera como Alan e Emerald Fennell como Midge no filme Barbie, que estreia nesta quinta
Barbie traz referências para todos os gostos, desde pilares da cultura pop até temas mais sérios como o patriarcado. Mas quem realmente conhece a história da boneca também vai se encontrar ali. Alguns bafafás que atingiram a Mattel, empresa que fabrica a Barbie, foram inseridos no filme de maneira quase imperceptível. Um exemplo é Midge, a amiga ruiva da Barbie --que virou um problemão para a empresa no início dos anos 2000.
Ela já existia desde 1963, mas foi no início do século que a Mattel decidiu apostar num diferencial de Midge para as outras amigas: ela teria uma "família feliz". Para isso, criou-se não só um filho de três anos e um marido para a ruiva, como também optou-se por deixá-la grávida. Basicamente, a barriga da boneca era removível --e, lá de dentro, saía um bebê. O sexo era mantido em segredo, para que a criança só o descobrisse quando fizesse o "parto".
Foi demais para os pais mais conservadores. Nos EUA, eles organizaram campanhas para dizer que a boneca seria uma má influência para as crianças. Matéria veiculada pela CNN e repercutida pela Folha de S.Paulo em 2002 dizia que, segundo esses pais, a boneca "promovia a gravidez na adolescência".
Os pais afirmaram que as crianças idealizam a Barbie como exemplo a ser seguido, que "muitas querem ser igual a ela", e que a Midge poderia transmitir uma "mensagem errada" para as meninas. Cynthia Illick, porta-voz da rede varejista Walmart à época, afirmou ter recebido reclamações sobre a venda da boneca grávida. Nem o fato de ela ter uma aliança no dedo acalmou os pais mais fervorosos.
"Ela se casou com Alan Sherwood em 1991. Então, sob os padrões normais, ela poderia ter um bebê", disse Carol Spencer, que foi designer da Mattel durante 35 anos, à BBC. "Barbie nunca pode ter um bebê, e ela está destinada a nunca se casar, pois isso acabaria com a situação de brincadeira."
Os números só comprovaram a histeria, e a fabricante decidiu tirar a boneca de circulação. Midge só voltaria na década seguinte, numa versão lançada para a série Barbie Life in The Dreamhouse (2012-2015). Ali, inclusive, a boneca apareceu numa versão preto e branco, remetendo ao fato de ela ser a amiga mais antiga da Barbie. A protagonista repagina seu visual e a traz para os dias modernos, mas não menciona nem por um momento a "família" dela.
No filme de Greta Gerwig, contudo, a Midge que dá as caras é justamente a grávida. Ela é interpretada por Emerald Fennell (de The Crown). Já Alan, o marido, é vivido por Michael Cera (de Juno). Inclusive, o boneco também teve algumas questões com o público mais consumidor.
Ele foi lançado em 1964 sob a alcunha de "Ken's buddy" (parceiro do Ken, em tradução livre), gíria que também era usada na época para definir casais homoafetivos. O grande chamariz do boneco ser o fato de eles poderem dividir roupas não ajudou. Pais conservadores reclamaram, e a Mattel tirou o boneco de linha --ele só voltou mais tarde, pronto para se casar com Midge. Por isso, existe apenas um Alan na Barbieland do filme.
Mas o boneco mais controverso foi o Earring Magic Ken (Ken Brincos Mágicos, em tradução livre), que foi comercializado por apenas seis semanas no início dos anos 1990. Não parecia ser nada demais. Os executivos o lançaram como a contraparte masculina da Earring Magic Barbie, com uma roupa descolada e o brinco para combinar. Mas foi só o boneco chegar nas prateleiras que o caldo entornou.
A vestimenta dele --um colete de couro roxo, uma blusa transparente e um colar enorme--, aliada ao cabelo platinado e ao brinco, fizeram os mais conservadores associarem o boneco ao estilo de homens gays no início da década. O boneco entrou para a história como o "Ken gay" e se tornou um dos mais vendidos da marca. Ainda hoje, o produto pode ser encontrado à venda na internet --o preço pode superar US$ 500 (R$ 2,3 mil). Não coincidentemente, um dos looks usados por Ryan Gosling no filme parece o do "Ken gay".
Mas, além das confusões, os fãs da Barbie podem encontrar outras referências ao universo da boneca. As roupas escolhidas por Margot Robbie nos eventos de lançamento do filme são exemplos. A atriz optou por homenagear bonecas famosas, como a The Original Barbie (1959); Barbie Solo In The Spotlight (1960); Barbie Enchanted Evening (1960); Barbie Sparking Pink (1964); Barbie Day to Night (1985) e a própria Barbie Earring Magic (1992).
A dubladora é outro exemplo nítido. Flávia Saddy, que faz a voz de Margot Robbie no Brasil, é a mesma que dublou todos os filmes de animações da Barbie entre 2001 e 2015. Dua Lipa também representa essa ligação com os longas-metragens antigos: o visual de sua Barbie é idêntico ao de Nori, uma das coadjuvantes de Barbie Fairytopia: Mermaidia (2006).
O logo da Mattel emoldura todos os personagens nos materiais de divulgação; e tudo na Barbieland aponta para um universo de crianças brincando (o chuveiro sem água; os pés em meia ponta; o voo delicado que a boneca percorre para descer de sua casa e entrar no carro), a explosão de rosa... No fim, o filme de Greta Gerwig é uma ode à nostalgia dos fãs.
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