OPERAÇÃO FLEX FOOD
DIVULGAÇÃO/HABIB'S
Reconhecida por vender esfirras baratas, a rede Habib's fez acordos para ressarcir o Fisco
Alvo de reclamações trabalhistas reveladas em reportagem do Notícias da TV na quinta-feira (25), o Habib's já esteve no centro de uma investigação por sonegação fiscal e precisou fazer acordos financeiros de até R$ 6,4 milhões com o Ministério Público para evitar processos judiciais em diferentes regiões do Brasil.
Em dezembro 2014, a rede de comida árabe foi alvo da operação Flex Food, uma ação conjunta das secretarias de Fazenda de seis Estados (Goiás, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo e Minas Gerais) com o Ministério Público.
Na ocasião, foram cumpridos mandados de busca e apreensão para apurar a utilização de notas fiscais indicando valores inferiores aos praticados nas operações (subfaturamento); falsa classificação dos produtos em notas (alíquota zero); ocultação de receitas, além do não fornecimento de documento fiscal ao consumidor.
A origem da investigação, que apontou "a existência de um grande esquema de sonegação fiscal controlado por sofisticado sistema de informática", surgiu no Rio Grande do Sul após uma das empresas franqueadas ter revelado na Justiça o esquema de fraudes.
A partir da análise das informações e documentos colhidos na empresa, compartilhados entre os Fiscos, o Ministério Público e as secretarias iniciaram uma auditoria fiscal, com lançamento dos tributos que foram sonegados. A realização da operação Flex Food foi amplamente divulgada por diferentes veículos de comunicação na época, mas pouco se falou sobre os desdobramentos da ação.
Em 2016, a secretaria da Fazenda de Goiás foi a primeira a executar uma série de autuações contra o Habib's que, negociadas no Mutirão Fiscal, geraram receitas de aproximadamente R$ 3 milhões, de acordo com o comunicado do órgão do Estado em dezembro daquele ano.
A rede de fast food tentou paralisar a investigação com bloqueio judicial do material apreendido. Em março de 2016, em entrevista ao jornalista Carlos Sambrana, Antônio Alberto Saraiva, criador do Habib's, falou sobre a Flex Food: "Ela foi declarada ilegal, foi tudo bloqueado. Não devemos nada, e o processo voltou para o início".
Mas as secretarias conseguiram liminares para prosseguir com a apuração das fraudes e costuraram acordos para o ressarcimento ao Fisco em outros Estados. Goiás, Minas Gerais e Rio Grande do Sul foram os Estados que encabeçaram as investigações e encontraram irregularidades na rede.
Em nota ao Notícias da TV, o Ministério Público de Minas Gerais explicou que "a empresa 'Principal' (Habib's, sede) fez denúncias espontâneas referentes à saída de mercadoria desacobertada de documento fiscal em relação às operações praticadas pelas empresas franqueadas, nos anos de 2013 e 2014 -- foram 36 PTAS (processos tributários administrativos)".
"Essas denúncias foram objetos de dois parcelamentos: um em 29/6/2018, no valor de R$ 3.385.861,98, em 120 parcelas; outro em 15/9/2019, no valor de R$ 3.102.440,29, em 60 parcelas. Total dessas denúncias: R$ 6.488.312,27. Os parcelamentos estão em curso e em dia. A investigação criminal foi suspensa em razão do parcelamento", justificou o órgão.
O Ministério Público do Rio Grande do Sul informou que, em 2019, houve uma autuação contra o Habib's no valor de R$ 400 mil por sonegação de impostos. A empresa também ficaria livre da acusação com o pagamento.
Com 430 lojas espalhadas pelo Brasil, a rede de comida árabe opera com franquias, mas algumas das unidades têm participação acionária das empresas de Antônio Alberto Saraiva (Alsaraiva, Século XXI e Gennius), que criou o conglomerado em 1988. O Ministério Público de São Paulo, Estado onde fica a sede do Habib's, informou que apenas colaborou nos mandados de busca e apreensão, mas não ofereceu denúncia contra a companhia.
Questionado sobre as consequências da Operação Flex Food e os acordos que foram feitos, o Habib's enviou o seguinte posicionamento: "A empresa afirma que não comenta sobre processos judiciais ou administrativos em andamento ou encerrados."
ADRIANA SPACA/NOTÍCIAS DA TV
O cozinheiro Paulo Mendes da Silva no Habib's
O Habib's virou alvo de uma ação protocolada no último dia 5 na 2ª Vara Empresarial do Fórum Central Cível de São Paulo. Nela, o empresário Marcelo de Souza, 50 anos, que foi franqueado da marca nos últimos três, pede uma indenização de R$ 1,990 milhão por descumprimento de contrato por parte de três empresas que operam a marca Habib's.
O comerciante relata que investiu R$ 2,6 milhões no restaurante de Caieiras, inaugurado em outubro de 2017. Esperava ter retorno de "32 a 48 meses", como prometido pelos franqueadores. Logo após abrir a loja, percebeu que isso nunca aconteceria se agisse de forma estritamente ética e legal.
Por meio do sistema de gestão da rede de franquias, chamado Tiger, Souza constatou que as lojas que têm participação acionária das empresas de Alberto Saraiva (Alsaraiva, Século XXI e Gennius) obtêm resultados melhores que as unidades de franqueados independentes.
Aparentemente, a maior "mágica" dos preços baixos do Habib’s sai da cartola do desrespeito à legislação trabalhista. Lojas com o mesmo número de funcionários apresentam diferenças salariais de até 71,4%, apesar de estarem sob as mesmas esferas sindicais.
Foi o que ocorreu, por exemplo, em abril do ano passado. Naquele mês, a loja próxima ao aeroporto de Congonhas, zona sul de São Paulo, gastou apenas R$ 9.351,11 com os salários de seus 30 funcionários declarados no software Tiger, o que dá um inacreditável holerite médio de R$ 311,70. No mesmo mês, o restaurante de Marcelo de Souza em Caieiras teve uma folha de R$ 32.734,62, o equivalente a R$ 1.128,78 por funcionário (eram 29 então).
Por que tanta diferença? Porque as lojas que têm participação dos donos da marca Habib's pagam salários baixíssimos, sonegam horas extras e não registram todos os funcionários, responde a ação judicial.
Há 15 anos trabalhando em unidades Habib's na Grande São Paulo, o cozinheiro Paulo Mendes da Silva, 39 anos, confirma. "Se eu tiver quatro anos de registro [na carteira] no Habib's é muito", diz. Ele foi chefe de cozinha durante cinco anos em Diadema e outros seis meses no Jabaquara sem qualquer direito trabalhista. "Tinha salário, mas não era registrado", lembra.
Não bastassem as irregularidades trabalhistas (salários inferiores ao piso, falta de registro em carteira, sonegação de horas extras) e éticas (apropriação da gorjeta), Marcelo de Souza observou que os restaurantes da família Saraiva gastam menos com insumos que eles mesmos fabricam, indicativo de uso de produtos de qualidade inferior e de concorrência desleal dentro da própria rede.
Procurada pela reportagem, a empresa afirmou que "não se manifesta sobre processo judicial em andamento envolvendo a relação entre franqueador e franqueado".
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