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Eterno príncipe

Ronnie Von critica baixaria na TV e diz como venceu doença incurável

Fotos Divulgação/TV Gazeta

O apresentador Ronnie Von no estúdio do programa Todo Seu, da Gazeta - Fotos Divulgação/TV Gazeta

O apresentador Ronnie Von no estúdio do programa Todo Seu, da Gazeta

PAULO PACHECO

Publicado em 9/7/2014 - 19h40
Atualizado em 10/7/2014 - 6h21

RESUMO: Aos 70 anos, Ronnie Von já se descolou da carreira de cantor, que o rendeu fama e dinheiro. Hoje, dedica seu tempo às suas maiores paixões: sua mulher, Cristina, carros, aviões, plantas, música e, principalmente, TV. Em entrevista, o apresentador da Gazeta diz o que jamais faria na televisão, conta detalhes de sua vaidade e revela sonhos que já desistiu de realizar por causa da idade

Ronnie Von ainda se surpreende por chegar aos 70 anos, que comemora na próxima quinta-feira (17). Após ter quase morrido em 1979 por uma polineurite plurirradicular, inflamação no sistema nervoso que provoca dores terríveis e o deixou imóvel na cama durante mais de dois meses, o apresentador não imaginou que teria saúde para ver a passagem do milênio, em 2000.

Embora ainda tenha sustos com a saúde, como quando subiu em uma goiabeira e quase quebrou vários ossos, em 2014, o apresentador passou a valorizar a vida e a ter fé depois dos piores dias de sua existência, há mais de 30 anos. "Saí do ceticismo para a credulidade quase absoluta", revela.

Aos 70, mantém o desejo de sentir-se bem e vaidoso para agradar sua mulher, Cristina _ou Kika, como costuma chamar. Para ele, a elegância vai além de uma roupa bonita. Está na atitude, por isso jamais aparesentaria programas com baixaria ou apelação, como reality shows de confinamento, desfile de travestis ou mulheres com peitos de fora.

Na Gazeta, emissora de São Paulo, o apresentador comemora dez anos à frente do programa diário Todo Seu, às 22h30, onde mesmo com pouca audiência consegue ampla repercussão em atrações de outras emissoras, como o CQC, da Band, que impulsionou a expressão "significa", dita por Ronnie a um telespectador que perguntou se o fato de desejar outro homem significava que ele era gay.

Apelidado de Pequeno Príncipe por Hebe Camargo, o cantor Ronnie Von entrou na TV na década de 1960 para ofuscar Roberto Carlos, líder da Jovem Guarda. Desde então, jamais deixou a televisão, uma de suas maiores paixões ao lado da música, da velocidade e das plantas (tem formação em Botânica). Em entrevista ao Notícias da TV, o apresentador critica a busca desenfreada por audiência na TV.

O apresentador Ronnie Von posa no estúdio do programa Todo Seu, da Gazeta

Notícias da TV - Como você avalia esses dez anos de Todo Seu?

Ronnie Von - Tenho um clichezão. Meu pai está com 97 anos. Ele me disse: “Quando você faz aquilo que você gosta, você corre o risco de não trabalhar um único dia da sua vida”. Televisão para mim é exatamente isso, essa coisa prazerosa. Eu já fiz o programa com pneumonia, problemas emocionais muito sérios, problemas comerciais indescritíveis, o que você puder imaginar. Quando acende a luz [do estúdio], parece que eu fico absolutamente alienado do meu próprio cotidiano ou tento sublimar esse cotidiano. Como eu não me drogo, cheguei à conclusão de que o meu ópio é a televisão e aqui eu me sinto confortável emocionalmente.

E a Gazeta me proporcionou isso. Eu não tenho necessidade de um diretor me impor desfile de travesti, pornografia, escatologia, peito de fora, isso não precisa. Comecei a ficar um pouco desanimado porque as pessoas só pensam em audiência. Não que a casa aqui deixe de pensar, pelo contrário, é como se tem como aferir se as pessoas estão assistindo ou não a você, e trabalhar com comunicação significa falar para um número maior de pessoas possível. Eu fico vendo essa barbárie, a pornografia, a escatologia, a estupidez, a bobagem ser veiculada na televisão o tempo todo. É a mesmice. Antigamente, eu sabia, pela programação, onde eu estava. Hoje é tudo igual e tudo ruim, nivelado para baixo.

Notícias da TV - O programa está terminando mais cedo, às 23h30. Como foi esta mudança?

Ronnie Von - Inicialmente, eu fiquei muito preocupado, porque tinha mais tempo para uma pauta que às vezes fica capenga. Eu sinto que está capenga, preciso de mais espaço e não tenho. O Márcio [Tavolari, diretor do Todo Seu] fica no ponto: ‘Corta, corta! Chega!’. E é muito difícil, as pessoas voltam porque você não conseguiu cumprir a pauta como queria, fica muita coisa no ar.

Notícias da TV - Qual é o seu envolvimento com o conteúdo do programa?

Ronnie Von - Nenhum. Vou explicar a você por quê. Todos me conhecem, porque todos sabem aquilo que eu gostaria de dizer ou aquilo que eu gostaria que fosse dito. O Márcio me conhece, viramos amigos. A produção é jovem, considero todos filhos. Então eles sabem o meu gosto pessoal, sabem do que eu gosto e do que eu não gosto. Muitas vezes até se enganam. ‘O Ronnie não gosta de risoto’, não sei quem falou isso (risos). Adoro risoto. ‘Não gosta de sorvete’. Amo sorvete.

Notícias da TV - O que jamais teria no seu programa?

Ronnie Von - Pornografia, peito de fora, bobagem, enjaulamento de pessoas, isso não teria nunca aqui. Discussões histéricas, isso é constrangedor, a vida não é isso. Eu não tenho talento para apresentar isso. Tenho pouquíssimos amigos na área, mas tenho um [Fausto Silva] que, inclusive, é uma pessoa de primeiríssima ordem, mas que fez uma grande bobagem uma vez, um negócio de sushi não sei o quê [erótico], que as pessoas iam pegar o sushi no corpo de uma mulher nua. Ele se danou ali, porque ele foi nessa história da audiência fácil. Ele não tem talento para fazer uma barbaridade daquela.

Notícias da TV - Por isso você continua na Gazeta, por não ter essa pressão por audiência e não ter que mostrar o que não gostaria de apresentar?

Ronnie Von - Fico imaginando o seguinte: se alguém, por acaso, quiser me tirar daqui e for um desavisado, que a sedução possível, claro, é dinheiro, e tudo mundo sabe disso. Vou fazer 70 anos, se o cara vier com um caminhão de dinheiro, tenho pouco tempo ainda, vou querer. Mas dinheiro não é tudo. As propostas são para ganhar dez vezes mais, são coisas absurdas. Mas você vai se violentar, não é bem isso.

O cara que quiser contratar o Ronnie, tem que saber como ele é, do que ele gosta. Não adianta me levar para fazer essas bobagens pornográficas. Eu não vou saber fazer, o programa vai ficar no ar um dia e vão me mandar embora para casa. Aí dancei. Eu não quero sair do ar. Isso aqui é a minha vida. Não saio porque não quero me violentar. Todo mundo gosta de dinheiro, é bom, mas quero continuar trabalhando até o dia que eu morrer.

Notícias da TV - Como a televisão nasceu para você?

Ronnie Von - Em 1966, na Record, quando o Paulinho Machado de Carvalho me contratou para me anular, ia para a geladeira. Eu ia estrear um programa no domingo à tarde na Excelsior, a grande concorrente da Record. Ele foi na frente, contou uma história triste. O programa deu certo, não fui tão anulado assim, porque eu ia entrar em cima da Jovem Guarda. Em um país rotulador, as pessoas só me viam como cantor. A música foi o que me deu tudo, mas eu gosto muito mais de televisão do que cantar. E continuo repetindo isso, para desespero de muita gente que fica me cutucando para voltar a gravar.

Ronnie Von é maquiado em seu camarim antes de gravar o Todo Seu

Notícias da TV - Você se apresenta muito elegante na televisão. Você se preocupa muito com a vaidade?

Ronnie Von - Bom, vaidade é uma coisa e elegância é outra. Uma vez eu perguntei para minha mãe, já falecida, o que era elegância. Ela era uma mulher chiquérrima. Ela disse: "Meu filho, elegância é você não fazer o seu semelhante sofrer". Eu nunca mais me esqueci disso. Elegância é uma atitude, não é só uma roupa bonita ou um jeito refinado. Vaidade acho que todos nós temos, ninguém quer ficar esculhambado para impressionar uma "bonitinha". Eu gosto de uma roupa correta, de alfaiataria, mas adoro jeans, andar sem meia de mocassin, gosto de uma camiseta legal.

Mas elegância e educação são uma questão de latitude. Se você for ao Alasca e o esquimó oferecer a mulher dele para você e você não aceitar, você é um grosso. Vá para um país árabe, jante ou almoce. Quando acabar a refeição, se você não arrotar é porque não gostou. É um horror. Elegância é mais uma atitude emocional do que material.

Notícias da TV - Você disse que usa sua elegância e a sua vaidade para impressionar as “bonitinhas”. A sua “bonitinha” você impressiona sempre?

Ronnie Von - Ô (risos). É engraçado. Ela tem muito bom gosto para roupa de homem, mas não liga para ela mesma. Toda mulher é vaidosa, mas a Kika tinha um certo recolhimento, porque ela tem a Síndrome de Hashimoto, um problema de tireoide, um hipotireoidismo bastante pronunciado, e ela vira o que se chama de mulher “pêra”, a parte de baixo é sempre mais larga do que a parte de cima. Não tem jeito, não tem cura. Ela toma hormônio sintético da tireoide todo dia e vai tomar até o fim da vida dela. Com a minha bonitinha, acho que impressiono. Saí hoje, ela falou que meu blazer era bonito. Estava estreando. “Você está lindo”. Nós estamos há 29 anos casados e sou amigo de infância dela. Essas coisas são muito importantes, a conquista diária, mandar flores quatro vezes por semana, por exemplo.

Notícias da TV - Como uma mulher o conquista? O que o atrai em uma mulher?

Ronnie Von - A discrição. Isso é o que eu mais gosto de uma mulher. O perfil que eu gosto. Audrey Hepburn (1929-1993), Grace Kelly (1929-1982), Ingrid Bergman (1915-1982). Essa coisa glamorosa, mansa, esse tipo de mulher faz a minha cabeça mesmo. Aprendi nas minhas aventuras, tive alguns romances, era garoto de praia, fui criado em Copacabana. Você pode ter certeza.

Toda mulher espalhafatosa, na horizontal pode ser comparada a uma prancha de surfe. Aquela mais discreta, quietinha, vai quebrar você em dois, pode ter certeza disso. Você pega uma magrela, o romance vai ser discutível. Aquela mais cheinha, acima do peso, dá um show. Então aprendi a gostar de mulher acima do peso e discreta. São duas vertentes que me atraem fisicamente.

Mas a mulher que tem informação, cultura, porque eu estava falando de sexo, mas e depois? Porque se não tiver o depois, você vai querer chamar o táxi e mandar a moça para casa. As mulheres que têm atitude elegante, que vem de dentro, como a Audrey Hepburn, que terminou a vida ajudando crianças famintas na África, isso me atrai. A beleza física, numa hora dessa, é absolutamente subjetiva para mim, até irrelevante, mas é evidente que ajuda.

Notícias da TV - Você tem outras paixões?

Ronnie Von - Várias. Carros, aviões, velocidade. Sou aviador. O primeiro dinheiro que ganhei na minha vida, dinheiro bom, aquele para comprar uma casa, comprei um avião, e logo um bimotor para não decolar em emergência. Paguei em 16 anos (risos). Por sorte, consegui pagar antes. Continuo pilotando para amigos. Embora com essa idade, continuo voando. Também fui piloto de competição.

Minha paixão por carros veio por dois tios meus. Faço consultoria de graça, porque é um prazer que tenho na vida, de automobilismo da década de 1950. Fui colecionador de carros antigos, cheguei a ter 28. Música sou bastante plural. Tenho paixão pelo século 18, da música barroca ao classicismo, praticamente toda a obra de Bach, Mozart, jazz é outra paixão grande que tenho. Tenho tudo da Ella Fitzgerald. Sou apaixonado por Beatles e rock'n'roll. Sou rato de galeria de arte e rato de biblioteca. Botânica é o meu sonho dourado. Sou formado em Economia e fiz um intensivão em Biologia para estudar Botânica. Tenho planta com meu nome.

Em 1979, Ronnie Von fala ao Fantástico, da Globo, após se recuperar de doença (Reprodução)

Notícias da TV - Você tem tempo para cuidar da sua saúde?

Ronnie Von - Não. Hoje fiz oito entrevistas. Minha mulher me arrasta para o médico. Outro dia tive um piripaque aqui na televisão e me levaram para o Hospital do Coração, mas não tive nada. Meu pai tem 97 anos, o cara está lúcido, joga xadrez. Ele falou para mim: “Meu filho, pode ter certeza, sua cabeça vai ficar em 25 anos, só que o teu corpo não vai entender isso”. É o que acontece comigo. Levei um tombo outro dia de uma goiabeira lá em casa e me quebrei todo. Era uma dor que passava para o braço, vinha para o peito, a pressão subia. Tive artrose, inflamou tudo e aquilo espalha, irradia e você pensa que está infartando. Porque subi em uma goiabeira, escorreguei e vim embora lá de cima. “Mas eu sempre fiz isso”, falei para o médico. “Sim, mas você nunca teve 70 anos, agora você tem”. Calei minha boca.

Notícias da TV - Como é a sua rotina?

Ronnie Von - Durmo tarde, acordo cedo. Faço minha caminhada e corro. Moro em um lugar bastante calmo, mas se alguém me encontra na rua e me para a gente tem que conversar. Essa foi a minha atividade, se estraga tudo. Aprendi com Silvio Santos a fazer uma pista dentro de casa. Tenho uma quadra de tênis, começo a fazer meu exercício lá, depois subo e desço uns caminhos em casa. Tomo banho e vou para o escritório. Volto e almoço em casa todos os dias.

Não como mais na rua porque arrumei uma úlcera, uma gastrite. Volto para o trabalho ou fico em casa para alguma entrevista até 17h30, horário que venho para a televisão. Volto à tarde e tento dormir, porque tenho transtorno de ansiedade, insônia. Mas não quero tomar remédio. Aprendi que a vida é um prêmio. Tive uma doença incurável e estou aqui dando entrevista. É importante valorizar o que você tem de melhor, a vida.

Notícias da TV - Você passou a enxergar a vida de uma maneira diferente depois da doença?

Ronnie Von - Sem dúvida nenhuma. Saí do ceticismo para a credulidade quase absoluta. É uma coisa muito séria. Hoje, sou um homem de fé. Se você perguntar qual é a minha religião, respondo que minha religião são todas. Sou cristão, mas bem plural.

Notícias da TV - Você se incomoda com a velhice?

Ronnie Von - A cronologia me incomoda. Vou explicar por quê. Tanta coisa que eu preciso ainda realizar e tenho pouco tempo. Um hobby que tenho, carro antigo. Para voltar a ter carro antigo, eu preciso ter um recurso muito grande. Quero eventualmente voltar a ter meu Cadillac 54 Eldorado rabo de peixe, mas o cara para quem eu vendi me pediu o preço de uma casa. Queria ajudar mais pessoas. Queria ter uma fundação para ajudar pessoas da terceira, quinta e décima idade. Meu voluntariado é sempre para os velhinhos. Esses cachês que recebo de merchandising acabo sempre dando um jeito de ajuda-los. Queria ver meus filhos fazerem sucesso. São meu orgulho. A idade chegou. Se eu tenho uma longevidade do meu pai, é uma exceção.

Notícias da TV - Você esperava chegar aos 70 depois de tudo que passou?

Ronnie Von - Não, não. Para você ter ideia, eu pensei que eu não chegasse aos 56. Eu teria essa idade na passagem do século. Eu achei que não veria a mudança de século, que na minha geração, 30 anos era uma idade avançada. Sou de 1944. Hoje, um cara de 30 anos é um menino. Antigamente, era um senhor. Tive uma crise existencial aos 28 anos porque ia fazer 30. É engraçado. Hoje, com 70, imagina se eu tenho alguma crise? Tenho, e bem grande (risos)!


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