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Crimes e muito sangue

Mundo cão do horário nobre da Globo, Linha Direta saía do ar há dez anos

Reprodução/Globo

O apresentador Marcelo Rezende comandou o programa Linha Direta entre 1999 e 2000 - Reprodução/Globo

O apresentador Marcelo Rezende comandou o programa Linha Direta entre 1999 e 2000

REDAÇÃO

Publicado em 6/12/2017 - 5h59

Com muito sangue, denúncias e histórias macabras, o Linha Direta foi exibido pela Globo durante oito anos e chegou ao fim em 6 de dezembro de 2007. Foi o primeiro programa apresentado por Marcelo Rezende (1951-2017), que decidiu sair da emissora após reclamar de censura a reportagens. Apesar de criticado, o Linha Direta manteve grande audiência no horário nobre, revirou arquivos de centenas de casos mal resolvidos e colocou quase 400 criminosos na cadeia.

Inspirado em formatos norte-americanos como Unsolved Mysteries (1987-2010), o projeto foi idealizado pelo jornalista Hélio Costa, que apresentou uma primeira versão do Linha Direta durante três meses em 1990. O programa voltou em 1999 totalmente reformulado, com uma equipe de 150 profissionais que investigavam os crimes e trabalhavam na dramatização das histórias.

Cada episódio mostrava dois casos policiais, com imagens de arquivo da época dos crimes, cobertura jornalística, depoimentos de envolvidos, processo de investigação e reconstituição no estilo docudrama, com atores encenando sem diálogo e um narrador que explicava os fatos.

O programa fornecia central telefônica 24 horas por dia e site para receber denúncias de telespectadores que sabiam informações sobre o paradeiro dos criminosos foragidos cujos delitos eram retratados.

Muitos se entregavam antes de o programa ir ao ar, com medo da repercussão negativa em todo o país. Exibido após a novela das nove, o Linha Direta chegou perto da casa dos 40 pontos no Ibope nos primeiros anos.

Relembre outros fatos marcantes e curiosidades do Linha Direta:

reprodução/globo

Ao mostrar imagens de arquivo e fotos, Linha Direta ajudou a prender vários criminosos

Criminosos presos
De acordo com depoimento de Marcelo Rezende ao site Memória Globo, o objetivo do Linha Direta era retratar os casos policiais com a maior fidelidade e condenar a impunidade no Brasil. Com isso, o programa ajudou a colocar na cadeia mais de 380 criminosos após suas histórias serem exibidas. Três deles foram para o mesmo presídio, em Recife, Pernambuco, e receberam os apelidos de Linha Direta 1, 2 e 3.

Houve também dois casos em que as pessoas se entregaram depois de verem só a chamada do programa. Um estelionatário de Santa Catarina e um homem que abusava sexualmente de menores no Ceará fizeram isso para tentar impedir que o Linha Direta fosse exibido, mas em ambos os casos a Globo manteve as histórias no programa.  

reprodução/globo

Descontente com censura a reportagens, Marcelo Rezende deixou o Linha Direta em 2000

Saída de Rezende
O Linha Direta foi muito marcante na carreira de Marcelo Rezende, mas ele só ficou no programa durante um ano e quatro meses _saiu em setembro de 2000, para voltar ao Fantástico. No programa policial, o jornalista esteve à frente de uma equipe de 50 profissionais, mas se decepcionou com o rumo de algumas reportagens.

Em entrevista à Folha de S.Paulo em 2002, ano em que trocou a Globo pela RedeTV!, Rezende disse que o Linha Direta evitava mostrar casos de pessoas ricas e/ou famosas e tinha muitas reportagens sobre crimes passionais.

"Não aguentava mais marido que matou mulher, mulher que matou marido", contou. Ele também não gostou da censura à reportagem sobre o caso Daniela Perez (1970-1992), que já estava pronta e não foi ao ar.

"Eu conversei com a Gloria [Perez] várias vezes. Mesmo o caso já tendo sido julgado, tínhamos uma testemunha que até hoje ninguém ouviu. Fizemos ele contar a história, editamos o programa. A Gloria participou. Por decisão da Central Globo de Jornalismo, não foi ao ar. Foi a gota d'água", disse.

Domingos Meirelles assumiu a apresentação do Linha Direta até o fim do programa. José Luiz Datena também foi cotado para o cargo, mas nem ele nem a Globo quiseram pagar multa rescisória para a Record, onde apresentava o Cidade Alerta.

reprodução/globo

Linha Direta tinha central telefônica disponível 24 horas para denúncias de telespectadores

Direitos humanos ou sensacionalismo?
O Linha Direta dividiu opiniões enquanto esteve no ar. A Globo faz questão de lembrar que o Centro Brasileiro de Defesa dos Direitos Humanos e parentes de vítimas de crimes impunes fizeram um abaixo-assinado para que o programa não terminasse, por sua utilidade pública de denúncia a criminosos.

O programa também recebeu em 2003 a medalha Tiradentes, homenagem da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro pela prestação de serviços.

Ainda assim, muitos telespectadores e criminalistas criticavam o tom do programa, dizendo que o Linha Direta era sensacionalista e queria tomar para si a função de polícia, além de mostrar casos bastante macabros e induzir o telespectador a tirar conclusões precipitadas nas simulações.

"O programa se equilibra o tempo todo entre a prestação de um serviço interessante, com a interatividade e a velocidade que a Justiça não possui, e o perigo de sua fórmula, que empacota o produto e está sujeita a erros", disse o jornalista Kléber Mendonça, autor de uma tese de mestrado sobre o Linha Direta, em entrevista à Folha de S.Paulo.

reprodução/globo

As edições do Linha Direta Justiça lembravam de casos famosos que mexeram com o país 

Linha Direta Justiça
Além de casos policiais com criminosos à solta, uma vez por mês o Linha Direta dedicava uma edição inteira a revirar alguma história do passado que teve grande impacto no Brasil. Eram casos já encerrados pela Justiça, o que permitia uma encenação com mais recursos, mais diálogos e sem a participação de telespectadores.

Alguns casos famosos retratados nos episódios foram o roubo da Taça Jules Rimet (em 1983), o bandido da Luz Vermelha (na década de 1960), a chacina da Candelária (em 1993), o naufrágio do barco Bateau Mouche (em 1988) e o assassinato do jornalista Vladimir Herzog (em 1975), preso político durante a Ditadura Militar (1964-1985).

reprodução/globo

O ator Mateus Solano interpretou o jovem Stuart Angel Jones em encenação do Linha Direta

Elenco de estrelas
Com produção mais detalhada, o Linha Direta Justiça contava também com mais atores no elenco das reconstituições. Vários nomes que fariam sucesso na Globo nos anos seguintes participaram de cenas do programa.

Mateus Solano, por exemplo, interpretou Stuart Jones, filho da estilista Zuzu Angel que foi preso, torturado e assassinado por oficiais da Aeronáutica durante a Ditadura Militar, em 1971. André Gonçalves foi o Bandido da Luz Vermelha, e Eriberto Leão interpretou o Capitão Wilson Machado, um dos militares responsáveis pelo atentado do Riocentro, em 1981. 

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