Memória da TV
Reprodução/TV Globo
O macaco-prego Chico, usado na abertura da novela Mico Preto, que foi parar na Justiça
THELL DE CASTRO
Publicado em 13/9/2015 - 8h54
Vinte e cinco anos atrás, em tempos ainda não tão politicamente corretos como os atuais, a Globo arrumou uma grande dor de cabeça ao colocar um simpático macaco-prego na abertura da novela das sete Mico Preto. Um grupo de proteção aos animais entrou com uma representação no Ministério Público, e a confusão foi parar na Justiça, chamando mais atenção do que a própria novela, que se revelou um mico na audiência.
Mico Preto, de Marcílio Moraes, Leonor Bassères e Euclydes Marinho, estreou no dia 7 de maio de 1990, estrelada por nomes como Luis Gustavo, Glória Pires, José Wilker e Miguel Falabella. A emissora, por sinal, não passava por um bom momento em suas tramas: Rainha da Sucata, às oito, patinava nos primeiros capítulos, e Gente Fina, às seis, sofria intervenção de Walter George Durst para ganhar mais dinamismo.
Na abertura de Mico Preto, o designer Hans Donner colocou o macaco-prego Chico, criado na casa de uma família em Pedra de Guaratiba, no Rio de Janeiro. O animal, que não participava da trama, já havia aparecido em outras produções da casa, como Os Trapalhões e TV Pirata.
No início de agosto de 1990, dois meses após a estreia da trama, o procurador da República Luiz Alberto David Araújo entrou com uma ação civil pública ambiental contra a Globo. Ele alegou que a utilização do macaco-prego na abertura desrespeitava a lei 5.197/67, que regulamentava a proteção à fauna brasileira.
Araújo atendeu a uma representação da sociedade ambientalista Grupo de Proteção ao Boto Tucuxi. "Veicular a imagem de um macaquinho de chapéu e colete é uma catástrofe em termos ambientais. E essa lesão toca especialmente as crianças. Para elas, torna-se valor corrente o aprisionamento de animais", declarou o procurador ao Jornal do Brasil de 8 de agosto de 1990.
A ação visava proibir a exibição da abertura, mas não deu certo: o juiz José Luís Gomes da Silva negou o pedido de liminar. A Folha de S. Paulo de 9 de agosto informou que "o juiz paulista alegou que se fosse concedida a liminar de suspensão ele estaria censurando uma produção artística, o que é proibido por lei. Considera que o artigo 220 da Constituição Federal, sobre censura, prevalece sobre a lei utilizada pelo procurador no pedido de liminar".
Outro lado
A Globo alegou que não havia razão para tanta repercussão, já que, segundo a emissora, o animal não podia ser considerado silvestre. "O mico é tratado desde a sua primeira semana de vida sob os cuidados da família Santos, ele não encontraria nas matas tropicais (seu habitat natural) a suculenta macarronada de Dona Lúcia (seu prato predileto), nem a cama com travesseiro e cobertor, já que não conheceu correntes nem gaiolas ao longo de seus três anos de existência", explicou reportagem de Macedo Rodrigues no jornal O Globo de 14 de junho de 1990.
A Folha de S. Paulo vaticinou que quando a novela terminasse o inquérito ainda não teria sido concluído. E foi mesmo o que aconteceu: Mico Preto foi exibida até 1º de dezembro de 1990, e o processo só terminou no ano seguinte, condenando a Globo a exibir mensagens ambientalistas.
O Jornal do Brasil de 24 de julho de 1991 informou que Xuxa, Faustão, Malu Mader e Antônio Fagundes, entre outros artistas da emissora, iriam dividir as atenções dos telespectadores com macacos, borboletas, jacarés e tartarugas.
"A emissora foi punida e é obrigada a levar ao ar 30 minutos diários de mensagens a favor da preservação de animais silvestres, divididos em vinhetas de 15 segundos". O acordo não agradou a Márcio Augelli, presidente da Boto Tucuxi. "Meia hora é pouco tempo", esbravejou ao jornal.
Como consequência dos problemas judiciais, o então vice-presidente de Operações da Globo, José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, advertiu os funcionários, em memorando, sobre as implicações que o uso de animais silvestres nas gravações poderia gerar. Dessa forma, uma vinheta da Copa de 1990, que também tinha a participação de um mico, foi tirada do ar.
Outro caso semelhante, envolvendo o mesmo grupo ambiental, aconteceu em outubro de 1989. O programa TV Animal, do SBT, apresentado por Gugu Liberato, exibiu animais silvestres enjaulados. A representação foi feita e o SBT foi multado em US$ 1,1 milhão. A multa também foi convertida na exibição de vinhetas, três vezes por dia, durante 75 dias.
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