Sociedade inusitada
Reprodução/TV Record
Edir Macedo e Silvio Santos em encontro no Templo de Salomão exibido na TV em agosto
DANIEL CASTRO
Publicado em 2/10/2015 - 5h09
Atualizado em 2/10/2015 - 12h21
Bombardeada por operadoras e entidades do setor de TV por assinatura, a sociedade entre Silvio Santos (SBT), Edir Macedo (Record) e Amilcare Dallevo (RedeTV!) teve uma importante vitória nesta quinta-feira (1º). A superintendência-geral do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) aprovou sem restrições a criação de uma empresa das três emissoras para negociar seus sinais digitais com as operadoras de TV por assinatura. As operadoras alegam que a empresa irá cobrar "preços abusivos", prejudicando os assinantes. O Cade discorda.
A aprovação significa um passo enorme para a joint venture (empresa formada a partir de outras companhias). Só não pode ser dada como definitiva ainda porque Sky e ABTA (Associação Brasileira de Televisão por Assinatura), que se tornaram terceiros interessados no processo de concentração econômica, deverão recorrer da decisão da superintendência-geral do Cade assim que ela for publicada no Diário Oficial da União. Com o recurso, o processo irá para o tribunal administrativo do Cade, formado por seis conselheiros, mais o presidente. O tribunal terá duas alternativas: acata a decisão da superintendência-geral (e a empresa já pode ser registrada e aberta) ou julga o caso em até 240 dias, descontados os três meses que o processo já tramitou no Cade (esse prazo pode ser prorrogado por mais 90 dias).
O Cade é um órgão do Ministério da Justiça que analisa as fusões de empresas do ponto de vista concorrencial, visando impedir o truste (prática anticompetitiva). O órgão funciona como um tribunal independente. O parecer favorável à joint venture é o equivalente a uma "sentença" de primeira instância na Justiça.
Em julho, como noticiado em primeira mão pelo Notícias da TV, SBT, Record e RedeTV! entraram no Cade com pedido de aprovação de uma empresa formada pelas três emissoras. A empresa terá 33% de participação de cada rede e funcionará como uma programadora de TV por assinatura. A primeira missão será negociar com as operadoras um preço pelos seus sinais digitais. Por lei, as emissoras são obrigadas a ceder gratuitamente seus sinais analógicos, mas podem negociar os sinais digitais. A Globo já cobra por seu sinal digital.
A criação da empresa foi combatida pelas operadoras e entidades como a ABTA e NeoTV (representante de 150 pequenas operadoras). O principal argumento é o de que a união fortelecerá as três redes, que cobrarão "preços abusivos". As operadoras disseram ao Cade que, diante da situação, poderão deixar de carregar SBT, Record e RedeTV! (que, juntas, detêm 17% de toda a audiência no cabo e no DTH), o que levaria à queda da qualidade do serviço, ou aumentarão os preços de seus pacotes, o que levará à perda de assinantes.
As três redes contratacaram apresentando ao Cade um estudo que mostra que a TV por assinatura é tão importante para a TV aberta quanto a TV aberta para a TV paga. O levantamento mostra que 37% da audiência das três redes já vêm do cabo ou das miniparabólicas do DTH. Sem distribuição na TV paga, diz o estudo da consultoria LCA, o SBT perderia de 30% a 40% de suas receitas publicitárias, o que significa até R$ 425 milhões por ano.
Sem risco à concorrência
Coordenador-geral Antitruste do Cade, Mário Sérgio Rocha Gordilho Júnior levou esse estudo em consideração no parecer em que recomendou a aprovação sem restrições da joint venture, acolhido ontem pelo superintendente-geral substituto do Cade, Diogo Thomson de Andrade.
Em seu parecer, Gordilho Júnior considerou que:
1) "Qualquer valor considerado abusivo por parte das operadoras poderia, no limite, retirar seus sinais [das emissoras] dos line ups [das operadoras], fazendo com que as requerentes [as três emissoras] não apenas deixassem de receber a renda extra que vislumbram com a venda de seus sinais digitais para as operadoras de TV por assinatura, mas, sobretudo, que colocassem em risco seu próprio modelo de remuneração atual, via publicidade."
2) A criação da programadora "não implica redução de concorrência" entre as três redes no mercado de TV aberta. A minuta do acordo de quotistas da empresa estabelece que elas continuarão concorrentes entre si.
3) A mesma minuta "traz ainda mecanismos de governança corporativa que assegurarão a independência das requerentes [as emissoras] na precifição de seu conteúdo para TV paga". Os preços serão estimados "com base em estudos de mercado" pela diretoria da empresa, já que "tais mecanismos proíbem as requerentes de discutir ou combinar, direta ou indiretamente, a formação do preço dos produtos ou conteúdos por elas desenvolvidos e ofertados às operadoras".
4) O uso da nova empresa para negociar a venda de espaços publicitários em conjunto por SBT e Record "seria tratada como uma investigação de cartel". Não há no acordo de quotistas "indícios claros" de que a joint venture servirá para a venda de publicidade.
5) É "improvável o exercício do suposto poder de mercado" da joint venture porque "o mercado brasileiro das operadoras de TV por assinatura já é bastante concentrado, com as duas principais [Net/Claro e Sky] detendo participação conjunta de 83%, contrabalanceando o poder de mercado das emissoras de TV"; porque o telespectador poderá continuar assistindo as três redes pelo sinal aberto; porque a Globo, "líder absoluta no mercado relevante em análise, já cobra pela disponibilização dos seus sinais para o mercado de TV por assinatura, sem evidências de que essa cobrança tenha afetado, negativamente, este mercado"; e as três redes estão criando uma programadora que "pretende criar novos canais, e esse modelo de empacotamento de canais é o padrão no mercado de TV por assinatura".
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